Segurança psicológica e o papel crucial do desenvolvimento da liderança

Quando os funcionários se sentem à vontade para solicitar ajuda, compartilhar sugestões informalmente ou contestar o status quo sem temerem consequências sociais negativas, a organização tende a inovar mais rapidamente (em inglês), obter os benefícios da diversidade (em inglês), e adaptar-se bem a mudanças (em inglês) – capacidades cuja importância só aumentou ao longo da crise da COVID-191. Entretanto, uma Pesquisa Global da McKinsey realizada durante a pandemia confirma que, de modo geral, apenas um número reduzido de líderes empresariais apresenta os comportamentos positivos capazes de criar esse clima, denominado segurança psicológica, na força de trabalho2.

Como mostram inúmeras pesquisas anteriores, segurança psicológica é um pré-requisito para uma performance adaptativa e inovadora (indispensável nos cenários em rápida mudança de hoje), seja no plano individual, da equipe ou da organização3. Por exemplo, a criação de uma "rede de equipes (em inglês)" bem sucedida – isto é, uma estrutura organizacional ágil que capacite as equipes a resolver problemas rapidamente fora das estruturas burocráticas ou de silos isolados – requer alto grau de segurança psicológica.

Felizmente, nossa pesquisa mais recente indica como as organizações podem promover a segurança psicológica. É algo que depende de os líderes de todos os níveis aprenderem e demonstrarem comportamentos de liderança específicos que ajudem seus funcionários a crescer e progredir. É preciso ampliar e investir em programas de desenvolvimento da liderança para que os líderes tenham condições de incorporar esses comportamentos e, desse modo, contribuir para promover a segurança psicológica em toda a organização.

Uma receita de liderança que promove a segurança psicológica

Os líderes podem promover a segurança psicológica criando o clima certo e mentalidades e comportamentos apropriados em suas equipes. Em nossa experiência, aqueles que melhor conseguem fazer isso tornam-se catalisadores que capacitam e habilitam os demais líderes da equipe – mesmo aqueles sem autoridade formal. E é desse modo, servindo de modelo e reforçando os comportamentos que esperam do resto da equipe, que eles contribuem para cultivar a segurança psicológica.

Nossa pesquisa constatou que o fator mais importante para a segurança psicológica de uma equipe é a existência de um clima positivo no qual todos valorizam as contribuições uns dos outros, se preocupam com o bem-estar alheio e têm voz ativa no modo como realizam seu trabalho4. É por meio de suas próprias ações, definindo o tom do clima da equipe, que os líderes de equipes mais contribuem para a segurança psicológica. Além disso, a criação de um clima positivo na equipe pode gerar dividendos adicionais em épocas de disrupção. Nossa pesquisa verificou que um clima positivo tem mais efeito sobre a segurança psicológica de equipes que vivenciaram mudanças intensas no trabalho remoto do que sobre aquelas que passaram por menos mudanças durante a pandemia de COVID-19. Entretanto, apenas 43% dos entrevistados relataram haver um clima positivo em sua equipe.

Um clima positivo é o fator mais importante de segurança psicológica em uma equipe e esse clima tende a existir quando os líderes assumem comportamentos consultivos e solidários para, em seguida, propor desafios a suas equipes.

Durante a pandemia, vimos o abandono acelerado do estilo tradicional de liderança baseado em comando e controle (a chamada liderança autoritária), um dos quatro estilos bem definidos de comportamento da liderança que examinamos para tentar entender quais deles promovem um clima positivo na equipe e a sua segurança psicológica (em inglês). A pesquisa constatou que, numa equipe, comportamentos de liderança autoritária são prejudiciais à segurança psicológica, ao passo que comportamentos de liderança consultiva e solidária a favorecem.

Os resultados também sugerem que os líderes podem aumentar ainda mais a segurança psicológica assegurando um clima positivo na equipe (Quadro 1). Uma liderança consultiva e solidária contribui para criar um clima positivo na equipe, ainda que em graus variados e por meio de tipos diferentes de comportamento.

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Na liderança consultiva, que tem efeitos diretos e indiretos na segurança psicológica, os líderes consultam os membros de sua equipe, solicitam insumos dos demais membros e consideram suas opiniões sobre as questões que os afetam5. Além disso, esses comportamentos tendem a encorajar os membros da equipe a apoiarem uns aos outros..

Às vezes, outro conjunto de comportamentos de liderança pode fortalecer a segurança psicológica, mas apenas quando já existe um clima positivo na equipe. Esse outro conjunto de comportamentos, conhecido como liderança desafiadora, incentiva os funcionários a realizarem mais do que eles pensam ser capazes no início. Um líder desafiador pedirá aos membros da equipe que reexaminem as suposições acerca do trabalho de cada um e como este poderia ser executado de modo superar as expectativas e atingir o pleno potencial de performance. A liderança desafiadora já chegou a ser associada a funcionários que expressam criatividade, sentem-se capacitados a efetuar mudanças relacionadas ao trabalho e buscam aprender e melhorar7. No entanto, nossa pesquisa constatou que a máxima segurança psicológica tende a acontecer quando o líder primeiro cria um clima positivo na equipe (por meio de frequentes ações consultivas e solidárias) e só então desafia a equipe. Sem uma clima positivo como base, comportamentos desafiadores não têm efeito significativo. E as experiências dos funcionários variam enormemente, dependendo de como o líder se comporta, segundo Amy Edmondson, professora de Liderança e Gestão (cátedra Novartis) na Harvard Business School (Quadro Interativo).

Além disso, os resultados da pesquisa mostram que um clima propício à segurança psicológica começa no topo da organização. Buscamos entender os efeitos do comportamento da alta liderança sobre o senso de segurança dos funcionários e verificamos que esses líderes podem ajudar a criar uma cultura de inclusão, que promova atitudes positivas de liderança na organização inteira, se eles próprios tiverem comportamentos que sirvam de exemplo. Os líderes das equipes tenderão a exercer liderança de suporte, consultiva e desafiadora se a alta liderança demonstrar que é inclusiva – por exemplo, que busca opiniões que difiram das suas, e que trata todos com respeito.

A importância de desenvolver líderes em todos os níveis

Nossas pesquisa mostra que investir no desenvolvimento de líderes da organização inteira – isto é, de todas as posições de liderança – é um método eficaz para cultivar a combinação ideal de comportamentos de liderança que favoreçam a segurança psicológica. Funcionários que relatam que suas organizações investem maciçamente no desenvolvimento da liderança também tendem a relatar que os líderes de sua equipe costumam demonstrar comportamentos de liderança consultiva, solidária e desafiadora. Também são 64% mais propensos a classificar a alta liderança como mais inclusiva (Quadro 2)8. Entretanto, os resultados sugerem que a eficácia desses programas varia conforme as habilidades que buscam desenvolver.

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Reorientando as habilidades desenvolvidas em programas de liderança

Com frequência, as organizações tentam cobrir muitos tópicos em seus programas de desenvolvimento da liderança (em inglês). Todavia, nossas pesquisa indica que, se esses programas de aprendizagem focarem apenas algumas habilidades e comportamentos, terão mais chances de desenvolver não só comportamentos positivos de liderança favoráveis à segurança psicológica, mas também, em última análise, uma performance mais vigorosa da equipe. Algumas das habilidades mais ensinadas nas organizações dos entrevistados – p.ex., dialogar abertamente de modo a explorar divergências e dissolver tensões na equipe – estão entre as mais associadas a comportamentos positivos de liderança. No entanto, em várias áreas, habilidades relativamente inexploradas também produzem resultados benéficos (Quadro 3).

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Duas habilidades abordadas com menos frequência em programas formais são bastante indicativas de uma liderança positiva. Treinamento em patrocínio – isto é, em promover o sucesso alheio antes do nosso próprio – favorece comportamentos de liderança consultiva e desafiadora, mas apenas 26% dos entrevistados afirmam que suas organizações incluem essa habilidade em seus programas de desenvolvimento. E o aprimoramento da chamada “humildade situacional”, que 36% dos entrevistados afirmam ser alvo da atenção de suas organizações, ensina os líderes a desenvolver sua curiosidade e uma mentalidade de crescimento pessoal. A aquisição dessa habilidade é indicativa de um líder que demonstra comportamentos consultivos.

O desenvolvimento no topo é igualmente importante

De acordo com os dados, promover segurança psicológica em escala começa quando a alta liderança da empresa desenvolve e incorpora os comportamentos de liderança que deseja ver na organização inteira. Muitas das mesmas habilidades que promovem comportamentos positivos nos líderes de equipes também podem ser desenvolvidas pela alta liderança para promover a inclusão. Por exemplo, a capacidade de manter um diálogo aberto e de desenvolver relacionamentos sociais dentro das equipes também são habilidades importantes para a alta liderança.

Além disso, várias habilidades são mais importantes no topo da organização. A consciência situacional e cultural, ou a capacidade de entender como crenças podem ser desenvolvidas com base em observações seletivas e nas normas de diferentes culturas, estão relacionadas com uma alta liderança inclusiva.

O que o futuro trará

Em vista do ritmo cada vez mais acelerado das mudanças e disrupções e da necessidade de equipes em todos os níveis apresentarem respostas criativas e adaptativas, a segurança psicológica é mais importante do que nunca. As organizações que desenvolverem habilidades de liderança e um ambiente de trabalho positivo que ajudem a criar segurança psicológica poderão colher muitos benefícios – desde o aprimoramento da inovação, da experimentação e da agilidade até melhor saúde e desempenho organizacionais9.

Por mais clara que seja essa convocação para agir, as perguntas que nos fazem com mais frequência continuam sendo: “Como podemos desenvolver a segurança psicológica?” e, mais especificamente, “Por onde começamos?” Os resultados de nossa pesquisa mostram que não há tempo a perder para criar e investir no desenvolvimento da liderança em escala a fim de aumentar a segurança psicológica. As organizações podem começar a fazer isso das seguintes maneiras:

  • Ir além dos programas pontuais de treinamento e implantar um sistema em escala de desenvolvimento da liderança. Comportamentos humanos não mudam facilmente da noite para o dia. No entanto, com muita frequência vemos empresas tentarem fazer justamente isso valendo-se apenas de programas direcionados de treinamento. A modificação dos comportamentos de liderança em um sistema complexo nos níveis do indivíduo, da equipe e da empresa começa com a definição de uma estratégia clara alinhada à aspiração geral da organização e ao vasto conjunto de recursos imprescindíveis para realizá-la. É crucial desenvolver uma taxonomia de habilidades (manter diálogos abertos, por exemplo) que não apenas contribua para a efetivação da identidade geral da organização, mas também promova o aprendizado e o crescimento e se aplique diretamente ao trabalho das pessoas no dia a dia. Em termos práticos, embora o aprendizado possa ser sequenciado em uma série de treinamentos – e rapidamente codificado e redimensionado para todos os líderes de um setor ou função da organização – esses treinamentos serão ainda mais eficazes se combinados com outros componentes de um sistema mais amplo de aprendizagem (p.ex., reforços comportamentais). Embora as experiências de aprendizado pareçam hoje muito diferentes do que eram antes da pandemia de COVID-19 (em inglês), o aprendizado digital oferece às grandes empresas mais oportunidades de desmantelar silos isolados e criar novas conexões na organização como um todo.
  • Investir em experiências de desenvolvimento da liderança que sejam emocionais, sensoriais e criem momentos de inspiração e insight. Experiências de aprendizagem imersivas e envolventes permanecem na memória com mais clareza e por mais tempo. Mas muitos programas de aprendizagem caem na armadilha de focarem exageradamente o conteúdo – mesmo que quase nunca seja a falta de conhecimento que impeça os líderes de realizarem seu pleno potencial. Portanto, é fundamental que os programas de aprendizagem estimulem os líderes a examinar e, se necessário, mudar suas crenças, suposições e emoções subjacentes a fim de provocar mudanças duradouras de mentalidade. Isso requer um ambiente de aprendizagem que seja não só propício ao processo de aprender como também idealizado com inteligência. As empresas podem começar com experiências orientadas por um facilitador que conduzam os líderes à introspecção pessoal por meio de conversas íntimas e de perguntas que inspirem reflexão. Esses ambientes podem ajudar os líderes a alcançar maior autoconsciência, despertar neles o desejo de mais crescimento e, com a ajuda da reflexão e do feedback, impulsionar o crescimento e o desempenho coletivos.
  • Construir mecanismos que tornem o desenvolvimento parte do trabalho diário dos líderes. O aprendizado formal e o desenvolvimento de habilidades servem como um trampolim no contexto do trabalho real; as jornadas de aprendizado mais bem-sucedidas são responsáveis pelo rico aprendizado que ocorre no trabalho e nas interações do dia-a-dia. O uso de estímulos de aprendizagem (p.ex., lembretes diários direcionados a indivíduos) pode ajudar o aluno a superar obstáculos e passar da retenção à aplicação de seus conhecimentos. Paralelamente, os líderes na cúpula da organização têm de ser os primeiros colocar o trabalho real no centro de seu desenvolvimento. Isso exige que eles sirvam de exemplo – publicamente – de seus próprios processos de aprendizagem. Nesse contexto, houve uma evolução do conceito de role model; em vez de role models servirem de exemplo do produto acabado, eles se tornam exemplos do trabalho em andamento, cheios de autoconfiança, mas com poucas respostas perfeitas. Esses exemplos tornam-se sinais fortes para líderes da organização inteira de que é seguro praticar, fracassar e se desenvolver no trabalho.
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