Crescimento global e a indústria da moda: é preciso ter cautela

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Uma potencial reviravolta no ciclo econômico está preocupando executivos da indústria da moda em relação às perspectivas para este ano. Após um longo período de crescimento e aumento dos custos, as prioridades estratégicas nos próximos anos provavelmente estarão mais concentradas em ser ágil e impulsionar a produtividade.

O ano passado foi marcado por um otimismo com uma dose de cautela diante das incertezas. No entanto, para 2019, diversos indicadores apontam sinais de possíveis problemas que poderiam, de alguma forma, impactar as perspectivas globais de crescimento econômico — conforme explicamos em nosso último estudo – The State of Fashion – realizado em conjunto com o Business of Fashion (BoF). O crescimento global atingiu uma média acima de 2,5 por cento nos últimos anos desde a crise financeira, mas há sinais de estagnação. Além disso, após um longo período de política econômica acomodatícia, o Banco Central norte-americano e outros bancos centrais estão começando a elevar as taxas de juros, aumentando o custo de empréstimo para muitas empresas e consumidores. O Banco Central Europeu também está sinalizando uma política monetária mais severa nos próximos meses, o que aumenta a chance de queda do crescimento econômico.

Previsões do Fundo Monetário Internacional (FMI), da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), e do Banco Mundial indicam uma desaceleração do crescimento nos mercados desenvolvidos até 2020 e uma estagnação da curva de crescimento nos mercados em desenvolvimento. Em 2019, há sinais de que Europa, América Latina e Oriente Médio poderiam ser as regiões mais vulneráveis à desaceleração. China e Estados Unidos também poderiam enfrentar uma desaceleração (com a ameaça de uma potencial bolha no país norte-americano), e as dinâmicas comerciais poderiam afetar os gastos dos consumidores e o crescimento da indústria de moda em ambos os países.

Adicionalmente, as economias avançadas estão se esforçando para aumentar a produtividade da mão de obra, que tem permanecido estável nos últimos oito anos afetada pelos efeitos resultantes da crise financeira, enquanto avanços significativos em automação e digitização estão defasados e incluem custos de transição. China e Índia superaram a tendência global e continuam aumentando significativamente sua produtividade, conforme mensurado pelo PIB por pessoa empregada - o crescimento da produtividade e o aumento no número de pessoas empregadas são as principais alavancas do crescimento econômico.

Essas estimativas oficiais também estão refletidas no sentimento dos líderes do setor. Em uma pesquisa realizada com mais de 1.000 executivos e diretores internacionais em diversas indústrias, publicada pela McKinsey em dezembro de 2018, cerca de 46% esperam que as condições econômicas globais piorem, comparado com 35% em junho de 2018 e apenas 15% em dezembro de 2017 (Quadro). Este sentimento reflete a visão do FMI – a Diretora-geral do órgão, Christine Lagarde, fez a seguinte declaração em uma reunião do Comitê Bretton Woods, em outubro de 2018: “Já não enxergamos somente nuvens no horizonte. Agora, algumas delas começaram a se espalhar e a situação aparenta ser algo mais do que uma garoa.”

Nada disso passou despercebido na indústria da moda. Os executivos veem as condições econômicas como um potencial desafio e as consideram a terceira maior tendência para 2019 de acordo com o último estudo BoF–McKinsey State of Fashion, no qual 42% dos entrevistados esperam que as condições piorem em 2019. Excluindo os entrevistados da América do Norte e do segmento de luxo, que são os mais otimistas, a maioria dos executivos estão ainda mais pessimistas em relação a este ano.

A sólida performance da economia global nos últimos anos tem sido acompanhada por um aumento nos investimentos por parte das empresas do setor. Nos últimos cinco anos, 68% das bases de custo das empresas aumentaram, enquanto 22% tiveram uma queda. De acordo com uma análise do McKinsey Global Fashion Index, as despesas médias de vendas, gerais e administrativas (SG&A) representaram 36% das vendas em 2017, em comparação com 34% em 2013. Investimentos prioritários para aumentar as vendas deste ano foram realizados em algumas frentes: omnicanal e e-commerce, desenvolvimento das capacidades de gestão de relacionamento com os clientes, melhoria da experiência nas lojas e construção da marca.

The State of Fashion 2019: A year of awakening

Por outro lado, para os custos de mercadorias vendidas (COGS), o cenário é diferente. Nos últimos cinco anos, a relação entre COGS/receita aumentou em 0,5 ponto percentual ou mais para 43% das empresas do índice, e em mais de 2 pontos percentuais para 25% das empresas, geralmente devido à pressão por remarcações.

Para compensar o impacto de um crescimento menor e de aumento nos custos, as empresas precisam definir uma agenda estratégica para impulsionar a produtividade ao longo dos próximos meses. Muitas já adotaram algumas medidas e implementaram programas de reestruturação e redução de custos. Como resultado, os índices de SG&A tornaram-se mais fragmentados, e empresas líderes já estão observando um aumento de custos menor do que as empresas seguidoras.

Entre as empresas que estão se preparando para enfrentar essa situação estão a Wolford, especialista em meias e roupas íntimas, que lançou um programa de reestruturação no final de 2017, a J. Crew, que em 2017 tinha o objetivo de reduzir custos e redefinir sua marca, e a H&M, que em 2017 tinha o objetivo de reduzir os custos em 5 a 6%. Mais recentemente, em setembro de 2018 a Under Armour anunciou planos de continuar focando no aumento da produtividade.

Ao olharmos para o próximo ano, 17% dos executivos que participaram do estudo BoF–McKinsey State of Fashion disseram que o principal objetivo é melhorar os custos e não aumentar as vendas. As principais áreas de melhoria de custo citadas incluem revisão da estrutura organizacional (11% de aumento comparado a 2018), diagnóstico das oportunidades de eficiência de ponta a ponta e redução da complexidade do sortimento de produtos. Mesmo assim, a proporção de executivos que estão planejando se concentrar na eficiência de custos não é significativamente maior do que os 16% dos entrevistados que tinham esse objetivo no ano passado. Considerando sua preocupação com o desenvolvimento econômico, nota-se que cortar custos ainda não é uma prioridade nas agendas dos executivos da indústria da moda.

Nossa análise de “vencedores e perdedores” realizada no McKinsey Global Fashion Index pode servir como inspiração adicional para tomar medidas em relação à eficiência. Em média, nos últimos cinco anos, as empresas situadas entre as 20% com maior lucro econômico obtiveram SG&A e COGS significativamente menor em proporção à receita (quatro pontos percentuais e seis pontos percentuais, respectivamente) em comparação com as empresas situadas entre as 80% restantes, sugerindo uma forte relação entre manter os custos baixos e ter resultados mais sólidos.

À medida que o cenário macroeconômico se transforma, esperamos que as empresas se protejam mais contra uma possível desaceleração no crescimento ao implementar medidas “antichoque”, cujo principal objetivo será impulsionar a produtividade por meio de uma melhor eficiência e da redução de custos.

Para garantir que essas intervenções gerem benefícios sustentáveis no longo prazo, as empresas da indústria de moda devem combinar melhorias de produtividade com os esforços de inovação necessários, tais como automação da produção, tomada de decisão alavancada por analytics, revisão da presença omnicanal e reorganização para aprimorar a agilidade. As empresas bem-sucedidas têm maiores chances de obter recompensas e alcançar uma performance excepcional.

Para saber mais sobre as dez tendências que definirão a agenda da indústria da moda em 2019, leia o relatório The State of Fashion 2019: A year of awakening (A situação da moda em 2019: um ano de despertar).

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