Quais tendências tecnológicas estão moldando o setor de mobilidade?

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As novas tecnologias muitas vezes despontam com grande alarde para depois caírem na obscuridade ou ficarem aquém das expectativas iniciais. No setor de mobilidade, que vem se transformando rapidamente graças ao crescimento dos veículos elétricos (VEs), à condução autônoma e a outras inovações, identificar as potenciais vencedoras – ou mesmo prever a velocidade da mudança – pode ser particularmente difícil.

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Embora alguma incerteza sempre persista, é possível entender melhor o potencial de uma tecnologia analisando dados de patentes e pesquisas, níveis de investimento, taxas de adoção e outras métricas. O McKinsey Technology Council segue essa abordagem em relatórios anuais (dos quais o mais recente foi publicado em julho de 20231) que analisam as inovações que vêm ganhando força em todos os setores.

Levamos a pesquisa do conselho um passo adiante realizando uma análise baseada em dados com 3,5 mil indústrias especializadas principalmente em condução autônoma, conectividade, eletrificação e mobilidade compartilhada (ACES, na sigla em inglês de “autonomous driving, connectivity, electrification, and shared mobility”).2 Nossa análise enfoca dez das tendências multissetoriais destacadas pelo conselho, desde o desenvolvimento de software de última geração até a computação quântica, passando pela Web3 (vide box “Dez tecnologias transformadoras na mobilidade”). O objetivo é obter uma visão das inovações específicas de cada setor determinando quantas empresas de nossa amostra já estão trabalhando em produtos relacionados a essas tendências ou viabilizados por elas (por exemplo, uma maior automação que requer algoritmos de IA aplicada).3 Descobrimos que cerca de 20% das empresas analisadas se enquadram nessa categoria, sendo que a maioria tem como foco inovações relacionadas à IA aplicada.

Apesar de essas dez tendências tecnológicas já terem força, prevemos ainda mais disrupções no futuro próximo, já que mais empresas estão começando a focar nessas áreas. Com o aumento desse número, aumenta também a quantidade de produtos e serviços inovadores que surgem e transformam os veículos, oferecem aos consumidores novas opções de mobilidade e aumentam as receitas. Nas empresas de mobilidade, essas inovações podem beneficiar todas as etapas da cadeia de valor, inclusive engenharia, serviços no ciclo de vida, logística, manufatura e produção, marketing e vendas, P&D, procurement e desenvolvimento de produtos. Além disso, as empresas que atendem o mercado automotivo, como as de computação em nuvem, engenharia e semicondutores, também podem encontrar novas oportunidades à medida que as dez tendências se aceleram.

As tendências tecnológicas que estão promovendo mudanças no setor de mobilidade

A revolução na mobilidade está ganhando velocidade. As bicicletas elétricas compartilhadas e os scooters são hoje comuns em muitas cidades, e uma pesquisa recente mostrou que 46% dos entrevistados estavam abertos a substituir seus veículos particulares por outras opções de transporte nos próximos dez anos.4 Os próprios carros também estão evoluindo, à medida que os VEs ficam mais sofisticados e que os recursos de condução autônoma – desde sensores de ponto cego até veículos autônomos – atraem grandes investimentos.

Os avanços tecnológicos estão impulsionando essas mudanças e facilitando a transição para modos de transporte mais sustentáveis e inclusivos. A adoção de VEs vem crescendo em parte por causa de melhorias recentes na autonomia e na confiabilidade das baterias, por exemplo. Ainda que vários avanços estejam transformando a mobilidade, direcionamos nosso foco para dez dos que são mencionados no mais recente relatório do McKinsey Technology Council:5

  • conectividade avançada
  • IA aplicada
  • computação na nuvem e de borda
  • IA generativa
  • tecnologia de realidade imersiva
  • industrialização do machine learning
  • desenvolvimento de software de última geração
  • tecnologia quântica
  • arquitetura de confiança e ferramentas de identidade digital
  • Web3

Vinte por cento das empresas estudadas já estão trabalhando em produtos ou serviços relacionados a essas tendências, e muitas delas já obtiveram investimentos para desenvolver suas soluções. Essas empresas estão em boa saúde financeira, com recursos que superam $ 200 bilhões conjuntamente, e 64% estão trabalhando em tecnologias habilitadas por IA aplicada ou em aplicações da mesma, o que torna essa tendência tecnológica a líder por larga margem (Quadro 1).

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Das empresas de nossa amostra, 20% estão trabalhando em áreas relacionadas a uma ou mais das dez principais tendências tecnológicas.

As outras tendências tecnológicas que estão entre as principais são conectividade avançada, computação em nuvem e de borda, Web3 e tecnologia de realidade imersiva. Contudo, as empresas de nossa amostra não dividem seus investimentos de maneira uniforme, uma vez que algumas tecnologias são mais pertinentes a tendências específicas de ACES do que outras (Quadro 2). Por exemplo, a tecnologia Web3 está envolvida mais comumente no desenvolvimento de casos de uso que dizem respeito à mobilidade compartilhada, como aqueles relacionados à criação de plataformas descentralizadas. Ela é usada com muito menos frequência em empresas focadas na condução autônoma.

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As empresas de nossa amostra são mais propensas a investir em IA aplicada do que em outras tecnologias de ponta.

Apesar de apenas cerca de 20% das empresas de nossa análise estarem trabalhando em produtos ou serviços relacionados às dez tendências tecnológicas, esse número pode aumentar significativamente em reação à crescente demanda, por parte dos consumidores, de produtos inovadores. Um exemplo são sistemas de infotenimento aperfeiçoados e imersivos em veículos; outro são plataformas de mobilidade que permitem que os passageiros usem diferentes modos de transporte de maneira integrada em uma única viagem. As empresas de mobilidade também estão sob crescente pressão para otimizar as operações internas e podem adotar um ou mais dos novos avanços tecnológicos para aumentar a eficiência e reduzir os custos.

Inovação por região

Também realizamos uma análise geográfica para identificar onde cada tecnologia está tendo o maior progresso. Em nossa amostra, as empresas sediadas nos Estados Unidos são mais propensas a relatar que estão trabalhando em uma ou mais das cinco principais tendências tecnológicas (Quadro 3). Com relação à IA aplicada, por exemplo, 33% das empresas que estão trabalhando nessa tecnologia têm sede nos Estados Unidos. Como o banco de dados de empresas utilizado em nossa análise não continha todas as empresas chinesas, é possível que ela subestime a contribuição da China em algumas categorias. As regiões que têm mais empresas focadas em tendências de ACES e outras soluções digitais provavelmente desempenharão um papel maior do que as outras na determinação de como a mobilidade futura evoluirá.

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A maior parte das empresas que estão trabalhando nas cinco principais tendências tecnológicas está nos Estados Unidos.

A IA aplicada e seu impacto transformador

Depois de avaliarmos nossos resultados, analisamos a IA aplicada em maior detalhe porque ela é, de longe, a tecnologia mais adotada entre as dez tendências que examinamos e está a caminho de causar disrupção em vários aspectos do ecossistema da mobilidade. A proeminência da IA aplicada no âmbito da mobilidade não é surpreendente, porque ela aprimora muitos processos, viabiliza a automação e aborda pontos problemáticos antigos. Eis alguns exemplos que ressaltam seus benefícios atuais e crescentes na mobilidade:

  • Engenharia e P&D. Algumas empresas usam IA aplicada para criar e controlar mundos virtuais nos quais podem treinar os algoritmos que possibilitam a condução autônoma. Entre outros benefícios, os algoritmos de IA podem identificar os pontos fracos dos modelos atuais. Eles são capazes de criar milhares ou milhões de cenários adicionais para uso em testes – número que não seria possível sem essa tecnologia. Em vez de fazerem atualizações de software caso um veículo autônomo (VA) não passe em um teste virtual, os desenvolvedores podem criar outro cenário para obter mais informações sobre o problema, poupando tempo e dinheiro. Os algoritmos podem testar o desempenho de um VA em eventos rotineiros – por exemplo, se o veículo deve parar para um pedestre em uma faixa de pedestres – e em ocorrências extremamente incomuns, como o caso de um pedestre passar acidentalmente na frente do veículo.
  • Procurement. Com a aceleração das mudanças climáticas, os fabricantes originais do equipamento (OEMs) estão usando IA aplicada para identificar riscos ambientais, sociais e de governança ao longo da cadeia de suprimentos. Por exemplo, os algoritmos podem analisar notícias sobre fornecedores para identificar possíveis problemas – como um histórico de poluição ou escândalos recentes envolvendo corrupção – de forma muito mais rápida e completa do que um ser humano. Melhorar a sustentabilidade pode atrair os compradores de automóveis,  que uma recente pesquisa com consumidores mostrou que 70% dos entrevistados consideravam a manufatura sustentável um fator importante na compra de um veículo.6 No futuro, a IA também poderá ajudar as empresas a prever riscos com maior precisão e sugerir melhorias de forma proativa, como o uso de recursos mais sustentáveis.
  • Manufatura. Ao usar câmeras de visão, lidar e radar em combinação com IA aplicada, os OEMs têm aprimorado o controle de qualidade durante a manufatura. Por exemplo, um fabricante automotivo líder está utilizando robôs controlados por IA para gerenciar o processamento de veículos individuais, mantendo, ao mesmo tempo, padrões de qualidade rigorosos. Na fase de inspeção da superfície, um sistema avançado usa uma tecnologia especializada que projeta padrões em preto e branco na superfície do veículo. Essa técnica permite que as câmeras façam uma varredura e identifiquem até mesmo as menores variações na pintura refletiva. A tecnologia tem dado resultados tão bons para o fabricante, que os prazos de entrega diminuíram sem que houvesse mudança na qualidade.
  • Marketing e vendas. As empresas podem usar IA aplicada para identificar clientes que elas correm o risco de perder para um concorrente e, então, podem criar incentivos para aumentar a satisfação deles, possivelmente reduzindo a rotatividade e os custos. Além da retenção, as empresas esperam usar a tecnologia para melhorar a experiência dos clientes e aumentar a fidelidade deles a seus produtos e marcas específicos.
  • Serviços no ciclo de vida. Os OEMs que incorporam IA aplicada aos sistemas de bordo dos veículos podem analisar as preferências de infotenimento dos consumidores e, então, fazer recomendações personalizadas. Além disso, uma pesquisa com consumidores revelou que cerca de 40% dos entrevistados têm muito interesse em recomendações personalizadas em tempo real feitas por sistemas de navegação familiarizados com seus padrões de direção.7

Prevemos que o investimento em IA aplicada aumentará porque os OEMs estão cada vez mais interessados em automação – uma mudança que depende dos algoritmos de IA que viabilizam processos automatizados. Em uma pesquisa da McKinsey, os entrevistados previram que os gastos com automação representariam mais de 30% das despesas de capital de sua empresa nos cinco anos seguintes, ante 22% nos cinco anos anteriores.8 Cerca de 8% dos entrevistados do setor automotivo afirmaram que seu investimento em automação ao longo de cinco anos totalizaria mais de $ 500 milhões. A automação habilitada por IA pode melhorar o local de trabalho ao preencher a crescente falta de mão de obra e ao assumir algumas das tarefas menos desejáveis (por exemplo, fazendo com que robôs físicos complementem o trabalho humano).

Para além da automação, as empresas estão usando cada vez mais a IA aplicada para melhorar outras áreas de operações. Por exemplo, alguns OEMs estão aprimorando a P&D usando gêmeos digitais – representações virtuais de produtos – para aperfeiçoar os processos de manufatura.

A viabilização do crescimento da IA aplicada

Embora os OEMs e outros stakeholders de mobilidade estejam comprometidos com a inovação, a implementação da IA aplicada costuma impor desafios. Esse problema surge em todos os setores. Pesquisas da McKinsey mostram que 90% das empresas iniciaram uma transformação digital, mas que os benefícios resultantes em termos de receita se limitaram a cerca de um terço do valor previsto.9

No âmbito da mobilidade, as empresas poderão obter receitas muito maiores com a IA aplicada se conseguirem superar os obstáculos à implementação e tirar proveito das megatendências tecnológicas. Essa melhoria requer que os OEMs e os stakeholders de mobilidade reformulem os fundamentos de sua operação, realizando um conjunto amplo e integrado de mudanças que envolvem estratégia, organização e gestão de riscos, além de talentos, tecnologia, dados e os melhores processos para adotar e dar escala às novas tecnologias:

  • Estratégia. Realizar com sucesso transformações digitais e por IA exige uma abordagem estratégica de cima para baixo. Os executivos líderes devem se unir em torno de uma visão comum e de compromissos alinhados à ambição da transformação. Em vez de se dedicarem a casos de uso individuais, os tomadores de decisões devem enfocar domínios empresariais de alto valor, como a jornada completa do cliente. Em cada domínio, eles podem identificar os melhores casos de uso e as soluções às quais se dedicar. Para obterem melhores resultados, as empresas devem quantificar o valor por meio de indicadores-chave de desempenho (KPIs, na sigla em inglês) operacionais e definir prioridades claras durante a implementação.
  • Organização. A inovação requer uma gestão de projetos robusta, mas os resultados de uma pesquisa da McKinsey mostram que 75% dos líderes empresariais ainda não adotaram as melhores práticas.10 (As empresas de tecnologia são uma exceção, pois costumam incorporar os recursos de gestão de projetos a seus modelos operacionais.) Além disso, muitas empresas têm dificuldade com a colaboração entre suas áreas de negócios, operações e tecnologia, o que pode retardar o progresso de novos produtos e serviços. Para superar esses problemas e melhorar as capacidades organizacionais, as empresas devem pensar em criar equipes de produtos distribuídas e dotadas de autonomia, lideradas por um responsável pelo produto. Essas equipes teriam acesso a todos os dados e tecnologias essenciais, inclusive ferramentas de desenvolvimento de software. Assim, seria provável desenvolverem soluções eficazes e comuns a diversas áreas, soluções estas que realmente levariam em conta os interesses empresariais.
  • Gestão de riscos. Para aprimorar as capacidades de IA, as empresas devem repensar e reforçar a gestão de riscos desde o princípio do projeto, em vez de esperar até o lançamento. Se as equipes ágeis identificam os riscos logo no início, podem desenvolver soluções rapidamente, antes que os problemas se avolumem e ameacem o desenvolvimento. A gestão proativa dos riscos é particularmente vital quando se trabalha em tecnologias que estão despontando, porque os desafios podem aparecer inesperadamente. Com uma boa gestão de riscos, as empresas podem minimizar os custos e potencialmente evitar passos em falso capazes de prejudicar sua reputação.
  • Talentos. As organizações devem priorizar os talentos em tecnologia por meio do desenvolvimento de capacidades internas e da implementação de planos de contratação direcionados e específicos para tecnologia. Ao pensarem nas prioridades com relação aos talentos, as empresas devem focar em habilidades essenciais, e não em funções, e depois identificar as lacunas de capacidade. Algumas empresas podem preencher essas lacunas treinando os funcionários atuais, enquanto outras podem buscar externamente os talentos certos. Para aumentarem a retenção, elas devem desenvolver uma experiência de funcionário que seja atraente e que abranja tudo, desde a disponibilidade de incentivos até os planos de carreira.
  • Tecnologia. As mudanças organizacionais podem potencializar a inovação digital. Valer-se de múltiplas equipes distribuídas, em vez de uma área central, acelerará o progresso e melhorará a qualidade de qualquer solução. Uma transição para equipes distribuídas exigirá que se recorra mais à automação em todas as etapas, inclusive nos testes e no controle de qualidade. Também demandará a criação de ambientes de autoatendimento (por exemplo, portais que permitam aos desenvolvedores acessar os aplicativos, ferramentas de colaboração e dados aprovados de uma empresa).
  • Dados. Na maioria das empresas, as equipes de digital gastam muito tempo compilando e harmonizando dados. Para aprimorar a experiência do cliente e reduzir os custos unitários, todas as equipes de digital devem ter acesso aos dados praticamente em tempo real. Para que isso seja viável, as empresas devem criar produtos de dados, que são conjuntos de dados prontos para uso e facilmente acessíveis pelos funcionários. Sua arquitetura de TI deve levar esses dados facilmente de onde estão armazenados a todas as equipes envolvidas. Para a supervisão de dados, as empresas se beneficiarão de um modelo de governança federado, no qual um departamento de gestão de dados cria políticas e dá suporte geral, enquanto as áreas e unidades de negócios gerenciam algumas tarefas de rotina, como a criação de produtos de dados. Uma estreita colaboração entre o diretor de informações e o diretor de dados também é essencial em iniciativas relacionadas a dados.
  • Adoção e escalabilidade. Com muita frequência, as empresas focam em desenvolver soluções e dão menos atenção a garantir sua adoção generalizada. Para evitar essa armadilha, elas devem criar novos modelos de engajamento, incentivos e métricas de desempenho para incentivar a adoção e o uso constantes da IA aplicada. A escalabilidade da inovação é outro ponto problemático frequente, pois as expectativas podem variar de acordo com o usuário final, o mercado e a localização da fábrica. No entanto, algumas mudanças podem ajudar a evitar a duplicação de esforços e o retrabalho. As empresas que se concentram na “assetização” – criação de soluções que podem ser reutilizadas em qualquer grupo sem alterações – podem ter uma vantagem no ganho de escala. Por exemplo, elas podem escrever programas de computador em blocos que são facilmente reutilizados e criar produtos de dados adequados para todos os locais.

À medida que mais empresas de mobilidade começarem a se dedicar a inovações relacionadas às dez tendências tecnológicas discutidas, a disrupção será inevitável, e haverá mais em jogo. Todas as empresas do setor, inclusive os OEMs tradicionais, devem saber quais inovações estão ganhando força e quais tecnologias de ponta são melhores para seus veículos e outros produtos. Mesmo empresas de outros setores, como o de semicondutores, devem prestar atenção às tendências tecnológicas na mobilidade, porque estas podem afetar as receitas do setor automotivo, que muitas vezes inclui alguns de seus clientes mais importantes. As empresas que estiverem a par das tendências mais importantes agora poderão obter uma vantagem inicial à medida que o mercado evolui.

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