Em poucas linhas…
- A humanidade já enfrentou mudanças climáticas ao longo de sua longa evolução e reagiu a elas com formas variadas de adaptação. Mas o desafio climático atual difere em dois aspectos importantes dos do passado. Primeiro, as mudanças estão ocorrendo muito mais rapidamente. E, segundo, os riscos climáticos vêm aumentando num contexto de sistemas complexos bem estabelecidos – incluindo onde e como alimentos são cultivados, cidades construídas, bens e serviços produzidos, cadeias de suprimentos organizadas e múltiplas atividades econômicas conduzidas. Esses sistemas foram construídos a partir de um pressuposto de estabilidade climática e, caso não haja uma resposta adequada, todos estarão claramente ameaçados pelas alterações climáticas.
- Estas diferenças têm três implicações críticas. A primeira é que a adaptação é necessária, mas não suficiente, para o manejo duradouro e eficaz das transformações climáticas. A segunda é que qualquer abordagem prospectiva de adaptação precisará ser substancialmente mais intencional e premeditada do que foram as abordagens orgânicas do passado. E a terceira é que, tal como acontece com a transição para uma economia net-zero, a adaptação requer uma visão sistêmica que dê suporte aos esforços locais, nacionais e globais e que garanta que ela seja tão ordenada e eficaz quanto possível.
- A pesquisa que embasa este artigo propõe uma estrutura que permitirá uma resposta adaptativa sistêmica, e especifica todos os elementos que precisarão ser unidos e interligados. Identificamos dez requisitos principais em quatro categorias: uma mentalidade de manejo dos riscos climáticos; alavancas de adaptação tecnológica e comportamental; ajustes econômicos e sociais; e governança, apoio institucional e compromissos.
- Em cada um desses dez requisitos, encontramos alguns exemplos iniciais de progresso. Por exemplo, muitas das soluções tecnológicas e comportamentais necessárias para uma adaptação bem-sucedida já existem de alguma forma – em contraste com a mitigação, para a qual as tecnologias necessárias ainda estão por serem desenvolvidas em certos setores. Dados sobre o clima, por sua vez, tanto os públicos como os privados, tornaram-se muito mais acessíveis, e os modelos de ameaças climáticas e prejuízos econômicos já estão amadurecendo. No geral, contudo, o progresso ainda é incipiente. Por exemplo, embora alguns avanços iniciais tenham ocorrido no setor público – 84% dos 197 Estados soberanos, mais a União Europeia, publicaram ao menos uma versão de um plano nacional de adaptação – grandes lacunas permanecem. A maioria desses planos carece de uma noção de riscos preferíveis ou toleráveis, ou seja, não quantificam quanto risco é aceitável. As soluções de adaptação não costumam estar plenamente emparelhadas aos riscos físicos que visam minorar e muitas vezes não mencionam os níveis de investimento exigidos. Mais importante, porém, é que a maioria desses planos ainda não conta com recursos necessários e sequer foi posta em andamento.
- É importante que os protagonistas dos setores público e privado que venham a considerar a estrutura proposta neste artigo notem que nem todas as partes do mundo estarão igualmente expostas a riscos crescentes ao longo desta década. E mesmo as regiões mais suscetíveis talvez não enfrentem riscos igualmente graves. Contudo, essas diferenças não justificam a inação. Pelo contrário, é importante que todas as partes utilizem o tempo que nos resta como uma oportunidade para implantarem medidas de adaptação imprescindíveis no curto prazo, levarem em conta a adaptação em decisões que terão consequências duradouras e desenvolverem as capacidades necessárias para que decisões robustas de adaptação sejam tomadas com vistas ao longo prazo. Tudo isso exigirá tempo e esforço.
- Tanto na adaptação como na mitigação, é crucial evitar que o perfeito se torne inimigo do aceitável. Inúmeras medidas podem ser implementadas hoje com relativa facilidade – por exemplo, começar a criar uma mentalidade de manejo dos riscos climáticos para avaliar e implementar decisões de adaptação, ou implantar soluções tecnológicas e comportamentais de custo relativamente baixo (como promover o esverdeamento dos espaços urbanos ou pintar telhados de branco para refletir o calor) que oferecem benefícios subsidiários e não trazem o risco de uma adaptação negativa capaz de agravar a situação.
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Desde o surgimento do Homo sapiens, há cerca de 200 mil anos, até os dias de hoje, a adaptação tem sido a principal resposta da humanidade a alterações no clima da Terra. Em outras palavras, ao longo da história, sempre que o clima mudou, a humanidade foi modificando gradativamente seu modo de vida a fim de sobreviver e prosperar sob as novas condições. Até mesmo a propagação dos primeiros seres humanos a partir da África para o restante do mundo foi inspirada pela procura de condições ambientais favoráveis durante um período geológico de grande disrupção climática. Ao longo das últimas centenas de milhares de anos, o clima da Terra – impulsionado por mudanças orbitais – alternou entre períodos temperados e glaciais, durante os quais grande parte do hemisfério norte permaneceu coberto de gelo. A disseminação do Homo sapiens pelo mundo está claramente correlacionada com padrões que resultaram de mudanças na temperatura, precipitação e vegetação.
Esses esforços orgânicos de adaptação continuam no contexto das vulnerabilidades climáticas atuais, mas hoje contam com o benefício de dezenas de milhares de anos de progresso social e tecnológico. Por exemplo, para gerir o risco térmico, a GIFT City, um distrito comercial central sendo erguido no estado de Gujarat, na Índia, está construindo um sistema de refrigeração no qual uma usina central distribui água gelada aos consumidores por meio de tubulações subterrâneas. Em comparação com a instalação de aparelhos individuais de ar condicionado nas casas protegidas, este sistema reduz a demanda de energia refrigeradora em 35% a 50%. A Holanda, que enfrenta graves riscos de inundação devido à baixa altitude de suas terras, está alargando os rios, escavando canais e criando áreas de captação. Com isso, os grandes rios que compõem o delta dos Países Baixos conseguem hoje escoar com segurança milhares de metros cúbicos de água por segundo a mais do que há trinta anos.
Contudo, o desafio das alterações climáticas atuais difere em cinco aspectos importantes das ocorrências anteriores ao longo da evolução humana:
- As mudanças climáticas atuais são resultado direto da atividade humana e certamente continuarão ocorrendo até que as emissões líquidas sejam zeradas. Em casos passados, a humanidade era mera “receptadora” das mudanças; desta vez é também sua criadora. Assim, a humanidade tem pela frente uma dupla tarefa: mitigar as mudanças climáticas (e, mais amplamente, resgatar o equilíbrio com a natureza) e adaptar-se ao impacto das mudanças que já ocorreram ou estão se “acumulando”. Outra faceta das mudanças climáticas antropogênicas é que elas são mais incertas – sejam as incertezas de como as atividades humanas serão modificadas ou as incertezas na modelagem dos impactos do novo clima. Desse modo, os decisores públicos e privados precisam agir num contexto impreciso no que diz respeito à magnitude das mudanças futuras, visto que estas dependerão das decisões de outros.
- As mudanças climáticas estão ocorrendo muito mais depressa do que em casos anteriores que também foram provocados por gases do efeito estufa. De fato, os índices atuais de liberação de carbono não têm precedentes nos últimos 66 milhões de anos, pelo menos.
- Com temperaturas já mais elevadas do que em qualquer outro momento dos últimos 125 mil anos, qualquer aquecimento adicional ameaça provocar, pela primeira vez na história da humanidade, temperaturas além da tolerância geral de inúmeras espécies, desde seres humanos a corais de águas quentes –ameaçando, em essência, a própria habitabilidade de algumas das regiões mais populosas da Terra.
- Em muitos casos, o capital natural está sendo exaurido em escala planetária – seja a integridade da biosfera, os fluxos biogeoquímicos e a destruição da camada de ozônio – e mais rapidamente do que é possível recompô-lo. Isso não só intensifica os impactos de um clima em transformação como é intensificado por eles.
- As mudanças climáticas hoje ocorrem no contexto de uma população humana muito maior e de uma civilização que evoluiu ao longo de um período de estabilidade climática e está firmemente baseada no pressuposto de que tal estabilidade continuará. O bem-estar humano depende hoje de uma economia altamente complexa construída em torno de ativos físicos geograficamente fixos, populações sedentárias e fronteiras políticas que dificultam enormemente algumas soluções anteriores, como migração em larga escala. Todos esses sistemas não só foram construídos para um clima diferente, como também, em muitos casos, já estão funcionando no limite da sua capacidade devido à sua idade, ao crescimento populacional ou a outros fatores não climáticos.
Estas cinco diferenças têm três implicações críticas.
Primeiro, a adaptação é necessária, mas não suficiente, para o manejo duradouro e eficaz das transformações climáticas. Na verdade, mesmo num cenário hipotético idealizado no qual as emissões cessassem hoje, o impacto das mudanças climáticas continuaria a se intensificar, pois partes do nosso planeta prosseguiriam se ajustando lentamente ao novo estado climático mais quente. E isso seria verdade mesmo que fossem alcançados os objetivos consagrados no Acordo de Paris de 2015, que visam limitar o aquecimento global a bem menos de 2°C (e, idealmente, 1,5°C) acima dos níveis pré-industriais. Contudo, estudos recentes das Nações Unidas constataram que as tendências globais de emissões já se afastaram da trajetória de mitigação necessária para se atingir as metas de temperatura do Acordo de Paris e que a janela para mudarmos de rumo está se fechando rapidamente.
Ao mesmo tempo, existem limites rígidos (hard, isto é, físicos) e flexíveis (soft, isto é, institucionais ou econômicos) ao que a adaptação, por si só, é capaz de realizar. Pesquisas recentes sugerem que o mundo pode já estar se aproximando de pelo menos alguns desses limites (mas, nitidamente, não de todos). (Veja Box, “Os limites da adaptação”.) Sendo assim, adaptação e mitigação precisam ocorrer juntas: este é um caso legítimo de “e”, não de “ou”. Na verdade, existe uma conexão inextricável entre adaptação climática, mitigação climática, restauração do capital natural e desenvolvimento econômico, e, se todos forem empreendidos juntos e criteriosamente, haverá claros benefícios subsidiários em algumas áreas.
A segunda implicação é que hoje a adaptação precisa ser substancialmente mais intencional do que foram as abordagens orgânicas do passado. Visto que quase todos os aspectos de nossa sociedade – desde onde casas são construídas e alimentos cultivados até o modo como os padrões de engenharia e design são definidos e o capital é investido – acabam sendo determinados a partir do pressuposto implícito de que o clima é estável, será necessária uma adaptação significativa ao longo do tempo para evitar uma disrupção profunda dos sistemas socioeconômicos atuais, particularmente nos níveis mais elevados de aquecimento atmosférico. A adaptação exigirá uma mudança fundamental nas nossas premissas sobre riscos. Será preciso não só recorrer a alavancas físicas (como construir diques e instalar aparelhos de ar condicionado), mas também mudar comportamentos e repensar abordagens de transferência de riscos.
Além disso, as mudanças climáticas estão ocorrendo num momento em que outros riscos graves – macroeconômicos, geopolíticos e de saúde pública – também ameaçam a estabilidade dos sistemas econômicos e sociais do mundo, bem como a vida e os meios de subsistência dos que dependem deles. Esses riscos poderão agir como multiplicadores uns dos outros e acelerar situações altamente desafiadoras. Em suma, a adaptação orgânica já não é mais suficiente. Por outro lado, essa situação também constitui uma oportunidade real. Se considerações sobre riscos climáticos forem devidamente incorporadas ao ciclo natural de aprimoramento dos sistemas existentes ou à criação de novos sistemas, o mundo poderá se adaptar aos riscos crescentes com mais determinação e, provavelmente, por um custo total menor.
A terceira implicação é que, tal como acontece com a transição para uma economia net-zero, a adaptação requer uma visão sistêmica que dê suporte aos esforços locais, nacionais e globais. Essa visão sistêmica é o foco deste relatório. A pergunta que almejamos responder é: Qual é a estrutura completa capaz de agregar todos os elementos necessários para tornar possível o tipo de mudança sistêmica que a adaptação exige? Este relatório não afirma que todas as partes envolvidas precisam focar igualmente e sem cessar todos os elementos dessa estrutura, mas sim que a estrutura precisa assegurar que os setores privado, público e social estejam concebendo e implementando estratégias de adaptação abrangentes (e, portanto, eficazes) ao mesmo tempo em que diagnosticam os empecilhos ao progresso e determinam onde a colaboração é necessária.
Empreendemos um exercício semelhante sobre a transição para o net-zero em um artigo de 2021, “Solving the net-zero equation: Nine requirements for a more orderly transition”, que destacou nove requisitos divididos em três grandes categorias: blocos de construção físicos; ajustes econômicos e sociais; e governança, instituições e compromissos. Nosso objetivo era ao mesmo tempo descrever todos os elementos necessários para mitigar as mudanças climáticas e enfatizar que eles precisam ser reunidos e interligados. Assim como o impacto das mudanças climáticas é sistêmico, também a abordagem de transição para o net-zero deve ser sistêmica. Necessidades de financiamento, inovação tecnológica, padrões e instituições, e mecanismos para enfrentar os efeitos regressivos da transição estão todos interconectados, e suas influências e impactos mútuos precisam de ser bem compreendidos para permitir ações eficazes.
Este relatório almeja fazer o mesmo para a adaptação. No entanto, há uma diferença de contexto, pois as reflexões sobre adaptação são muito mais incipientes e, portanto, as lacunas são ainda mais pronunciadas. Nesse espírito, propomos uma estrutura com dez requisitos fundamentais para promover esforços locais e globais de adaptação da forma mais eficaz e ordenada possível (veja Box, “Resumo dos dez requisitos”).
É importante que os protagonistas dos setores público e privado que vierem a considerar a estrutura proposta neste artigo notem que nem todas as partes do mundo estarão igualmente expostas a riscos crescentes ao longo desta década. E mesmo as regiões mais suscetíveis talvez não enfrentem riscos igualmente graves. Não obstante, é importante que todos os países e regiões utilizem o tempo que nos resta como uma oportunidade para implantarem as medidas de adaptação imprescindíveis no curto prazo, considerarem a adaptação em decisões imediatas com consequências no longo prazo (por exemplo, projetar ativos infraestruturais duradouros capazes de resistir a riscos futuros) e, por fim, desenvolverem capacidades para tomar decisões apropriadas de adaptação com vistas ao longo prazo.
O progresso até o momento
Houve algum progresso inicial no sentido de uma adaptação mais intencional. No setor público, pelo menos 84% dos 198 signatários (197 Estados soberanos mais a União Europeia) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCC) formularam pelo menos alguns planos, estratégias, leis e políticas de adaptação. E até mesmo certos países sem um plano nacional, como Índia e Estados Unidos, têm planos específicos para cada estado em alguns casos.
No entanto, a maioria dos planos de adaptação existentes não leva em conta o nível de risco que consideram aceitável, o grau de aquecimento ao qual planejam se adaptar, os riscos específicos que esperam nesse grau de aquecimento, as alavancas de adaptação que aplicarão para gerir esses riscos, os limites ao que as alavancas de adaptação propostas podem alcançar e o custo total da adaptação. Apenas os protagonistas mais avançados em todos os setores e regiões começaram a pensar nesses termos. Para além da necessidade de planejamento, o Relatório sobre lacunas na adaptação [Adaptation gap report], de 2022, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), enfatiza que a incorporação à estratégia de reflexões sobre riscos, a obtenção dos financiamentos necessários e as ações de adaptação às novas realidades climáticas também deixam a desejar.
Uma estrutura para ampliar os esforços globais de adaptação
No nível mais elevado, os requisitos de adaptação se enquadram em quatro1 categorias principais:
- Uma mentalidade de manejo dos riscos climáticos. Implica compreender a fundo os riscos existentes e como se espera que evoluam, bem como definir explicitamente o tipo de riscos aceitáveis ou toleráveis – tudo isso auxiliado por sistemas de dados e informações que deem suporte à tomada de decisões.
- Alavancas de adaptação tecnológica e comportamental. São as soluções tecnológicas e comportamentais que permitem atender os requisitos de adaptação atuais e futuros, e garantir que essas soluções sejam amplamente acessíveis – em outras palavras, que desenvolvam as cadeias de suprimentos e assegurem recursos capazes de facilitar sua implantação.
- Ajustes econômicos e sociais. O financiamento necessário para implantar soluções de adaptação; o efetivo reconhecimento, distribuição e precificação dos riscos; e o apoio às comunidades mais suscetíveis a eles.
- Governança, apoio institucional e compromissos. São as instituições, as políticas, a conscientização do público e o apoio das comunidades e lideranças necessários para promover a adaptação.
Especificamente, o relatório identifica dez requisitos principais em quatro categorias (Quadro 1). O conteúdo desses requisitos não é estático e precisará ser constantemente reexaminado e discutido à luz da evolução dos riscos e do progresso alcançado.
Uma mentalidade de manejo dos riscos climáticos
A adaptação às mudanças climáticas exige que organizações e entidades desenvolvam os dois elementos críticos de uma mentalidade de manejo dos riscos climáticos: um entendimento granular da evolução dos riscos físicos e uma compreensão profunda dos riscos aceitáveis dos trade-offs da adaptação.
1. Um entendimento granular da evolução dos riscos físicos e suas implicações sob diferentes cenários climáticos futuros. Para uma adaptação ser bem sucedida, é preciso entender a fundo as ameaças físicas e seus efeitos imediatos e de ordem superior. Líderes comunitários devem entender os riscos que poderão afetar suas comunidades e a sua evolução ao longo do tempo. Empresas devem considerar os riscos físicos a suas instalações, centros de produção, operações e cadeias de suprimentos. E tanto as empresas como as comunidades precisam ver claramente as formas de riscos climáticos físicos que seus ativos enfrentam hoje e aos quais poderão estar expostos amanhã (Quadro 2). Além disso, uma adaptação bem-sucedida exige que todas as partes envolvidas renovem continuamente sua maneira de ver a evolução dos riscos físicos. À medida que novos dados e insights vão mostrando como ocorre o aquecimento climático e onde as ameaças se multiplicam, a capacidade de avaliar continuamente esses dados e suas implicações será crítica.
No entanto, dados climáticos são complexos. Como ressalta nosso relatório de 2020, Climate risk and response: physical hazards and socioeconomic impacts, os riscos climáticos físicos têm alguns atributos primordiais: estão aumentando, sua natureza é espacial, sua distribuição não é estacionária, sua evolução não é linear, têm importantes impactos em cascata, afetam as economias e o planeta de forma sistêmica e têm efeitos socioeconômicos regressivos – atributos que tornam esses riscos mais difíceis de apreender e controlar, e criam a necessidade de dados climáticos transparentes e acessíveis capazes de informar a adaptação e a tomada de decisões.
Para os decisores, uma adaptação eficaz tem três requisitos:
1. Compreender a suscetibilidade a riscos por meio de uma modelagem robusta das ameaças climáticas, tanto agudas como crônicas, com o grau apropriado de granularidade para cada uma. Os modelos climáticos demonstraram ser altamente eficientes para projetar mudanças climáticas globais e regionais futuras provocadas pela emissão de gases do efeito de estufa gerados pelo ser humano. Contudo, não só perspectivas cada vez mais granulares são necessárias como também é preciso compreender melhor e integrar a interação entre o clima e os sistemas biológicos.
2. Entender, da forma mais clara possível, qual é o valor em risco, traduzindo os riscos físicos em impactos possíveis numa variedade de cenários (incluindo danos diretos a imóveis e ativos) e também em impactos sobre os recursos naturais e humanos. Metodologias e padrões claros podem ajudar a garantir uma estrutura consistente para avaliar estes riscos.
3. Avaliar não só os impactos diretos, mas também os impactos em cascata de ordem superior. Uma compreensão sólida das implicações dos riscos deve incluir seus efeitos em cascata sobre as comunidades e a cadeia de suprimentos, bem como suas interações com a economia em geral. Esta tarefa é intrinsecamente difícil, pois em muitos casos os impactos de ordem superior superam em magnitude os impactos imediatos, embora continuem sendo muito mais difíceis de quantificar. Este tipo de avaliação talvez esteja além da capacidade de muitas organizações e comunidades, mas começar avaliando o qualitativamente os impactos pode ajudá-las a tomar as decisões corretas no início da adaptação.
Tanto para as organizações como para as comunidades, compreender os impactos diretos do clima sobre seus ativos e operações mais cruciais é o primeiro passo. Muitas vezes, isso requer antes uma avaliação qualitativa da pegada de carbono dos ativos, sobreposta aos dados climáticos, para se compreender a natureza da suscetibilidade às ameaças crescentes e obter uma noção aproximada da sua magnitude. Já é possível observar algumas iniciativas nesse sentido, principalmente como resultado das divulgações voluntárias de riscos solicitadas pelo setor financeiro global.
Por exemplo, de acordo com a Força-Tarefa para Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima (TCFD), quase 80% das 1400 empresas pesquisadas em 2022 divulgaram espontaneamente o grau de sua suscetibilidade a riscos climáticos em conformidade com pelo menos uma das 11 divulgações recomendadas pela TCFD. As instituições financeiras parecem estar mais adiantadas nessa área, pois 50% dos gestores de ativos e 75% dos proprietários de ativos relataram em conformidade com pelo menos cinco das 11 divulgações recomendadas. Em alguns países e jurisdições, incluindo o Reino Unido e a União Europeia, a divulgação dos riscos climáticos é exigida por lei para empresas de capital aberto. Além disso, certos reguladores financeiros (por exemplo, o Banco de Inglaterra, a Autoridade Monetária de Hong Kong e a Reserva Federal dos Estados Unidos) começaram a realizar testes de estresse preliminares dos riscos climáticos.
Essas divulgações constituem um mecanismo para assegurar a transparência dos riscos físicos e de suas implicações. Contudo, uma adaptação eficaz exigirá mais dados, mais normas e mais educação para dar suporte à tomada de decisões.
2. Uma compreensão profunda dos riscos aceitáveis e dos trade-offs da adaptação. Definir explicitamente quais são os riscos aceitáveis é a base de qualquer plano de adaptação robusto. As organizações e comunidades precisam decidir quais níveis e tipos de riscos são aceitáveis (e por quanto tempo) com base na tolerância dos ativos e/ou sistemas pelos quais são responsáveis e nos resultados que desejam alcançar com sua utilização. Cada empresa, comunidade ou organização pode optar por um grau maior ou menor de riscos aceitáveis, mas deve reavaliar continuamente essas preferências à medida que o clima ou o meio ambiente evoluem, novos dados se tornam disponíveis ou a estratégia geral e a aceitação da sociedade mudam. Definir quais são os riscos aceitáveis ajuda a determinar onde e como se adaptar. Por exemplo, uma organização talvez prefira proteger suas instalações de qualquer tipo de inundação, enquanto outra pode aceitar que as águas subam até um metro (pois seus edifícios foram projetados com isso em mente). Esse tipo de determinação, por sua própria natureza, não é definitiva e precisa ser reexaminada regularmente.
A definição dos riscos aceitáveis deve ser feita no contexto dos seus custos de oportunidade. Dada a realidade de recursos limitados, os stakeholders precisam considerar quanto podem gastar na adaptação a riscos futuros sem deixarem de investir o suficiente nos esforços de mitigação e no crescimento.
Um plano de adaptação robusto começa definindo o nível de aumento da temperatura global para o qual a organização ou comunidade está se preparando, e também os riscos aos quais seus formuladores acham que a entidade deve se adaptar e por quê. Os formuladores do plano também têm que considerar como este afetará as metas de mitigação e de crescimento, seja positivamente (permitindo o crescimento) ou negativamente (aceitando o risco e reduzindo os recursos disponíveis). As decisões têm uma vida útil longa – por exemplo, a construção de ativos de infraestrutura, como pontes ou sistemas de drenagem – e devem sempre levar em conta uma variedade de cenários climáticos futuros. Por fim, como afirmamos, esse processo precisa ser informado por uma compreensão profunda dos limites da adaptação.
Os setores público e privado ainda têm muito trabalho pela frente para atender este requisito em nível global. No setor público, mais de um terço dos 198 signatários da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) definiu metas de adaptação quantificadas e com prazos definidos (em comparação com apenas um quarto em 2018). Entretanto, a maioria dessas metas não está explicitamente vinculada aos riscos que almejam enfrentar nem aos resultados que pretendem alcançar, sendo geralmente focadas em processos e ações de implantação – por exemplo, aumentar cobertura florestal, mobilizar trabalhadores para se adaptarem às mudanças climáticas ou designar áreas costeiras e marinhas como protegidas.
Quanto ao setor privado, seus esforços são igualmente incipientes. Em 2022, apenas 9% das empresas pesquisadas haviam considerado níveis específicos de aquecimento atmosférico em suas divulgações de riscos climáticos, e apenas 3% a 4% consideraram níveis específicos de aquecimento superiores a 2°C, de acordo com a TCFD. Para ambos esses parâmetros, o Relatório sobre lacunas na adaptação, de 2022, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), observou progresso desigual na identificação dos vínculos entre adaptação e outras prioridades (como a mitigação): alguns planos de adaptação simplesmente registram possíveis benefícios subsidiários ou impactos de uma adaptação negativa; outros chegam a incorporar esses fatores, mas apenas de forma preliminar.
Alavancas de adaptação tecnológica, física e comportamental
Adaptação requer a disponibilidade de alavancas tecnológicas e comportamentais na escala certa, e também uma aceitação generalizada da necessidade de alavancas de adaptação comportamental.
3. Disponibilidade de adaptações tecnológicas e físicas a riscos físicos. Será preciso identificar e desenvolver alavancas tecnológicas e físicas eficazes de adaptação às mudanças climáticas, e também produzi-las e implantá-las amplamente de maneira eficiente e econômica. Entre essas alavancas estão:
- Reforçar ou fortificar ativos físicos, e construir defesas – por exemplo, erguer diques ou quebra-mares, reforçar usinas de energia e enterrar linhas de transmissão.
- Controlar condições climáticas específicas mediante utilização de tecnologias como ar condicionado para seres humanos ou estufas climatizadas para plantas específicas.
- Fornecer sistemas de alerta antecipada ou de monitoramento ameaças climáticas mediante, por exemplo, tecnologias capazes de prever ondas de calor.2
- Gerenciar respostas a crises utilizando geradores de emergência, desenvolvendo tecnologias de busca e salvamento e adaptando o sistema de saúde para melhor gerir ameaças climáticas agudas.
Para implantarem essas ferramentas de modo eficaz, as organizações precisam compreender os limites dos riscos aos quais determinada ferramenta poderá ajudá-las a se adaptar, as possíveis interações com iniciativas de desenvolvimento econômico ou de mitigação, e a ameaça de consequências não pretendidas ou de impactos de uma adaptação negativa. Algumas soluções – por exemplo, criar ou restaurar manguezais que atuem como barreiras físicas contra tempestades ou tsunamis e como sumidouros de carbono – estão em sinergia com as tecnologias de mitigação. Outras tecnologias importantes, porém, podem vir a ter impacto negativo no progresso da mitigação – por exemplo, aparelhos de ar condicionado, que aumentam substancialmente a demanda de energia e o escape de gases refrigerantes; ou centrais de dessalinização, que consomem muita eletricidade e lançam grandes volumes de salmoura potencialmente nociva nos sistemas hídricos que elas mesmas utilizam.
A boa notícia é que muitas tecnologias benéficas já estão disponíveis hoje de alguma forma, pois as mudanças climáticas não estão criando novas categorias de ameaças e sim amplificando ou intensificando as existentes – que várias regiões do mundo já enfrentaram antes. Na maioria dos casos (embora não em todos), disponibilizar essas tecnologias provavelmente não exigiria inovações adicionais nem suscitaria preocupações com as cadeias de suprimentos, visto que essas cadeias já existem. Além disso, muitas dessas medidas têm benefícios subsidiários e custos relativamente baixos. Por exemplo, respostas baseadas na própria natureza (como plantar árvores em áreas edificadas para criar arrefecimento natural por meio de sombra e vapor de água) podem ser soluções de baixa tecnologia, baixo custo e – um ponto muito importante – baixo carbono a esses problemas. Contudo, em vista dos riscos crescentes, a adaptação em larga escala também exigirá a resolução prévia de quatro desafios e a aplicação contínua da mentalidade de manejo dos riscos climáticos descrita acima.
Primeiro, embora a maior parte das tecnologias necessárias já exista, as habilidades e o tempo necessários para as produzi-las e implantá-las terão de ser reduzidos para torná-las viáveis. Por exemplo, uma pesquisa recente sobre trajetórias de desenvolvimento estimou que, até 2040, Brasil, Índia, Indonésia e México – alguns dos países mais afetados pelo estresse térmico – terão coletivamente cerca 100 milhões de famílias (ou 500 milhões de pessoas) sem condições econômicas para adquirir um condicionador de ar. Um estudo semelhante analisou a viabilidade dos custos da dessalinização concluiu que, no momento, esta é uma solução acessível a apenas 34 dos 140 países examinados – número que aumentaria para apenas 77 até 2050 sob as atuais trajetórias de desenvolvimento.
Segundo, tecnologias importantes com forte potencial de adaptação negativa (como ar condicionado e dessalinização) precisam ser aprimoradas para reduzir seu impacto contraproducente no clima, algo que talvez possa ser alcançado reduzindo a pegada de carbono das redes elétricas que as alimentam e o impacto dos seus resíduos (escape de salmoura e de gases refrigerantes).
Terceiro, a implantação de soluções com longa vida útil (por exemplo, diques e quebra-mares) precisa ser cuidadosamente gerida, pois tais soluções talvez precisem ser projetadas para resistirem não apenas aos riscos atuais, mas também a riscos futuros incertos.
Quarto, em alguns casos, inovações serão inevitáveis. Se soluções cruciais de adaptação tiverem implicações negativas nos esforços de mitigação – por exemplo, produção de concreto para reforçar e proteger ativos –, será preciso desenvolver rapidamente alternativas com baixa emissão de carbono, mas competitivas em eficácia, custo e disponibilidade.
4. Aceitação de intervenções comportamentais para adaptação a riscos físicos. Juntamente com as alavancas tecnológicas, intervenções comportamentais nos níveis individual, comunitário, empresarial, estadual ou nacional constituem uma maneira econômica de ajudar a reduzir riscos climáticos específicos. Em alguns casos, a adoção de intervenções comportamentais exigirá que as pessoas aceitem mudanças perceptíveis em seu comportamento ou estilo de vida, visto que tais mudanças podem afetar as preferências e os modos de vida da sociedade. Em outros, a aceitação de mudanças comportamentais implicará custos adicionais de redundância – por exemplo, a manutenção de estoques extras.
Essas alavancas podem incluir soluções como:
- Criar sistemas com redundância e buffers – por exemplo, ajustando os níveis de armazenamento de alimentos, criando sistemas reagentes à demanda que levem as pessoas a utilizar menos energia nos horários de pico ou aumentando a capacidade das baterias.
- Diversificar – por exemplo, incentivando uma variedade maior de atividades industriais a fim de reduzir a necessidade de trabalho ao ar livre ou adquirindo suprimentos de um maior número de produtores de diferentes regiões.
- Modificar as operações e o comportamento individual – por exemplo, ajustando a época de plantio na agricultura ou mudando o horário de trabalho para evitar os períodos mais quentes do dia.
- Reduzir a exposição a perigos – por exemplo, gerenciando a retirada controlada de ativos de áreas de alto risco ou evitando a construção de novos ativos nessas áreas.
Ao longo da história, inúmeras medidas de adaptação comportamental foram implementadas para lidar com pequenas oscilações climáticas naturais de ano para ano e com diferenças naturais entre os climas de diferentes regiões onde determinada indústria operasse. Hoje, no entanto, mesmo estratégias relativamente rotineiras teriam de ser aplicadas de novas maneiras para dar conta dos novos riscos. Por exemplo, uma prática bastante adotada em sistemas suscetíveis é criar redundância, ou buffers (como estoques maiores que o necessário para evitar a disrupção das cadeias de suprimentos). O problema é que esses buffers geralmente são baseados em dados históricos, hoje um mau guia para riscos futuros. Outras estratégias são menos maduras: por exemplo, incorporar riscos climáticos a decisões sobre onde colocar novos ativos. Enormes quantidades de capital continuam a ser investidas em áreas ou regiões de alto risco, mas em um mundo de riscos crescentes é preciso considerar meticulosamente a decisão de onde colocar novos ativos.
Tal como acontece com as alavancas tecnológicas, uma adaptação comportamental eficaz exige a criação de uma mentalidade de manejo dos riscos climáticos: obter os dados necessários e utilizá-los para compreender com precisão a evolução futura dos riscos climáticos relevantes, a nível tanto dos ativos como dos sistemas. Uma adaptação comportamental eficaz talvez exija, em alguns casos, mudanças maiores: alterações no horário de trabalho, por exemplo, podem exigir repensar os sistemas de transporte coletivo; e diversificar as redes de fornecedores talvez envolva a construção de novas relações e capacidades. A adaptação comportamental também requer um envolvimento efetivo com as comunidades afetadas, especialmente no que tange a medidas que reduzam a suscetibilidade a riscos. Os decisores devem ser capazes de comunicar, colaborar e se envolver a fundo com as comunidades, funcionários ou clientes que, em última análise, são quem terá que adotar os novos comportamentos e suportar seus desafios e custos. (Discutiremos isso mais detalhadamente no nono requisito.)
A disponibilidade de ajustes econômicos e sociais
O terceiro conjunto de requisitos para adaptação às mudanças climáticas são os ajustes econômicos e sociais: estruturas eficazes de alocação de capital e de financiamento, mecanismos de precificação e transferência de riscos, e mecanismos de compensação para estados, comunidades e instituições vulneráveis.
5. Estruturas eficazes de alocação de capital e de financiamento. Os ajustes econômicos e sociais exigem dois grandes conjuntos de ações: a elaboração de estimativas precisas das necessidades de financiamento e promoção das inovações financeiras necessárias para garantir o fluxo de capital público e privado para atividades que, em muitos casos, sempre foram da alçada do poder público.
No caso ideal, estimativas do custo do financiamento são feitas em seis etapas: adquirir uma compreensão granular dos riscos sob diferentes cenários de aquecimento, determinar o nível de riscos aceitáveis, identificar as alavancas de adaptação tecnológica e comportamental disponíveis, construir o equivalente conceitual de uma curva do custo marginal de abatimento (curva MAC), classificar por impacto e custo as alavancas de adaptação disponíveis, e utilizar essas informações para organizar uma estratégia abrangente alavanca por alavanca. Contudo, é possível que as alavancas menos dispendiosas e mais eficazes tenham consequências não pretendidas de adaptação negativa. Assim, as curvas dos custos da adaptação não podem ser aplicadas às cegas. Embora o caso ideal implique todas as etapas mencionadas acima, na prática uma simples priorização das alavancas de adaptação viáveis e disponíveis pode ser um bom ponto de partida.
Quanto a atender essas necessidades de financiamento, o dinheiro público já é escasso em toda parte, de modo que seriam necessários incentivos para aumentar o fluxo de capital privado para as atividades de adaptação. Visto que o financiamento privado geralmente exige retornos diretos e que as alavancas de adaptação raramente geram um fluxo direto de receitas, a única saída é a inovação financeira.
Conforme observamos, hoje quase todos os planos públicos e privados de adaptação (e, portanto, os cálculos de custos) são pouco elaborados, embora haja algumas exceções. O Plano Nacional de Adaptação de Bangladesh, que abrange os anos de 2023 a 2050, inclui estimativas de custos detalhadas. O plano identifica 113 intervenções específicas (organizadas em abordagens de curto, médio e longo prazo) que o país deve implementar em 11 regiões climáticas de alto risco. Integrado ao plano está um processo quinquenal de reavaliação – reconhecimento da natureza altamente incerta das ameaças climáticas e da vulnerabilidade socioeconômica, e confirmação de que os esforços de adaptação talvez precisem vir a ser ampliados ou reduzidos (ou ajustados em sua natureza) com o passar do tempo. O custo do plano total foi estimado, intervenção por intervenção, em cerca de $230 bilhões. Três quartos desse montante seriam necessários até 2040.
Atrair capital privado para suprir o financiamento necessário exigirá avanços em três frentes. Primeiro, os ativos que geralmente pertencem a parcerias público-privadas precisam ser adaptados; é o caso de redes elétricas, infraestrutura de transportes (como estradas e ferrovias) e sistemas de tratamento e manejo da água. Aqui, uma regulamentação aprimorada pode contribuir para que as medidas de adaptação sejam implementadas mediante uma combinação de financiamentos públicos e privados.
Segundo, os protagonistas do setor privado precisam aumentar os gastos com adaptação projetados em seus processos de planejamento de capital. Em muitas regiões, esta etapa é prejudicada não só por uma visão equivocada dos possíveis graus de risco, mas também não se saber ao certo se dinheiro público pode ou deve arcar com danos à propriedade privada.
Terceiro, novos mecanismos de financiamento privado da adaptação no setor público talvez possam ser desenvolvidos a partir de ideias como agrupar projetos de adaptação e mitigação (que assim compartilhariam as receitas e lucros das alavancas de mitigação, facilitando a implementação de alavancas de adaptação). Tais mecanismos também podem incluir a criação de créditos de redução da vulnerabilidade (uma ampliação da ideia de créditos de carbono): por exemplo, certificados negociáveis confirmando que um projeto conseguiu uma redução demonstrável de um risco climático mediante aplicação de medidas de adaptação. Em outras palavras, os custos da adaptação seriam reconhecidos cada vez mais não como oportunidades imediatas de receita, mas simplesmente como parte do custo geral de fazer negócios daqui para a frente.
6. Mecanismos eficazes de precificação e transferência de riscos. Hoje, grande parte da gestão das ameaças de desastres naturais envolve a transferência de riscos. Seguros são o principal mecanismo para transferir riscos de um só titular (que talvez não tenha recursos suficientes para assumi-los) para muitos (que coletivamente terão). Em muitos países, os governos ajudam a proteger casas e empresas de eventos físicos como incêndios, inundações e furacões. Muitas vezes, para eliminarem ou reduzirem os riscos, as pessoas preferem segurar suas casas do que investir em medidas de adaptação específicas (por exemplo, reforçando edifícios). Contabilizar os crescentes riscos climáticos nos prêmios de seguro poderia ser, em princípio, um mecanismo eficaz para transferir riscos, seja oferecendo melhor proteção aos segurados ou ajudando o mercado segurador a continuar funcionando de forma eficaz. De modo mais amplo, uma precificação precisa dos riscos significa tornar a comunidade de stakeholders ciente da sua magnitude total e permitir que decisões melhores de alocação de capital sejam tomadas. Compradores de imóveis residenciais, por exemplo, seriam informados dos riscos reais de inundação antes de concluírem uma aquisição.
No entanto, esta abordagem apresenta uma série de desafios. Hoje, por diversos motivos, os mercados têm dificuldade para precificar corretamente os riscos climáticos futuros. Para começar, isso requer as competências e habilidades descritas no primeiro requisito acima e uma compreensão profunda dos riscos climáticos – competências ainda são pouco disseminadas. Além disso, e talvez mais importante, traduzir impactos físicos em impactos econômicos é um campo de estudo incipiente tanto no meio acadêmico como entre os profissionais do ramo.3 Seria preciso intensificar a divulgação desses riscos para disponibilizar tais informações às instituições que precisam fixar preços, conforme discutido no primeiro requisito.
Uma vez incorporados esses riscos aos mecanismos de precificação, outros desafios podem surgir. Quando um risco climático é devidamente precificado nas projeções de sinistros futuros, é provável que os prêmios aumentem nas áreas de alto risco, tornando a transferência de riscos inacessível para alguns consumidores. Em certos casos, riscos difíceis de precificar podem fazer com que algumas áreas se tornem basicamente não seguráveis aos olhos das seguradoras. Os atuais níveis de risco já estão tendo impactos mensuráveis, seja aumentando o custo das catástrofes ou diminuindo a disponibilidade de seguros nas regiões mais atingidas. Por exemplo, ao longo dos últimos anos, o mercado de seguros patrimoniais na Costa do Golfo nos Estados Unidos foi gravemente afetado pelo aumento da intensidade dos furacões e das inundações litorâneas, de tal modo que dezenas de seguradoras declararam insolvência e centenas de milhares de apólices de seguros residenciais foram canceladas. Duas das maiores seguradoras até deixaram de oferecer seguros residenciais na Califórnia, tal o número de sinistros de incêndio.
Três modificações nos produtos e práticas das seguradoras podem aprimorar os mecanismos de precificação e transferência de riscos. A primeira diz respeito ao papel do governo no setor de seguros. Hoje, um número crescente de riscos não está coberto por seguros e os governos locais e nacionais já atuam como seguradoras de última instância, arcando com os custos de reconstrução após uma grande catástrofe. Esta prática poderá logo se tornar insustentável num mundo de riscos crescentes e, consequentemente, várias medidas (como programas mistos público-privados) devem ser consideradas para encorajar a preservação ou expansão dos mercados de seguros. Um exemplo (de outro campo) é a Lei de Seguros contra Riscos de Terrorismo (TRIA) dos Estados Unidos. No Reino Unido, a Flood Re cobra taxas anuais de todas as provedoras de seguros residenciais do país e utiliza esses recursos para reembolsar qualquer seguradora que precise arcar com sinistros válidos de danos causados por inundações. Mudanças na legislação, como aumentar o limite máximo dos prêmios de seguros ou exigir ações específicas de adaptação para se qualificar a um seguro, também poderiam ajudar a manter funcional o sistema de financiamento de riscos.
A segunda modificação envolve o mercado de resseguros (no qual as próprias seguradoras adquirem cobertura para sua exposição a eventos catastróficos), que poderia oferecer produtos como títulos-catástrofe para melhor amparar os mercados de seguros diretos e continuar dando suporte a mecanismos de seguros públicos e privados em regiões de alto risco.
Por fim, alguns modelos de apólices de seguro preveem prêmios maiores, franquias mais elevadas, mais incentivos para a resiliência e (potencialmente) a substituição de indenizações por estruturas alternativas. Essas medidas podem simultaneamente reduzir o custo dos seguros e alterar a natureza dos riscos cobertos. Por exemplo, seguros paramétricos permitem segurar riscos sistêmicos mediante pagamento de um valor fixo imediatamente após a ocorrência de um evento (como uma inundação ou um incêndio), independentemente de ter havido danos ou não. Esta abordagem proporciona maior certeza de custos, permite estipular os prêmios com maior precisão e reduz os custos operacionais das seguradoras.
Os impactos em populações vulneráveis também devem ser cuidadosamente considerados, pois são os grupos mais propensos a não terem nem seguro nem condições arcar com prêmios mais elevados. Uma opção seria garantir que os prêmios reflitam efetivamente a magnitude do risco, enquanto outras formas de suporte (por exemplo, programas de transferência) ajudariam as partes vulneráveis a pagar prêmios mais elevados. Entretanto, todo mecanismo compensatório deve ser meticulosamente avaliado a fim de evitar que subsidie comportamentos arriscados (por exemplo, continuar construindo novos ativos em locais onde as ameaças são particularmente elevadas), criando assim o chamado risco moral [moral hazard].
7. Mecanismos de compensação para estados, comunidades e instituições vulneráveis. O aquecimento continuado de nosso planeta provavelmente afetará desproporcionalmente as nações e regiões mais pobres e menos desenvolvidas. Essas partes do mundo enfrentarão os impactos físicos mais disruptivos, pois de modo geral situam-se onde as ameaças climáticas já estão mais próximas de limiares físicos e fisiológicos críticos. Os países de menor renda também sofrerão os maiores aumentos de carestia econômica, visto que muitos deles dependem da produção dos setores mais afetados pelas mudanças climáticas, como combustíveis fósseis ou agricultura. E são justamente essas regiões que parecem ter a menor capacidade de adaptação. Mesmo em regiões mais ricas do mundo, são os domicílios de baixa renda que terão mais dificuldades para conseguir o dinheiro necessário para se adaptarem a um clima em transformação.
Portanto, o sucesso de um programa global de adaptação exigirá o apoio financeiro de países desenvolvidos para países em desenvolvimento, e também entre regiões, províncias e pessoas das regiões mais desenvolvidas. Embora uma adaptação eficaz seja muito mais localizada do que a mitigação, mesmo assim a adaptação exigirá um nível sem precedentes de cooperação nacional e global, num espírito de equidade e com plena consciência de que o destino de todos os membros da família humana está inter-relacionado.
As estimativas do financiamento disponível para nações em desenvolvimento já indicam a existência de um descompasso financeiro na adaptação. Vários pesquisadores sugerem que o valor total pode estar subestimado, visto que o volume total de financiamento necessário para a adaptação climática provavelmente não foi corretamente calculado. Uma estimativa sugere que o custo anual da adaptação para as nações em desenvolvimento pode oscilar entre $160 e $340 bilhões até 2030. Com o tempo, é provável que o montante necessário seja ainda maior. Em vista dos níveis crescentes de alterações climáticas, o mesmo estudo conclui que o aumento do custo anual da adaptação deverá chegar a algo entre $315 e $565 bilhões até 2050 (Quadro 3). E o custo global total talvez seja consideravelmente maior, uma vez que essas estimativas não incluem os gastos que seriam necessários para os países desenvolvidos.
O total de fluxos bilaterais públicos relacionados ao clima, tanto para mitigação como para adaptação, que chegaram aos países em desenvolvimento foi de apenas $33 bilhões em 2020, de acordo com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Desse total, somente 36% ($12 bilhões) foram destinados especificamente à adaptação, enquanto outros 24% foram marcados como multifacetados.
Portanto, uma dimensão fundamental da adaptação é a criação de mecanismos que direcionem os fluxos financeiros às partes mais vulneráveis do mundo e promovam a adaptação de comunidades vulneráveis de todas as regiões. E se esses fluxos forem financiados por endividamento, também será imperativo reduzir o total da dívida da ajuda climática. O elevado custo do capital aumenta o nível de endividamento dos países em desenvolvimento e das comunidades ou regiões de baixa renda dos países desenvolvidos, prejudicando sua estabilidade fiscal de longo prazo e, portanto, sua resiliência face às contínuas alterações climáticas. Hoje, cerca de 70% dos fluxos de financiamento climático do Norte Global para o Sul Global são dívidas; apenas cerca de 10% consistem em empréstimos com juros baixos ou condições favoráveis. Em 2020, os países em desenvolvimento gastaram $400 bilhões em pagamentos de dívidas – quase quatro vezes o volume do financiamento climático oferecido.
Governança, instituições e compromissos
Os requisitos finais, e talvez os mais críticos, são instituições e políticas governamentais eficazes, conscientização e engajamento da comunidade, e o compromisso (entre si com as metas climáticas) dos líderes dos setores público e privado, tanto no nível global como local.
8. Instituições e políticas de governança eficazes. Instituições e políticas de governança eficazes são essenciais para a adaptação climática. Podem ajudar a forjar ambições coletivas, definir normas e compartilhar as melhores práticas. Essas instituições – locais, nacionais ou globais – têm a oportunidade de garantir o acesso a dados e educação sobre a adaptação climática (o primeiro e o segundo requisitos), de definir normas para a elaboração e implementação consistentes dos planos, de fornecer mecanismos para transferência efetiva de riscos e financiamentos (o quinto e o sexto requisitos), e de engajar e apoiar as comunidades afetadas (o sétimo requisito).
A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), por exemplo, elaborou normas e requisitos para planos nacionais de adaptação para os países em desenvolvimento, oferecendo-lhes financiamento e assistência técnica. A União Europeia, por sua vez, exige planos nacionais de cada um dos seus países membros. Da mesma forma, os avanços no setor privado estão ligados, ao menos em parte, a regulamentações existentes ou futuras – como, por exemplo, regras propostas pela Securities and Exchange Commission dos Estados Unidos.
Os organismos de normatização podem atualizar suas normas e diretrizes existentes para incluir estimativas de risco prospectivas. Também podem estabelecer regras para medições independentes dos riscos climáticos, elaboração de relatórios e ações de adaptação por parte de instituições ou comunidades. Por exemplo, o órgão regulador das empresas de serviços públicos da Califórnia está reforçando sua modelagem e planejamento da adequabilidade dos recursos e exigindo que as fornecedoras de eletricidade tenham capacidade de geração suficiente para fazer face a eventos extremos, como a onda de calor que provocou uma série de apagões em agosto de 2020. No Texas, uma lei recente (HB2555) permite que as concessionárias de serviços públicos desenvolvam e adquiram financiamento adicional para planos de resiliência contra condições climáticas extremas.
Além disso, a estipulação de normas tem papel importante não só para incentivar medidas de adaptação, mas também para assegurar que estas não provoquem uma adaptação negativa. Essas normas poderiam, por exemplo, exigir que os aparelhos de ar condicionado funcionem em níveis específicos de eficiência energética e que sejam utilizados apenas gases refrigerantes com baixo potencial de aquecimento global. Em termos mais amplos, as instituições de governança também terão de garantir que as vozes das comunidades afetadas sejam ouvidas nas tomadas de decisões.
Mas existem obstáculos sérios à criação de instituições e políticas eficazes no setor público. Para começar, as instituições de governança já enfrentam uma série de desafios, desde disrupções geopolíticas criadas por tensões e conflitos internacionais (que estão se tornando mais longos e intensos do que foram nas últimas cinco décadas) até turbulências macroeconômicas (por exemplo, níveis elevados de endividamento, inflação e desemprego) e crises de saúde pública (incluindo os ônus pós-COVID e o envelhecimento e adoecimento da população mundial). No futuro, os decisores responsáveis por infraestruturas críticas (como energia, água e transportes) e por normas civis (incluindo códigos de construção e a regulamentação dos setores financeiro e de seguros) precisarão buscar maneiras de harmonizar as iniciativas de adaptação climática com medidas ponderadas para resolver outras prioridades prementes. É até mesmo possível que seja necessário criar instituições ou políticas inteiramente novas para melhor orientar e coordenar os esforços de adaptação.
9. Conscientização e engajamento da comunidade. A adaptação comportamental e as mudanças na tolerância a riscos provavelmente terão um papel imenso no manejo de riscos climáticos físicos. O sucesso de qualquer estratégia de adaptação dependerá da disposição para agir das comunidades que dela participam (ou que são afetadas por ela). Os protagonistas públicos e privados cujas decisões afetam as comunidades ou outros grandes grupos de pessoas fariam bem em considerar três princípios ao elaborarem estratégias de engajamento: estruturar as propostas de adaptação em torno dos interesses dos indivíduos afetados, consultar de perto os grupos afetados durante o processo de planejamento e envolvê-los ativamente na implementação.
Os protagonistas públicos e privados que não fizeram do engajamento comunitário um componente central de suas estratégias de adaptação provavelmente não alcançarão suas metas, tendo em vista todos os hábitos e interesses preexistentes envolvidos em qualquer grande mudança social. E correm elevado risco de promoverem uma adaptação negativa: por falta de vivência prática, podem talvez recorrer a alavancas de adaptação insatisfatórias ou não compreender o contexto subjacente das comunidades envolvidas. Ou então a implementação dessas alavancas pode talvez ser injusta, pois os benefícios de uma intervenção de adaptação ficariam com alguns grupos em detrimento de outros.
Um exemplo de engajamento comunitário bem-sucedido vem de Zimbabué, onde mais de 500 coletivos urbanos pobres operam fundos de poupança para empréstimos que ajudam a financiar o desenvolvimento e a adaptação locais. Esses fundos pertencem e são operados pelas comunidades a que servem. Constituídos por uma combinação de poupanças locais, financiamentos públicos e doações filantrópicas, esses fundos são capazes de reagir a emergências climáticas concedendo rapidamente empréstimos com taxas de juros fixas e reduzidas, ajudando assim as comunidades ou seus membros a financiarem suas próprias prioridades de adaptação e recuperação. Embora este modelo aumente o endividamento, as dívidas pertencem à própria comunidade e os projetos são escolhidos por seus membros – um exemplo claro de tomada de decisões descentralizada pelo mais baixo nível apropriado de autoridade. A integração direta das comunidades nos processos de planejamento e execução de adaptação (isto é, da adaptação liderada pelos membros da própria comunidade) é uma prática cada vez mais comum, havendo muitos outros exemplos incipientes ao redor do mundo.
Entretanto, os stakeholders públicos e privados que quiserem trabalhar mais estreitamente com as comunidades onde operam (ou pelas quais são responsáveis) enfrentarão dois importantes desafios.
Primeiro, as organizações comunitárias precisam ser plenamente informadas não apenas sobre a natureza dos riscos climáticos que enfrentam, mas também sobre as opções de adaptação disponíveis, o modo como a adaptação serve a seus interesses e os prós e os contras de buscar abordagens específicas. As pessoas envolvidas terão que adquirir os conhecimentos necessários e desenvolver suas habilidades de comunicação e engajamento a fim de transmiti-los efetivamente e inspirar as comunidades a participarem desde o início de um diálogo acerca da adaptação.
Segundo, embora a descentralização da tomada de decisões traga benefícios, também traz o risco de uma adaptação negativa se incentivos perversos orientarem as prioridades da comunidade. Por exemplo, em alguns casos, os diálogos sobre adaptação liderados pela própria comunidade tentaram proteger no curto prazo o preço dos imóveis residenciais removendo importantes opções de adaptação dos processos de consideração e planejamento.
10. Líderes dos setores público e privado comprometidos com a adaptação e entre si, tanto a nível local como mundial. Uma adaptação eficaz requer uma liderança coordenada dos participantes de todos os setores, regiões e momentos. Tanto o setor público como o privado terão que se comprometer. Os líderes do setor público precisarão ser capazes de elaborar planos coerentes baseados em riscos tidos como aceitáveis e comunicados de forma transparente, que deverão ser atualizados regularmente. Paralelamente, os líderes do setor privado terão que considerar o que precisam fazer, ao longo de toda a cadeia de valor, para manter ou ajustar os modelos de negócio existentes. O setor financeiro, em particular, terá que encontrar oportunidades para financiar a adaptação e desenvolver novas formas de transferir riscos. Os líderes terão que agir em conjunto, como é imprescindível na transição para o net-zero, a fim de implementarem os blocos físicos de construção e garantirem os ajustes econômicos e sociais necessários para uma adaptação bem-sucedida.
Esse tipo de cooperação poderá assumir várias formas. No setor público, diferentes grupos e entidades precisarão trabalhar juntos para resolverem os desafios: por exemplo, a adaptação de uma comunidade a temperaturas mais elevadas exigirá coordenação entre os responsáveis por estradas, infraestrutura, saúde pública e recursos hídricos, para citar apenas alguns. Do mesmo modo, será preciso haver coordenação entre os governos locais e nacional. Entidades públicas e privadas também terão que coordenar suas atividades para garantir que as tecnologias, financiamentos e mecanismos de transferência de riscos adequados estejam disponíveis, e para que soluções de adaptação climática sejam implementadas. E será preciso haver coordenação e compromissos globais – a fim de direcionar fluxos financeiros para as partes do mundo que mais necessitam de adaptação, por exemplo, ou para desenvolver e compartilhar as melhores práticas. As parcerias filantrópicas público-privadas terão a oportunidade de possibilitar e solidificar esse tipo de cooperação e compromisso.
Os compromissos entre regiões geográficas não são a única questão; os líderes dos setores público e privado terão também que garantir a continuidade desses compromissos ao longo do tempo. Hoje, muitos líderes acreditam que estão sendo instados a planejar e agir em horizontes de tempo impraticavelmente longos. No entanto, em algumas partes do mundo, a adaptação climática é necessária já. Além disso, as decisões tomadas hoje podem ter uma longa vida útil (por exemplo, decisões de governos municipais sobre onde construir novas infraestruturas ou de empresas do setor privado sobre onde instalar novas fábricas). Assim, é vital que os stakeholders considerem o papel da adaptação climática na sua tomada de decisões do dia a dia.
Uma agenda para líderes
Serão necessárias ações continuadas de adaptação em todas as dez dimensões descritas acima. Como ponto de partida, os decisores devem pensar em fazer o seguinte:
Conduzir avaliações dos riscos climáticos para determinar as condições que podem provocar perdas e danos. Deve-se, primeiro, lidar com as questões mais importantes – por exemplo, qual nível de perdas e danos está associado a cada cenário de aquecimento (1,5°C, 2°C etc.) e quando cada nível de aquecimento deverá se materializar. É preciso realizar uma análise diligente que incorpore curvas de danos não lineares e também análises probabilísticas de eventos, em vez de se adotar uma abordagem excessivamente simplificada que dependa de alterações nas médias e nas curvas de danos.
Buscar os limites de adaptação alcançáveis para os riscos específicos que se enfrenta. Não se deve presumir que haverá adaptação para 100% dos riscos climáticos ou que todos eles possam ser transferidos. Será preciso considerar a possibilidade de que a limitação dos riscos exigirá mudanças fundamentais – nas estratégias de ativos e de localização, por exemplo.
Divulgar amplamente as conclusões. Para atingir os níveis necessários de conscientização e colaboração, será preciso incentivar o livre fluxo de informações sobre os recursos disponíveis e os possíveis riscos e desafios de vários cenários climáticos.
Empreender ações resolutas de adaptação hoje, enquanto ainda há margem para fazê-lo. Será imprescindível que todos os líderes colaborem para incorporar parcerias voltadas para o futuro. Eles deverão agir como bons guardiões e investir agora para que os líderes futuros tenham as ferramentas necessárias para atuarem efetivamente nos novos regimes climáticos que certamente enfrentarão.