Risco geopolítico: como se orientar em um mundo em transformação

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Neste episódio do McKinsey Podcast, o sócio sênior Andrew Grant e o diretor global de risco geopolítico Ziad Haider conversam com a diretora editorial global Lucia Rahilly sobre as mais recentes pesquisas McKinsey sobre risco geopolítico, inclusive como o panorama geopolítico está mudando, as implicações para os players globais e como os líderes podem sair do modo reativo e desenvolver a resiliência de que precisam para prosperar em meio à ordem global fragmentada.

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Depois, a sócia da McKinsey Jennifer Stanley revela uma lição aprendida no início de sua carreira sobre como superar a insegurança e confiar em sua experiência – extraída da nossa série My Rookie Moment.

O McKinsey Podcast é apresentado conjuntamente por Roberta Fusaro e Lucia Rahilly.

Esta transcrição foi editada para maior clareza e brevidade.

A transição para um mundo multipolar

Lucia Rahilly: A guerra na Ucrânia colocou em evidência o risco geopolítico e as disrupções bastante palpáveis que ela vem causando em diversas áreas: energia, alimentos, cadeias de suprimentos, e assim por diante. A guerra também redirecionou a atenção para a globalização, já que os mesmos laços que nos unem agora também nos apresentam os riscos da interdependência. Ziad, você pode nos ajudar a entender essas mudanças na dinâmica do panorama geopolítico?

Ziad Haider: Estamos em um período de transição de um mundo que costumava ser mais ou menos unipolar para um mundo bem mais multipolar. Do ponto de vista militar, ainda há a proeminência mundial dos EUA. Do ponto de vista econômico, os EUA ainda estão, é claro, em uma posição central, mas também há a UE e a China, então está muito mais para um mundo tripolar. Passando à dimensão política, ela está muito mais difusa em um momento no qual a governança global implementada após a 2ª Guerra Mundial simplesmente não está funcionando. Isso vem se desenrolando de forma mais acentuada em dois teatros diferentes: a Europa e o Indo-Pacífico.

Analisando a invasão da Ucrânia pela Rússia, a palavra “disrupção” não está à altura da situação, se pensarmos nos oito milhões de pessoas expulsas de casa e nos outros milhões sem aquecimento nem eletricidade neste inverno. As empresas estão tendo que conviver com esse abalo e, no nível humano, é algo profundamente trágico.

Ao mesmo tempo, temos o que está acontecendo no Indo-Pacífico, que é a crescente competição estratégica entre os EUA e a China. Há forças estruturais de competição em ação, o que vem suscitando uma pergunta que o primeiro-ministro japonês levantou de forma eloquente em Singapura, no Diálogo de Shangri-La: hoje, a Ucrânia; amanhã, a Ásia Oriental? Ao questionar isso, ele está se perguntando se a instabilidade que estamos vendo agora na Europa também pode ocorrer na Ásia, que é o motor do crescimento global.

Andrew Grant: Fiquei um tanto impressionado, nos últimos dois meses, com o número de líderes corporativos e globais que fizeram declarações do tipo: “Estamos vivendo agora em um mundo no qual a geopolítica fala mais alto do que os mercados de capitais”. Essa é uma afirmação de muito peso se você pensa na vida de um líder corporativo, cujo objetivo é otimizar de acordo com os mercados de capitais e administrar o valor de sua empresa.

Riscos para além das cadeias de suprimentos

Lucia Rahilly: Grande parte da discussão sobre o risco geopolítico tem se concentrado na resiliência das cadeias de suprimentos. Fale um pouco sobre alguns dos outros riscos que estão se agudizando e o que os líderes devem fazer para se preparar para eles.

Andrew Grant: Duas esferas me vêm à mente: a do capital e a das pessoas. As organizações globais costumam pensar que a alocação de capital varia muito conforme o risco do país ou os diferentes riscos geopolíticos. Você realmente aloca essa quantidade de capital? Tem expectativas diferentes com relação aos prazos? Pensa mais em fazer parcerias e usar o capital de outras pessoas? Os riscos não são a única parte disso que requer análise. As empresas também precisam repensar sua abordagem básica da alocação de capital.

Idem no que diz respeito às pessoas. Temos expectativas de que os talentos que trabalham nas organizações sejam muito globais. Eles querem fazer parte de uma organização global conectada. Estamos vendo que a nacionalidade está passando a importar muito mais. Os líderes devem trabalhar para manter sua organização coesa quando muitos de seus funcionários estão sujeitos a muito mais forças nacionalistas do que costumavam estar. Os líderes com quem falamos e interagimos estão um tanto preocupados com a questão de como fomentar uma cultura global em um mundo que não é nem de longe tão receptivo a isso quanto costumava ser.

Os riscos não são a única parte disso que requer análise. As empresas também precisam repensar sua abordagem básica da alocação de capital.

Andrew Grant

Ziad Haider: Quanto às cadeias de suprimentos, também vale a pena pormenorizar os riscos de manter uma cadeia de suprimentos em um mercado desafiador do ponto de vista geopolítico. Muitas empresas estão fazendo isso, mas precisam ter muito mais cuidado e empenho para garantir que não haja, por exemplo, trabalho forçado envolvido nessa cadeia de suprimentos.

Há uma dimensão da cadeia de suprimentos que está se direcionando a países menos desafiadores geopoliticamente – o que alguns chamam de “friend-shoring” –, como a Índia, a Indonésia e o Vietnã. Existem também desafios e oportunidades no plano regulatório e em outros aspectos. E há o fenômeno de levar as cadeias de suprimentos de volta ao país de origem, o que está ligado aos temas da política industrial que estamos vendo. Essas três dinâmicas ou facetas das cadeias de suprimentos estão todas interagindo ao mesmo tempo.

O outro risco, além dos relacionados às pessoas e às cadeias de suprimentos, é o risco reputacional. Como você pode manter uma presença global, mas ser capaz de responder à pergunta sobre por que atua nesse mercado problemático? Subiu o padrão de exigência dos stakeholders – externos, como a mídia e o poder legislativo, e internos, como os colegas – em termos das explicações que você dá sobre onde está e por que está lá. Isso é algo que as empresas precisam equilibrar. O que você diz em um mercado aparece bem rápido no outro, então também não é possível escamotear suas mensagens sem sofrer consequências.

Mudanças no mundo, mudanças na reação ao risco

Lucia Rahilly: Vemos em nossas pesquisas McKinsey que o risco geopolítico está no topo da pauta dos CEOs. Os líderes empresariais sabem que precisam agir. Porém, historicamente, pelo menos nos países ocidentais, os líderes pareciam mais propensos a abordar o risco geopolítico de maneira eventual, à medida que surgiam crises específicas ou riscos específicos. Qual é a mudança de abordagem que os líderes devem adotar agora?

Andrew Grant: O primeiro passo é desenvolver um nível de conscientização e compreensão das questões que estão em jogo e das implicações para a organização. Em segundo lugar, há um grau de profissionalismo e algumas novas capacidades cruciais que as organizações precisam desenvolver em reação a essa conscientização. Um alto grau de profissionalismo é necessário para entender as implicações jurídicas e regulatórias das leis de países com alcance extraterritorial.

A geopolítica não é igual para todos. Ela afeta países diferentes de forma diferente. Os líderes precisam fazer certas perguntas: o que pensar a respeito disso? Como categorizar? Como ter uma linguagem comum dentro da organização para fins de entendimento, tomada de decisões, coordenação e criação de uma empresa global?

Ziad Haider: O mundo mudou, e isso obriga as empresas a ser mais minuciosas. Se pensarmos na década de 1990, foi uma era de hiperglobalização liderada pelos EUA. Os EUA estavam promovendo a entrada da China na OMC. Tivemos até discussões sobre a Rússia entrar na OTAN. É difícil imaginar isso no momento atual. Observamos uma mudança de rumo, e agora temos o ressurgimento da quase antiquada competição de grandes potências entre o teatro da Europa e o do Indo-Pacífico.

Ao mesmo tempo, dentro dos próprios EUA, essas questões sobre seu papel global e a proposta de valor da globalização irrestrita estão sob pressão. E algumas delas são questões muito importantes e saudáveis. Na década de 1990, havia a ideia de que, com entrada de multinacionais gigantes nos mercados globais, poderia haver um fenômeno de mudança por meio do comércio internacional. Seria possível transformar os mercados, torná-los mais abertos e mais democráticos.

Essa ideia irrestrita de ser uma corporação multinacional global tem sido testada em seus fundamentos. Agora a questão é: como ser global?

Ziad Haider

Agora, para muitas pessoas que estão saindo da invasão da Ucrânia pela Rússia, há a questão: “Isso se sustenta?”. Será mesmo possível estar em alguns desses mercados difíceis e esperar mudá-los significativamente? Ou é necessário ser cuidadoso e perspicaz e não estar em alguns desses lugares? Se você estiver neles, deverá explicar o porquê. Essa ideia irrestrita de ser uma corporação multinacional global tem sido testada em seus fundamentos. Agora a questão é: como ser global? E também: qual é a maneira correta de fazer isso neste panorama geopolítico?

Um quadro para a resiliência

Lucia Rahilly: Dê-nos uma visão geral do que os líderes devem fazer de maneira diferente para se planejar para o risco geopolítico e se tornar mais resilientes geopoliticamente. Quais são as categorias gerais que devem ser levadas em conta?

Andrew Grant: Há países que eu descreveria como tendo riscos geopolíticos bastante localizados. São riscos substanciais para as operações exatamente nessa região geográfica específica. No entanto, algo que estamos descobrindo com relação a muitas empresas globais é que às vezes elas estão em 35 países, 40 países que têm esses riscos geopolíticos locais. Quando você soma esses países, trata-se de um portfólio de risco bem significativo.

No outro extremo do espectro, pode-se dizer que, pela primeira vez na história recente, temos duas superpotências geopolíticas genuínas: os EUA e a China. Para as empresas que têm atuação significativa nesses dois lugares, há considerações geopolíticas muito reais devido à grande competição por poder.

E no meio há países que têm riscos militares globais autênticos, riscos de defesa e segurança, e aqueles que têm o que eu descreveria como riscos de reputação relacionados aos direitos humanos, riscos estes que são bastante globais por natureza. Esses países que estão no meio são tipicamente nações de importância legítima que figuram muito significativamente nas operações globais de uma empresa global. Há outros quadros, mas, para as empresas verdadeiramente globais, achamos que o nosso quadro é bastante útil.

Diríamos, além disso, com relação aos EUA e à China, que o mundo nunca viu duas potências dessa magnitude que também têm tamanha interconexão entre si. Obviamente, existem dimensões, como a dos direitos humanos, que são bem desafiadoras e problemáticas. Mas, no outro extremo do espectro, é notável a colaboração que vem acontecendo entre os EUA e a China no tema do clima. É um quadro muito mais matizado e refletido que se precisa ter em torno de um relacionamento incrivelmente complicado, interconectado e dinâmico que também precisa ser monitorado e gerido de maneira muito ativa.

Ziad Haider: O Andrew acertou na mosca: o foco do conselho de administração e da liderança precisa ser muito mais minucioso. A cada mês, o conselho precisa analisar os cinco principais mercados que geram preocupações geopolíticas e criar um plano de ação claro sobre o que será feito para gerir esses riscos – e isso parte de um conjunto comum de fatos.

Neste mundo global, existem pontos de vista diferentes até dentro de uma mesma organização. Você deve pensar em como o conselho será instruído a respeito desses tópicos. Existe um padrão de fatos comum? Como você monitora os riscos de maneira operacional, não apenas acadêmica?

Estamos vendo muitos de nossos clientes investir em seus recursos clássicos de assuntos corporativos, sua equipe jurídica e, dado o aumento das mudanças regulatórias, sua equipe de assuntos governamentais. Fazemos perguntas do tipo: com quem você está falando na linha de frente? Qual é a sua cobertura aérea? Como você está desenvolvendo isso?

Outras questões que são bem importantes para os clientes: como pensar na sua presença estrutural, seja a sua pilha de tecnologia, seja a sua estrutura corporativa em um mercado? Existem graus de liberdade a ser criados ou riscos a ser geridos se você tiver uma pilha de tecnologia separada em um país ou se tiver uma entidade corporativa separada? Por outro lado, em algum momento, toda a responsabilidade vai para a sede. Então, as empresas estão abordando a questão da presença certa a ter.

Por fim, o lado humano da gestão do risco geopolítico é crucial. As pessoas têm sua própria geopolítica. Não é tanto o interesse delas; é apenas um ponto de vista do lugar onde crescem. Portanto, é muito importante abordar esses diferentes pontos de vista em uma organização para mantê-la forte, coesa e atuando de uma mesma maneira. Como ter uma visão de mundo comum? E, caso haja diferenças, como você as concilia para ter uma posição firme e clara sobre um assunto?

Andrew Grant: Outro ponto é a importância da mentalidade, inclusive a do conselho e a da alta administração. A mentalidade que eu enfatizaria é a de humildade.

Eu e o Ziad tivemos o privilégio de nos encontrar com o diretor de relações governamentais de uma das maiores e mais sofisticadas empresas do mundo. Ele declarou que eles direcionaram mais recursos ao desafio geopolítico ao longo do último ano do que jamais poderiam ter imaginado. Agora, eles entendem os problemas com incrível fidelidade, sem grandes respostas. A humildade é um ponto de partida muito importante.

Ninguém tem o monopólio da perspectiva correta. É muito importante que as empresas globais entendam que esses são problemas bastante tridimensionais que devem ser vistos por um prisma verdadeiramente global, não apenas nacional. A postura correta raramente é preto no branco. E, mesmo que seja preto no branco hoje, pode não ser amanhã.

Lucia Rahilly: A maioria das empresas já está seguindo nessa direção? Ou só as maiores, como você acabou de descrever?

Ziad Haider: Sem dúvida, há elementos disso acontecendo; o risco geopolítico não é novo. Empresas de certos setores, como petróleo e gás, lidam com essas questões há muitas décadas. Mas há outras – por exemplo, do setor de tecnologia – que ainda precisam encarar esses problemas. Pense na sua pilha de tecnologia em um mundo em fragmentação, com regulamentos diferentes em jurisdições diferentes. Essas são questões novas. Muitas empresas estão tendo que lidar com essas novas facetas.

Andrew Grant: Muitas grandes empresas globais sentem que investiram muito nisso. Algumas semanas atrás, um CEO me procurou para perguntar sobre um desafio que estava enfrentando e disse que, por muitos anos, “sempre soubemos o que é necessário para uma empresa obter um crescimento extra”. A pergunta dele foi: “Será que é possível pegar essas coisas novas que estamos fazendo para abordar o risco geopolítico e usá-las para deixar a minha organização suficientemente melhor e com resiliência adicional? As pessoas me veriam como uma boa opção para encarar e prosperar em um mundo que está ficando mais arriscado geopoliticamente?”. É uma ideia bem interessante, mas não acho que muitas organizações chegaram lá, se é que alguma chegou.

Ponderar sobre a necessidade de assumir uma posição – em público

Lucia Rahilly: Os líderes precisam se concentrar em desenvolver resiliência em toda a organização. Mas que papel eles devem desempenhar agora nas discussões públicas sobre questões geopolíticas?

Ziad Haider: Esse é outro aspecto que vale a pena pormenorizar. O ano passado foi sísmico. Quando olhamos para as mais de mil empresas que saíram da Rússia, de acordo com um monitoramento da Universidade de Yale, grande parte dessas saídas também foi uma expectativa de que o CEO e a empresa assumissem uma posição. Estamos muito orgulhosos da posição que a McKinsey assumiu nesse caso.

A Edelman publica um Barômetro da Confiança sobre as expectativas que se tem dos CEOs com relação a diversos assuntos. O barômetro do ano passado mostra uma clara expectativa de que os CEOs tomem posição a respeito de questões geopolíticas na esteira da invasão da Ucrânia pela Rússia. Coletivamente, isso significa uma situação na qual não se trata apenas de responsabilidade social corporativa, mas de falar sobre responsabilidade política corporativa e assumir uma posição clara.

Vemos três posturas ou posições diferentes. Há posições de coragem que não são isentas de custos. Há posições de necessidade que as empresas às vezes assumem porque estão sendo obrigadas a opinar sobre um problema, seja interna, seja externamente. E também há posições de humildade quando as empresas cometem erros. Às vezes, como líder, você precisa dizer: “Olha, nós erramos. E vamos consertar isso desta maneira”.

A expectativa, em sentido amplo, de que os CEOs se manifestem sobre esses assuntos sociais e políticos no ambiente das redes sociais vem aumentando. Mas eu diferenciaria um pouco os diversos tipos de posições que eles podem ou não precisar assumir ao longo do caminho.

Andrew Grant: Na minha opinião, o público mais importante é o seu próprio pessoal – certificar-se de que é autêntico, real, algo que se vive, e de que o seu pessoal acredita nisso e sente que é uma representação precisa de quem vocês são e do que fazem de fato.

Ziad Haider: Também acho importante pensar de maneira crítica sobre as implicações de assumir uma posição pública, como dizer “estamos saindo deste mercado” ou “estamos adotando uma visão baseada em princípios” para seus funcionários em outra parte do mundo.

Essa é uma peça importante porque muitas vezes essas discussões vão para a sede, e uma decisão é tomada falando-se para um público ocidental ou para determinado conjunto de públicos. Porém, as implicações físicas e de segurança para os colegas no mercado impactado podem ser bastante graves. Então, quando a próxima crise vier, acho mesmo que muitas empresas precisarão pensar em como, quando e com que intensidade vão articular uma posição quando absolutamente precisarem ou acharem que devem.

Quando as visões dos colegas divergem

Lucia Rahilly: Interesses divergentes são inevitáveis dentro das empresas globais. Como os líderes devem se preparar para lidar com esses interesses geopolíticos conflitantes em sua base de funcionários antes que aconteça uma crise?

Andrew Grant: As empresas precisam estar preparadas e ser ponderadas com antecedência, sabendo que isso exigirá algumas decisões corajosas, decididas e caras. Também é importante pensar em como uma corporação global fica em um mundo muito diferente do atual. Precisamos repensar alguns aspectos importantes de como as corporações vão operar, da mesma forma que repensamos as multinacionais em seus fundamentos de forma muito significativa após a queda do Muro de Berlim.

Ziad Haider: Nós tendemos a falar muito sobre o que uma organização deve fazer para gerir o ambiente externo. Três coisas me vêm à mente. Em primeiro lugar, qual é a mentalidade que se leva a essas conversas? Se eu realmente quero tentar me colocar no lugar do meu colega e entender a posição dele, em vez de abordar isso do ponto de vista de que “tenho o monopólio da verdade”, isso ajuda muito a humanizar essas discussões.

Há também a questão de como a liderança sinaliza. Vemos agora, em alguns desses mercados mais complicados, que os CEOs, por exemplo, estão se abrindo para a China. É importante sinalizar isso: a liderança está se manifestando? Você pode substituir a China por qualquer mercado complicado que há por aí.

A terceira coisa são os fóruns que você está criando na sua própria organização – os comitês de risco, as reuniões abertas. Eles refletem adequadamente a natureza global da sua organização? As pessoas sentem que sua voz está sendo ouvida?

É um ponto básico, mas é importantíssimo porque muitas vezes essas organizações se direcionam muito rapidamente para algumas pessoas da sede. O outro lado da moeda é que não pode haver transparência total. Alguns desses assuntos são delicados. Então, novamente, concordo com o que o Andrew disse: é preciso ter humildade a esse respeito.

Lidar com as nuances

Lucia Rahilly: Falamos sobre as reações à invasão da Ucrânia pela Rússia. Essa foi uma questão clara e definida para muitos líderes, por diversos motivos. Entretanto, a maioria das questões geopolíticas costuma ser muito mais difícil de analisar, mais complexa. Alguma recomendação sobre como proceder nesses casos?

Andrew Grant: Na minha visão, a resiliência é um pouco como um músculo. Há o bem e o mal; isso é bastante claro em algum nível, mas não em todos os níveis. Portanto, você deve se certificar de que está levando a abordagem certa e as ferramentas certas ao problema certo, além da quantidade certa de coragem moral, chamando de questões de direitos humanos coisas que são genuinamente questões de direitos humanos.

Se há interesses comerciais, nacionais e de poder e questões de política industrial nacional, vamos chamá-los pelo nome, em vez de misturar tudo em algo do tipo “nós somos os mocinhos, eles são os bandidos”. Acho que precisa haver certa sofisticação e coragem, mas também fidelidade às questões em pauta, caso a caso.

Ziad Haider: Parte da capacidade de lidar com essas áreas cinzentas consiste em pensar nelas com antecedência. O que muitas empresas estão fazendo é o exercício do planejamento de cenários clássico, pensar em uma variedade de cenários. Elas olham para os pontos de atenção para ter uma ideia de qual caminho a coisa está tomando e pensar em quais posições elas assumiriam. Esse é exatamente o tipo de músculo que estamos falando que é necessário desenvolver quando acontecem esses eventos e essas mudanças repentinas na geopolítica.

Isso não é capaz de levar você até o final, porque não é possível prever todos os cenários nem a velocidade dos eventos. O conflito Rússia-Ucrânia é bem interessante porque houve uma escalada militar russa prolongada. Todos nós vimos que iria acontecer algo. Por outro lado, não esperávamos que houvesse uma invasão completa, com tentativa de chegar a Kiev.

Portanto, há lições sobre preparo que muitas empresas estão tirando da experiência da Rússia-Ucrânia e já estão tentando aplicar ao contexto da Ásia. Parte da resposta é basicamente pensar nessa gama de cenários – não apenas em protocolos, mas em como você reagiria. Você faria uma declaração? Assumiria uma posição? Isso faz parte do desenvolvimento de uma postura.

O que está em jogo, em última análise

Lucia Rahilly: Os líderes estão enfrentando um dos panoramas operacionais mais desafiadores dos últimos anos. E criar uma abordagem no âmbito de toda a empresa para desenvolver essa musculatura geopolítica, como você descreveu, Andrew, pode ser um grande investimento em um momento agitado. Ao conversar com líderes que talvez estejam trabalhando sob pressões de curto prazo, o que você coloca como sendo a questão número um que está em jogo para eles?

Andrew Grant: Se você acredita mesmo em um mundo no qual a geopolítica fala mais alto do que os mercados de capitais, então essa é claramente a sua prioridade número um. Líderes que reconhecem que a geopolítica é sua questão número um entendem que seu ponto de vista deve ser compartilhado com sinceridade e que devem se esforçar para expressar sua perspectiva.

Também acredito sinceramente que há uma oportunidade de criar uma empresa mais moderna, mais evoluída para o novo contexto geopolítico. E há uma recompensa muito significativa quando se tem resiliência extra.

Se você só tem a esperança de que 2019 volte, ficará bem decepcionado. É um novo mundo, e você terá que exercitar novos músculos. Isso exigirá atenção e fomento reais por parte da liderança, além de decisões de alocação de recursos que muitas vezes são bastante corajosas. E há uma recompensa concorrencial muito significativa – quem fizer isso de maneira mais resoluta, mais corajosa e acelerada é quem vai prosperar na próxima era.

Ziad Haider: Número um, se você não se concentra nessa questão, possivelmente coloca seu pessoal em risco, dependendo do mercado. Número dois, você coloca seu crescimento em risco, sua presença nesse mercado. E número três, você se coloca em risco jurídico se não estiver em conformidade com os diferentes regimes regulatórios de sanções e de controle de exportações. Portanto, há consequências reais e uma crise múltipla para gerir aqui.

Algo que acho que todos os conselhos deveriam fazer em 2023 é colocar no papel os cinco principais mercados onde têm mais exposição geopolítica, olhá-los lado a lado e discutir: “O que precisamos fazer para gerir melhor nossa posição nesses mercados?”. Pelo que eu e o Andrew estamos vendo, muitos conselhos estão gravitando em direção às grandes questões relacionadas à China – mas não necessariamente com o grau certo de detalhamento.

E aqui, devido ao conflito Rússia-Ucrânia, estamos vendo certas oportunidades em termos de uma transição energética acelerada. Estamos vendo sair algo da tensão no Indo-Pacífico com relação ao “friend-shoring”, o que torna algumas outras regiões geográficas e alguns outros países mais cruciais. Então, como você se posiciona?

Lucia Rahilly: Andrew e Ziad, ótima discussão. Muito obrigado por estarem conosco.

Andrew Grant: Muito obrigado por promover esta conversa excelente.

Ziad Haider: Muito obrigado, Lucia. É um grande prazer estar aqui com você.


Roberta Fusaro: A sócia da McKinsey Jennifer Stanley estava convencida de que sua falta de experiência em negócios a impediria de fazer um bom trabalho em um projeto de fusão e aquisição. No entanto, como seu gerente apontou, ela tinha, sim, as habilidades necessárias – só não tinha a confiança necessária. Saiba mais a respeito em um trecho da nossa série My Rookie Moment.

Jennifer Stanley: A primeira vez que eu trabalhei em um projeto que envolvia uma fusão e uma aquisição foi aterrorizante para mim, sinceramente. Eu não fiz faculdade de administração. Não tinha ideia do que o termo “due diligence” significava no universo das fusões e aquisições.

E aí eu me vi em um projeto no qual me pediram para fazer alguma modelagem sobre um potencial parceiro de joint venture para o cliente que estávamos atendendo. Na verdade, eu não fazia ideia de como começar a criar o modelo e, francamente, estava meio em pânico porque sabia que, para algo como isso, as expectativas eram bastante altas.

O que fiz em primeiro lugar para me acalmar foi encontrar um mentor que eu tinha conhecido quando estava sendo contratada para o meu emprego aqui na McKinsey. Simplesmente confessei: “Estou muito nervosa. Para falar a verdade, não tenho certeza do que estou fazendo”. Ele me pediu para descrever como era quando eu estava na minha melhor forma, na pós-graduação, e comecei a descrever uns modelos estatísticos, mas no contexto das ciências sociais. Ele disse: “Perfeito. Você sabe construir um modelo. Só está usando tipos de dados diferentes”.

Meu mentor sugeriu, então, que eu fosse falar com o meu gerente e escrevesse uma lista das coisas que eu achava que poderia levar para o estudo e que eram pontos fortes – coisas que ajudariam na investigação que estávamos nos preparando para fazer – e que fosse ousada e pedisse a ele para me alinhar a fluxos de trabalho que, de alguma maneira, correspondessem às coisas nas quais eu era boa para que eu pudesse ganhar algum impulso. Para a minha alegria, o que eu achava que seria uma conversa bem difícil na qual eu teria que dizer que nunca tinha feito esse tipo de projeto antes, foi tranquila. Meu gerente disse: “Graças a Deus. Agora você sabe que sabe algo que pode ser bem aproveitado neste projeto”.

Se peço ajuda a alguém e essa pessoa me orienta e nós redefinimos a natureza da contribuição que posso dar, eu provavelmente sei mais do que acho que sei.

Jennifer Stanley

O que aprendi é que, se peço ajuda a alguém toda vez que me deparo com um novo problema ou oportunidade e essa pessoa me orienta e redefinimos a natureza da contribuição que posso dar, eu provavelmente sei mais do que acho que sei. E provavelmente há uma maneira de aumentar o impulso, reforçar a minha confiança e dar uma ótima contribuição à equipe e ao cliente.

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