Este talvez seja o momento mais desafiador em mais de uma geração para ser um CEO. A incerteza global, uma série perturbadora de disrupções provocadas pela tecnologia e o número crescente de riscos somaram-se a um volume já desalentador de pressões sobre a gestão de uma empresa.
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Essas pressões certamente ajudam a explicar a importância crescente da construção de novos negócios. Mais da metade dos CEOs e líderes empresariais consideram a construção de novos negócios uma de suas três principais prioridades, sendo que para 21% deles é a prioridade máxima.1 Ainda mais revelador é que os líderes empresariais esperam que, em cinco anos, 50% da receita total de suas empresas virão de novos produtos, serviços e negócios.2 E, visto que os líderes têm diante de si perspectivas econômicas cada vez mais preocupantes, a construção de novos negócios é também um pilar importante na criação de resiliência. Durante a pandemia de COVID-19, constatamos que as organizações cuja principal estratégia de crescimento orgânico foi a criação de novos negócios se mostraram mais resilientes, relatando quedas menores ou aumentos maiores na taxa de crescimento do que seus pares.3
Mas essas aspirações por novos negócios são simplesmente impossíveis se não houver um CEO ativo e plenamente engajado. Na verdade, se o CEO não estiver disposto a se comprometer, provavelmente será melhor que a empresa não busque novos negócios.
Prioridades conflitantes significam que os CEOs precisam estar cientes dos aspectos singulares de seu cargo que lhes permitem ter o máximo impacto na construção de novos negócios (veja Box, “Características e comportamentos do CEO que favorecem novos negócios”). Uma função importante do CEO é, obviamente, delegar várias tarefas a equipes e capacitar líderes em toda a empresa. Contudo, nossa pesquisa, combinada com nossa experiência na construção de mais de 300 novos negócios, revela a existência de muitas atividades nas quais o envolvimento do CEO tem impacto desproporcional – seja reforçar continuamente as aspirações, dar apoio sistemático a novos negócios ou resolver tensões e obstáculos organizacionais naturais.4
Ao investigarmos essas atividades, descobrimos que há cinco tarefas que não podem ser delegadas – tarefas que somente os CEOs, com seu foco estratégico abrangente e autoridade para tomar decisões, podem realizar. Quando adotam essas medidas como parte de um roteiro pessoal claro, o caminho está aberto para o sucesso na construção de novos negócios.
1. Almeje alto: Esforce-se para lançar unicórnios
Visto que as empresas esperam que 50% de suas novas receitas venham de novos negócios, produtos e serviços, elas precisam mirar alto.
Muitas vezes, porém, novos negócios não geram valor transformacional: cerca de quatro em cada cinco geram menos de US$ 50 milhões em receitas, segundo nossa pesquisa.5 O CEO tem um papel desafiador a desempenhar para assegurar que o tempo e os recursos que um novo negócio exige valham a pena. O foco do CEO deve privilegiar o valor: isso é crucial para evitar que a organização se distraia com a mais recente ideia genial, que pode até parecer boa mas não tem potencial de mercado para ser transformadora.
Para orientar a empresa inteira a esse nível de valor, o CEO deve começar identificando uma aspiração clara, metas ambiciosas e alvos específicos. Por exemplo, o CEO de uma seguradora deixou explícito que queria quadruplicar o tamanho do negócio B2C em apenas cinco anos criando uma nova oferta digital B2C centrada no cliente. Desde o início, as metas incluíram marcos bem definidos e ambiciosos – por exemplo, lançar um produto mínimo viável em cinco meses, iniciar operações em dois novos países em um ano e indicadores-chave de desempenho operacional (KPIs) ousados, como um milhão de visitas ao site da empresa nos primeiros nove meses.
Outro exemplo é Patrick Hylton, presidente e CEO do NCB Financial Group, o maior e mais antigo banco da Jamaica. Hylton supervisionou o lançamento do Lynk, o negócio de pagamentos digitais do banco. Estabeleceu como meta um market share de 35% a 40% do universo das pessoas sem conta bancária. “Tenho enormes ambições para o Lynk, o negócio de pagamentos digitais que lançamos”, explicou. “Quero rivalizar e até superar o líder atual.”6 Essa mentalidade está alinhada com um padrão geral que constatamos em CEOs bem-sucedidos: suas ambições são excepcionalmente ousadas.7
Ambições ousadas são particularmente importantes quando existe clareza direcional acerca da proposta de construção de negócios e de seu valor mas não há convicção suficiente em algumas partes da empresa para se investir na contratação de um número significativo de pessoas ou na construção dos ativos tecnológicos necessários para capturar a oportunidade. Se o CEO não interferir nesses momentos e atuar como uma ponte, impulsionando as decisões, granjeando apoio ativamente ou fixando prazos específicos, a iniciativa acabará paralisada e a empresa retornará ao business as usual. Uma parte importante do papel do CEO, como aprendemos com transformações de negócios em outros contextos, é ajudar a organização a evitar esses problemas de ação coletiva.
Inevitavelmente, alguns novos negócios fracassarão. Os CEOs não devem se apegar muito a um único negócio, e sim focar sua energia onde está o valor real: em desenvolver a capacidade de construir negócios seguidamente. Construtores seriais de negócios geram, em média, receitas 40% maiores para cada novo negócio que criam do que construtores que estão criando um novo negócio pela primeira vez. Por esse motivo, os CEOs precisam concentrar sua energia na gestão de um portfólio de novos negócios (recalibrando estratégias, por exemplo, e realocando recursos) e fortalecer o vigor institucional da organização na construção de negócios.
2. Proteja o novo negócio do business as usual
Nossa análise deixa claro que alocar verbas protegidas para o novo negócio é uma das coisas mais importantes que o CEO pode fazer. Os CEOs devem investir o suficiente e, sem perderem o ritmo, proteger esse dinheiro quando as alas mais renitentes da empresa inevitavelmente tentarem retomá-lo tão logo surja algum problema.
Na prática, obter promessas de investimento costuma ser mais fácil do que obter e distribuir o investimento em si, pois os financiamentos tendem a seguir um processo tradicional (e inflexível) que está sujeito aos ciclos orçamentários anuais e é guiado pela demonstração de lucros e perdas. Em virtude disso, o financiamento poderá não ser liberado quando necessário ou os fundos serão retirados de outras iniciativas, o que gera ressentimento no negócio original. Para garantir a independência financeira do novo negócio, o CEO precisa estabelecer uma fonte exclusiva e protegida de financiamento, além de uma abordagem orçamentária ágil, com etapas sequenciais bem definidas (stage gates), como ocorre com o capital de risco, pela qual cada parcela do financiamento é desbloqueada quando o novo negócio atinge determinados marcos.
O CEO precisa estender essa postura protetora para preservar a independência do novo negócio. Embora seja tentador utilizar ferramentas e processos já estabelecidos em TI, RH e marketing, por exemplo, aprendemos a duras penas que tais ferramentas e processos vêm acompanhados de inúmeros impedimentos burocráticos capazes de provocar custos excessivos e atrasos significativos.
Na verdade, os protocolos e processos do business as usual podem representar um grave perigo para o novo negócio e, portanto, exigem a intervenção ativa do CEO. A nova entidade precisa de novos mecanismos de financiamento, com expectativas que não estejam vinculadas ao ciclo trimestral da demonstração de lucros e perdas. Os marcadores de sucesso também são outros; é crucial deixar bem claro quais são os KPIs mais importantes para o novo negócio – por exemplo, crescimento da receita, atingimento de marcos decisivos ou experiência do cliente – e assegurar que a liderança esteja alinhada com eles. As estruturas de remuneração e os processos de contratação existentes tendem a não ser apropriados para atrair novos talentos, mas são difíceis de modificar porque exigem que o CEO trabalhe em estreita colaboração com a chefia de RH.
Em um grande banco regional, as práticas existentes de integração (onboarding) de novos fornecedores consumiam muito tempo devido ao processo de avaliação de riscos. O CEO reconheceu que tais verificações eram necessárias, mas conversou com o diretor de procurement para certificar-se de que haveria alguém totalmente dedicado ao novo negócio. Como resultado, o onboarding de fornecedores do novo negócio passou de três meses e meio para três semanas e meia.
Para garantir que esse modelo operacional seja prático e eficaz, o CEO precisa instaurar um processo claro de governança. Um preceito inicial é que quanto mais separação houver entre o novo negócio e o negócio original, melhor (exceto no que diz respeito à direção estratégica). Com esse embasamento, o CEO deve se esforçar para criar um modelo de governança que incorpore algum tipo de supervisão focada a fim de viabilizar o novo negócio, outorgando autoridade explícita para a nova entidade tomar decisões (geralmente por meio de um venture board [conselho do empreendimento]) e instituindo um mecanismo de financiamento pelo qual verbas são liberadas conforme KPIs específicos vão sendo cumpridos.
3. Identifique um líder que possa um dia ser o CEO e crie um bom mix de talentos
O sucesso de um novo negócio depende de se encontrar o equilíbrio certo entre a independência de uma start-up e as vantagens relevantes do negócio existente. É encontrando esse equilíbrio que o CEO poderá ter o máximo impacto, a começar pela contratação do líder do novo negócio. O CEO precisa encontrar alguém que possua não só capacidades empreendedoras e operacionais para gerir o negócio, mas também habilidades interpessoais de influência e colaboração para que possa atuar harmonicamente com as pessoas do negócio existente – seja trabalhando com os vários líderes funcionais para acessar talentos e ativos, seja alinhando estratégias com o Conselho.
Foi por compreender a importância de se trabalhar bem com o negócio existente que Øyvind Eriksen, presidente e CEO da empresa de energia norueguesa Aker ASA, exigiu que o CEO de um novo negócio da empresa dedicasse longo tempo para conhecer a fundo as atividades e capacidades da matriz tão logo foi contratado.8
Para encontrar alguém capaz de trabalhar com o negócio original, é preciso buscar um líder de estatura. Um gestor nos disse que o líder de um novo negócio deve ser alguém que um dia possa ser o CEO de toda a empresa. A importância de colocar a liderança do novo negócio em posição de trabalhar de igual para igual com a liderança do negócio existente levou o CEO de uma empresa de serviços ao consumidor a designar dois profissionais da organização, ambos de reconhecida competência, para liderar um novo negócio. Esse gesto deixou clara para os funcionários a relevância do novo negócio e assegurou que seus líderes teriam credibilidade para trabalhar com os executivos do negócio original.
Garantir um relacionamento produtivo entre o novo negócio e o negócio existente implica assegurar que o novo negócio tenha uma combinação adequada de novos funcionários e funcionários antigos de desempenho comprovado. Encontrar o mix ideal de talentos internos e externos não é uma ciência exata e requer que o CEO seja persistente o bastante para discernir onde estão os criadores de obstáculos e como “passar por cima” deles quando necessário – convencendo os líderes funcionais a dedicar seus melhores funcionários ao novo negócio, por exemplo, ou trabalhando com o diretor de recursos humanos (CHRO) para implementar políticas agilizadas de rodízio e transferência de pessoal.
Ao traçarem um caminho para se chegar ao mix ideal de talentos internos e externos, os CEOs devem considerar a possibilidade de uma aquisição, desde que seja bem calculada e seu foco seja o redimensionamento apropriado do negócio. Nossa pesquisa mostrou que novos negócios que efetuaram duas aquisições no início do processo de redimensionamento têm 25% mais chance de superar significativamente as expectativas do que aqueles que não fizeram nenhuma ou que fizeram três ou mais aquisições.9
4. Dê aos líderes do negócio existente uma participação no sucesso do novo negócio
Inevitavelmente, haverá conflitos entre o novo negócio e o existente. Por exemplo, as necessidades do novo negócio podem parecer pequenas para uma função de TI que tenha grandes projetos em andamento, de modo que o CIO talvez seja pouco responsivo a elas. Ou, à medida que o novo negócio cresce e passa a operar de maneira própria, o negócio original pode começar a vê-lo como uma ameaça, o que gera a dinâmicas contraproducentes e perda de valor.
Nesses casos, o CEO precisa estar disposto a trabalhar pessoalmente com os líderes funcionais ou de negócios correspondentes para resolver a questão. Um CEO nos disse que precisou se reunir com um diretor refratário e explicar detalhadamente como o novo negócio havia ajudado a melhorar a sua demonstração de lucros e perdas. Expectativas claras e acordos explícitos (que devem incluir prazos e métricas) são fundamentais para definir referenciais objetivos que o CEO poderá então utilizar para pressionar devidamente os líderes do negócio existente a cumprirem seus compromissos.
Para enfrentar essas tensões organizacionais, o CEO deve estruturar um modelo de governança que incorpore incentivos diretos para os líderes do negócio existente. Uma maneira de fazer isso é identificar na hierarquia da empresa quem são os responsáveis por cada ativo ou capacidade (por exemplo, dados ou propriedade intelectual) e oferecer-lhes um papel de liderança no novo negócio. Esse papel pode ser participar do venture board que orientará o novo negócio ou fazer parte de uma força-tarefa que ajudará o novo negócio a atender a uma necessidade específica. Com isso, esses executivos assumiriam responsabilidade pelo sucesso do novo negócio. Vincular remuneração e bônus a KPIs específicos do novo negócio também provou ser eficaz em muitos contextos.
Ao proporcionarem esses incentivos, os CEOs precisam se lembrar de estabelecer um equilíbrio adequado entre envolver líderes do negócio original e proteger a autonomia do novo negócio. Isso significa, por exemplo, restringir a capacidade de os líderes do negócio original frustrarem o progresso do novo negócio, seja restringindo seu poder de aprovação ou impedindo que as estruturas de prestação de contas existentes criem raízes.
5. Atente para a comunicação. E, quando sentir que já fez o suficiente, faça mais
Os CEOs entendem a importância da comunicação – grande parte de seu sucesso baseia-se em quão bem eles conseguem se comunicar. Contudo, quando se trata de dar apoio a um novo negócio, eles geralmente subestimam o quanto a comunicação precisa ser sistemática e persistente, e o quanto ela afetará os resultados do novo negócio. Ao comunicar, por exemplo, que o novo negócio faz parte de uma grande mudança que tornará a empresa mais digital, mais informatizada ou mais tecnológica, o CEO estará confirmando seu apoio a novos indicadores de desempenho financeiro para sua empresa de capital aberto.
A arte por trás da comunicação bem-sucedida é ser sistemático e intencional na adaptação da mensagem ao seu público. Explicar como o novo negócio contribuirá para impulsionar o crescimento e desenvolver as habilidades da empresa, por exemplo, talvez ajude a convencer aqueles que permanecem refratários ao novo empreendimento. Quando estiver frente a um Conselho cético, o CEO deve destacar as oportunidades de crescimento e as possíveis disrupções tomando por base a dinâmica do mercado.
Patrick Hylton adotou uma abordagem de “fontes de significado” na sua comunicação quando buscou granjear apoio para o Lynk. Ele identificou sistematicamente os stakeholders e determinou como alinhar as atividades do novo negócio com os interesses deles. “No caso dos reguladores, por exemplo, expliquei que o nosso novo negócio de pagamentos digitais seria mais inclusivo, pois alcançaria mais pessoas de diferentes origens socioeconômicas, ajudaria a reduzir o risco de transmissão durante pandemias e aumentaria a produtividade dos trabalhadores. Mostrei por meio dessa nossa análise que os clientes realmente queriam serviços financeiros digitais”, explicou.10
Conquistar apoio é apenas o começo. A comunicação é um esforço contínuo. Um bom exemplo é o modo como o CEO e o CFO da Moody’s anunciaram ao The Street que estariam investindo na criação de vários novos negócios para ajudar os clientes que precisavam integrar a avaliação de riscos e a tomada de decisões – por exemplo, na terceirização da gestão de riscos. Eles deixaram claro que os novos negócios eram parte da estratégia geral da empresa e comunicaram reiteradamente como os investimentos beneficiariam o negócio principal – por exemplo, compartilhando com o público que “o objetivo aqui … é apresentar ofertas mais abrangentes, aprofundar a penetração de mercado e agregar novos clientes que nos permitam crescer mais depressa.” Cada trimestre, durante as teleconferências sobre resultados, o CEO falava sobre os novos negócios, focava o progresso alcançado e enfatizava os elos com a estratégia geral da empresa.
O ritmo insistente da comunicação serve para reforçar convicções e metas. Em nossa experiência, as características da comunicação eficaz incluem reafirmar a visão e a razão de ser da empresa, destacar validações externas significativas, definir expectativas ambiciosas, porém realistas, mostrar autenticidade (mesmo quando houver contratempos), celebrar o progresso, entender os fatos mais relevantes (como o progresso alcançado em relação aos KPIs) e manter a mensagem coesa. Este último ponto merece ser enfatizado. Um bom programa de comunicação deve ser pensado como uma narrativa do CEO, na qual a construção de negócios tem papel contínuo e proeminente na estratégia geral.
Quando os CEOs colocam em ação sua estratégia de comunicação, eles precisam se proteger da estagnação comunicativa que, inevitavelmente, se estabelece com o tempo. Portanto, sua mensagem tem que evoluir à medida que o novo negócio muda – afinal, trata-se de uma história, não de um conjunto estático de tópicos de discussão. Criar entusiasmo é importante no início, sem dúvida, mas a mensagem precisa mudar e focar o progresso operacional à medida que o novo negócio amadurece.
Construir um novo negócio não pode ser um projeto paralelo nem um experimento aleatório se a empresa quiser aumentar suas receitas, fortalecer sua posição no mercado e manter-se à frente das disrupções do setor. A construção de novos negócios deve se tornar uma capacidade institucional e gerencial indispensável para impulsionar o crescimento e aumentar a resiliência. Isso só acontecerá, no entanto, quando os CEOs focarem as tarefas nas quais têm autoridade e influência singulares, e quando dedicarem seu tempo, energia e coragem a elas.