Finanças integradas: quem vai liderar a próxima revolução em pagamentos?

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Micro e pequenas empresas que estão começando hoje talvez jamais interajam com um banco convencional. Ao fazerem login em sua plataforma de comércio eletrônico ou contabilidade, poderão abrir uma conta corrente, solicitar um cartão de débito e atender à maioria de suas necessidades de financiamento. Os operadores dessas plataformas geralmente não são bancos, mas sim empresas de software em parceria com bancos e provedores de tecnologia que integram produtos financeiros em uma única experiência conveniente e fácil de usar para o cliente. É essa nova forma de parceria entre bancos, provedores de tecnologia e distribuidores de produtos financeiros firmada em plataformas não financeiras que está por trás do que vem sendo chamado de revolução das finanças integradas – embedded finance revolution. E os pagamentos, situados na interseção entre comércio, bancos e serviços empresariais, se tornaram um dos primeiros casos de uso de finanças integradas: um grande número de empresas que aspiram a oferecer finanças integradas são originárias do setor de pagamentos.

O valor para os clientes dessa experiência integrada ajuda a explicar por que o faturamento das empresas de finanças incorporadas [como embedded finance também é chamada] atingiu US$ 20 bilhões somente nos Estados Unidos em 2021, segundo o modelo de dimensionamento de mercado da McKinsey.1 E, de acordo com nossas estimativas, o mercado poderá dobrar de tamanho nos próximos três a cinco anos. Apesar da escala dessa oportunidade, muitos bancos, provedores de pagamentos, fintechs, investidores, empresas de software e distribuidores em potencial não sabem ao certo o que finanças integradas envolvem, como podem participar desse mercado e o que é necessário para vencer – questões que abordamos neste artigo.

O que são finanças integradas?

Em termos bem simples, “finanças integradas” significa a inclusão de um produto financeiro em uma experiência, jornada ou plataforma não financeira do cliente. Em si, não é novidade. Há décadas empresas não bancárias vêm oferecendo serviços financeiros por meio de cartões de crédito de marca própria em redes varejistas, supermercados e companhias aéreas. Outras formas comuns de finanças integradas são as vendas a prazo em lojas de eletrodomésticos e o crédito automóvel nas concessionárias, embora tais arranjos ainda funcionem como um canal para os bancos (que estão por trás dessas operações) alcançarem o cliente final.

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O que torna a próxima geração de finanças integradas tão poderosa é a incorporação de produtos financeiros a interfaces digitais com as quais os usuários interagem diariamente. As possibilidades são inúmeras: aplicativos de fidelização de clientes, carteiras digitais, softwares de contabilidade e plataformas de carrinho de compras, entre outras. Para os consumidores e empresas que utilizam essas interfaces, a aquisição de serviços financeiros torna-se uma extensão natural da experiência não financeira – semelhante a fazer compras online, organizar turnos de trabalho ou gerenciar estoque. É esta forma mais incorporada de finanças integradas que cresceu tão significativamente nos EUA nos últimos anos.

A evolução de finanças integradas foi possibilitada por mudanças fundamentais no comércio, no comportamento dos estabelecimentos comerciais e do consumidor, e na tecnologia. A digitalização do comércio e da gestão de negócios expandiu enormemente as oportunidades de incorporar finanças às experiências não financeiras dos clientes. Cerca de 33% dos gastos com cartões em todo o mundo – 50% nos EUA – são hoje feitos online,2 e grande parte das pequenas e médias empresas dos Estados Unidos hoje depende de soluções de software para gerenciar seus negócios.3 Além disso, à medida que nativos digitais vão atingindo a maioridade, eles expandem o pool de consumidores e empresas dispostos a receber todos os seus serviços financeiros por meio de plataformas digitais. Por fim, a inovação do open banking, favorecida por regulamentação na União Europeia e adotada livremente pelo mercado nos EUA, ajudou a deslanchar uma demanda latente ao permitir que as fintechs acessassem os dados bancários dos consumidores e até realizassem transações em seu nome.

Quem oferece finanças integradas e quais os produtos oferecidos?

Finanças integradas podem ser oferecidas em qualquer ambiente em que uma massa crítica de clientes finais (consumidores ou empresas) tenha interações digitais frequentes (muitas vezes diárias) com o operador da plataforma digital – que chamaremos aqui de “distribuidor de finanças integradas”. Para uma empresa não bancária atuando como “distribuidor”, as finanças integradas oferecem uma maneira de aprimorar a experiência do cliente e criar uma nova fonte de receitas sem incorrer nos custos de operar um banco. Entre os tipos de empresas mais bem posicionadas para oferecer finanças integradas estão varejistas, empresas de software de negócios, marketplaces online, plataformas, telecoms e fabricantes de equipamentos originais (OEMs). Todas essas categorias registraram altos níveis de atividade e inovação em finanças integradas nos últimos um ou dois anos.

Entre os distribuidores de finanças integradas e seus clientes finais, a demanda já está amadurecendo para uma variedade de produtos de depósito, pagamento, emissão e empréstimo (Quadro 1). Além desses produtos financeiros tradicionais, novos casos de uso estão surgindo. Por exemplo, os distribuidores de finanças integradas estão oferecendo cartões pré-pagos a funcionários como parte de programas de acesso ao salário ganho [EWA, earned-wage access] e dando a comerciantes a opção de utilizarem suas contas de depósito para liquidação de pagamentos instantâneos. Alguns estão fornecendo cartões de débito com recarga just-in-time para os trabalhadores informais utilizarem quando efetuarem compras para membros das plataformas de serviços de entrega.

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Embedded finance: Who will lead the next payments revolution? Portuguese version

É provável que o portfólio de produtos de finanças integradas se expanda ainda mais à medida que os processos de onboarding e atendimento a clientes forem sendo gradualmente digitalizados e os serviços e análises de riscos em tempo real se tornarem mais sofisticados. O risco, contudo, provavelmente continuará sendo uma restrição ao crescimento, pois produtos que exigem avaliação caso a caso, pontos de contato presenciais ou períodos de espera compulsórios (como financiamento imobiliário comercial) são menos suscetíveis à digitalização de ponta a ponta. Apesar dessas limitações, estimamos que os produtos aptos a serem ofertados por meio de finanças integradas possam vir a representar até 50% do pool de receitas dos bancos.4

Quem torna possível oferecer finanças integradas?

Os distribuidores de finanças integradas se valem de dois grupos de provedores para prepararem suas ofertas e oferecerem acesso a elas (Quadro 2):

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Embedded finance: Who will lead the next payments revolution? Portuguese version

  • Provedores de tecnologia (fintechs). Fornecem a plataforma por meio da qual os distribuidores podem acessar, personalizar e oferecer produtos de finanças integradas. Alguns, como a Marqeta, oferecem soluções pontuais para categorias específicas de produtos financeiros, como emissão de cartões. Outros, como Unit, Bond e Alviere, operam plataformas que oferecem aos distribuidores uma variedade de produtos financeiros, como depósitos, movimentação de dinheiro e empréstimos.
  • Provedores de balanço patrimonial (instituições financeiras licenciadas ou credenciadas). São responsáveis por preparar os produtos de finanças integradas, fornecer serviços de prevenção de riscos e de compliance, e proporcionar acesso a fundos para produtos que envolvam empréstimo e depósito. Esses provedores, ao disponibilizarem seu balanço patrimonial, às vezes formam parceria direta com provedores de tecnologia a fim de incorporarem uma oferta de finanças integradas para os distribuidores. Por exemplo, a Stripe fez parceria com o Goldman Sachs e outros bancos para oferecer finanças integradas a plataformas e a marketplaces de terceiros.

Alguns bancos e fintechs, entre eles o Cross River Bank e o Banking Circle, desempenham ambas funções. Tendo construído uma camada de tecnologia sobre seu próprio balanço patrimonial, eles têm condições de fornecer finanças integradas aos distribuidores – varejistas, fornecedores de software de negócios, marketplaces e OEMs – sem necessidade de parcerias adicionais.

Quem está capturando o valor?

Nem todos os players se beneficiaram igualmente da ascensão das finanças integradas. Como ocorre no setor bancário de modo geral, a maior parte das receitas vai principalmente a quem correu riscos e aos distribuidores que dominam plenamente o relacionamento com os clientes. Por exemplo, de acordo com a pesquisa da McKinsey, a maior parte das receitas provenientes de produtos de finanças integradas envolvendo empréstimos (55% de $14 bilhões nos Estados Unidos em 2021) ficou com os provedores de balanço patrimonial – as empresas assumem o risco da inadimplência de clientes. No entanto, com relação a produtos envolvendo pagamentos e depósitos, os mais beneficiados foram os distribuidores que dominam o relacionamento com o cliente final. No caso de empréstimos, por exemplo, eles ganharam $4 bilhões dos $6 bilhões restantes do pool, equivalente a 30% das receitas totais.

Essa dinâmica das receitas explica duas tendências de mercado que observamos. Primeiro, muitos distribuidores de finanças integradas começaram oferecendo produtos de depósito e de pagamento antes de ampliarem a gama de ofertas para incluir produtos de empréstimo, como cartões de crédito e financiamento comercial. Os produtos de depósito e de pagamento são atraentes para os distribuidores não apenas porque constituem pools substanciais de receita e contribuem para melhorar o stickiness [relação entre o número de usuários ativos por mês e por dia], mas também porque são uma ferramenta poderosa para construir relacionamentos com clientes e capturar seus dados, que serão utilizados para definir a inclusão, ou não, de produtos futuros de empréstimos com margens de lucro mais altas.

Segundo, muitos provedores de tecnologia têm buscado capturar uma parcela maior das receitas de finanças integradas expandindo-se para toda a cadeia de valor. Em empréstimos, por exemplo, pretendem aumentar sua parcela das receitas encontrando maneiras de compartilhar os riscos – como oferecer acordos de recompra para empréstimos originados por provedores de balanço patrimonial.

O que é preciso para vencer em finanças integradas?

O sucesso de um provedor de finanças integradas depende de uma diferenciação clara na amplitude ou profundidade de seus produtos, ou da oferta de serviços auxiliares de gerenciamento de programas.

Opções de diferenciação

Vemos três fontes principais de diferenciação para distribuidores de finanças integradas, provedores de balanço patrimonial e provedores de tecnologia:

  1. Amplitude de produtos. Muitos distribuidores estão adotando a abordagem de “aterrissar e expandir” [também conhecida como “semear e crescer”] para finanças integradas. Começam oferecendo aceitação de pagamentos ou depósitos e, em seguida, ampliam seu portfólio com produtos de empréstimo ou ofertas mais complexas que atendam a necessidades financeiras mais sofisticadas dos clientes. Alguns distribuidores preferem moldar sua estratégia em torno do conceito de “balcão único” com um só parceiro confiável de tecnologia, oferecendo ampla gama de produtos; outros optam por trabalhar com vários provedores de tecnologia para evitar dependerem demais de um só parceiro.
  2. Profundidade dos produtos. Alguns provedores de tecnologia e de balanço patrimonial estão adquirindo profunda expertise em categorias específicas de finanças integradas (como emissão) para aumentarem desproporcionalmente seu market share nesses nichos. Eles desenvolvem casos de uso inovadores – como recarga just-in-time para cartões ou autorizações de pagamento criptografadas – a partir dos quais criam novos produtos financeiros para clientes finais. Com o tempo, no entanto, a demanda por soluções financeiras integradas e as sinergias passíveis de serem capturadas em todas as categorias de produtos provavelmente levarão esses provedores a proteger seus flancos aumentando também a amplitude de produtos.
  3. Suporte ao gerenciamento de programas. Compreensivelmente, muitos distribuidores recém-chegados às finanças integradas se preocupam com as maneiras de construir, vender e prestar atendimento a produtos financeiros para clientes finais. Alguns talvez vejam os riscos regulatórios e reputacionais associados a produtos financeiros, especialmente empréstimos, como um obstáculo intransponível. Para ajudá-los a superar esses riscos, muitos provedores de tecnologia de finanças integradas também oferecem expertise em vendas, atendimento e gestão de riscos, ou orquestram com outros parceiros que os forneçam. A capacidade de fornecer aos distribuidores esse tipo de gerenciamento de programas provavelmente será uma fonte importante de diferenciação no longo prazo.

Principais decisões de um novo player no mercado de finanças integradas

Embora algumas empresas já estejam assumindo a liderança, o mercado de finanças integradas ainda tem amplo espaço disponível para novos participantes, pois estimamos que dobrará de tamanho nos próximos três a cinco anos. No longo prazo, os vencedores provavelmente serão aqueles que já têm hoje um cacife mínimo em tecnologia, expertise e relacionamentos necessário para alcançar uma futura posição de liderança. Firmas de serviços financeiros e fintechs que buscam deixar sua marca no negócio de finanças integradas fariam bem em se comprometer a implementar quatro iniciativas: escolher uma estratégia, adquirir experiência de desenvolvedor, capacitar-se para dar suporte aos distribuidores e desenvolver serviços de suporte e prevenção de riscos.

Escolha onde competir. Para a maioria dos bancos com sistemas proprietários de distribuição, as finanças integradas representam um risco significativo de canibalização. Por outro lado, bancos com presença limitada ou relacionamentos localizados (como bancos comunitários ou regionais) podem ver esse mercado como uma forma atrativa de expandir a base de receitas. Alguns talvez se sintam confortáveis aumentando de maneira relativamente passiva o volume de depósitos e receitas, ao menos no início, mas muitos procurarão oportunidades para se diferenciar e aumentar as receitas com produtos e suporte mais avançados. No momento, os provedores de tecnologia focados em pagamentos estão liderando o mercado, valendo-se de sua capacidade de movimentar dinheiro para atrair distribuidores e, em seguida, expandir para produtos que sempre haviam sido redutos dos bancos, como empréstimos.

Crie e promova uma experiência de desenvolvedor moderno. Muitos bancos e empresas estabelecidas de infraestrutura de serviços financeiros ainda não estão equipados para externalizar seus processos e fluxos de trabalho de modo a permitir que os distribuidores incorporem ordenadamente produtos de finanças integradas em suas jornadas ou plataformas de distribuição. Distribuidores que queiram expandir rapidamente precisarão criar uma experiência de desenvolvedor moderno que inclua a tecnologia necessária para torná-la viável. Para tanto, devem fornecer aos desenvolvedores terceirizados acesso de autoatendimento e APIs bem documentadas.

Adapte-se a movimentos de vendas B2B2C e B2B2B. Embora algumas instituições financeiras operem com parceiros de canal, muitas estão acostumadas a atender diretamente os clientes finais. Aquelas que utilizam canais diretos precisarão construir um novo conjunto de capacidades para oferecerem aos distribuidores suporte na venda de produtos de finanças integradas para consumidores ou clientes empresariais.

Desenvolva serviços de suporte e de prevenção de riscos. Varejistas, fabricantes, telecoms e outros distribuidores de finanças integradas talvez não tenham as capacidades necessárias para construir, vender e prestar atendimento a produtos financeiros de maneira eficaz, com controle de riscos e em conformidade com as regulamentações, nem terão tempo ou ânimo para construir tais capacidades. Buscarão provedores de tecnologia e de balanço patrimonial para obter assessoria sobre a melhor forma de implantar finanças integradas e orquestrar a expertise e as ferramentas necessárias para oferecer esses produtos de modo legítimo. Além de prestarem assessoria, os provedores de tecnologia e de balanço patrimonial precisarão construir uma estrutura de gestão de riscos que lhes dê confiança de que os distribuidores com quem trabalham estão agindo sem apetite exagerado por riscos e em conformidade com as regulamentações.


Algumas instituições financeiras que oferecem produtos de finanças integradas já se mostram vitoriosas. No entanto, bancos, fintechs e firmas de pagamentos com ampla experiência tecnológica que estejam dispostos a investir e formar parcerias ainda têm tempo para conquistar sua parte nesse mercado em rápido crescimento.

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