A América Latina já foi considerada uma retardatária no comércio eletrônico, com muitos consumidores relutantes em fazer compras online. Não mais. Hoje o e-commerce da região está entre os que mais cresce no mundo.
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A startup Melonn (fundada na Colômbia em 2020 por seis amigos) almeja atender o número crescente de empresas de comércio eletrônico B2C de pequeno e médio porte da América Latina. Mas enfrenta um poderoso desafio: o déficit de confiança. Muitos consumidores latino-americanos não confiam que os pacotes chegarão no prazo – ou que sequer que chegarão. Do mesmo modo, alguns vendedores locais temem não receber pagamento, que muitas vezes só são realizados após a entrega. A Melonn espera pôr fim a essas preocupações, assegurando transparência para ambos os lados durante todo o processo.
“Melonn significa amigo no idioma élfico, da saga O senhor dos anéis”, explica o cofundador Andrés Felipe Archila. “É assim que nos vemos: como um amigo – e o aliado mais confiável das empresas de comércio eletrônico na América Latina.” A empresa afirma que levantou US$ 25 milhões em financiamento, tem cerca de 400 funcionários em tempo integral e processa em torno de 150 mil pedidos mensais.
Nesta edição de Logistics Disruptors, Archila conversou com Maite Pena-Alcaraz, da McKinsey, sobre a utilidade do software integrado, a importância de acertar nos pequenos detalhes e o imperativo de promover a confiança.
Segue uma versão editada dessa conversa.
McKinsey: Qual é o modelo de negócio da Melonn?
Andrés Felipe Archila: Somos um parceiro 3PL [third-party logistics], isto é, um parceiro de logística terceirizado, no setor de comércio eletrônico B2C. É o que somos. Mas colocar isso em prática na América Latina é muito, muito difícil. E é o que nos torna únicos.
Não existe na América Latina o mesmo nível de confiança no e-commerce que se vê nos Estados Unidos ou na Europa. Aqui, quando compramos algo por meio de um canal eletrônico, a primeira coisa que nos perguntamos é: “Será que vai chegar no prazo?” ou mesmo “Será que vai chegar?” Além disso, em muitas transações o pagamento é feito na entrega. Sem um mínimo de confiança de que as encomendas chegarão e de que os pagamentos serão feitos, o sistema falha. Acho que a confiança é a principal barreira ao comércio eletrônico na América Latina.
Em termos de soluções, oferecemos uma plataforma tecnológica que é essencialmente um sistema “tudo-em-um” de TMS, WMS e OMS [de gestão de transporte, armazenamento e pedidos]. Mantemos o estoque de nossos vendedores em nossos armazéns. Assim, quando um cliente compra online, somos nós que preenchemos o pedido – coletamos, embalamos e enviamos o produto. E garantimos que ele chegará. Tornamos o processo inteiro visível para todas as partes envolvidas, com links e alertas de rastreamento.
McKinsey: Como vocês tentam se diferenciar?
Andrés Felipe Archila: Nosso objetivo é ajudar nossos vendedores a crescer. Mas eles não crescerão se a experiência de entrega for péssima. Portanto, nossa grande proposta de valor é atender às expectativas de seus clientes. Parece simples, mas é muito difícil na América Latina. Nossa proposta é reduzir os níveis de ansiedade dos clientes por meio da transparência, o que aumenta a confiança em todo o ecossistema. Quando você tem clientes que confiam, você tem clientes recorrentes, e isso cria um ciclo que reforça a si mesmo.
Para nossos vendedores, também reduzimos as barreiras de acesso. Oferecemos assessoria sobre como investir em anúncios e como desenhar a experiência de checkout. Aumentamos a sua capacidade e tiramos os problemas de suas costas. Se você for uma marca que atua com vestuário na indústria da moda, por exemplo, e tiver que gastar seu tempo respondendo a reclamações de clientes e corrigindo endereços, não estará focado no que realmente faz seu negócio crescer.
Também sou obcecado por pagamentos na América Latina. Porque nem todos os consumidores têm cartão de crédito ou de débito. Mesmo que tenham, se não houver confiança, eles não colocarão suas informações bancárias online. Trabalhar com um parceiro como a Melonn cria um intermediário no qual todos confiam.
McKinsey: Quais são os maiores desafios que vocês enfrentam?
Andrés Felipe Archila: Alguns obstáculos são muito claros. A pontualidade do setor como um todo na América Latina não é boa. A qualidade do serviço de entrega deixa a desejar. Mas mesmo que essas coisas sejam resolvidas, a logística não é a resposta para todos os problemas. Há um outro conjunto de problemas que também impede o crescimento.
Tenho encontrado sites em que você precisa criar uma conta para comprar algo – só que, muitas vezes, se você não oferecer uma experiência de pagamento com um só clique, a taxa de conversão em venda cairá drasticamente. Ou se as imagens ou informações do site forem de baixa qualidade, a taxa de conversão de clientes poderá cair a níveis muito baixos e todo o dinheiro que você gastou em marketing será desperdiçado.
Quando estávamos integrando nossos primeiros 50 parceiros, eu costumava navegar nos sites dos vendedores e sempre tinha que insistir: “Por favor, ofereçam frete grátis para compras acima de determinado valor. Caso contrário, se não oferecerem essa facilidade, vocês perderão muitas vendas grandes.” Isso não tem muito a ver com logística. Mas são coisas assim que vemos repetidamente e nas quais precisamos nos concentrar. Esses pequenos detalhes vão se somando.
Para nós, o desafio também é, em parte, decidir quanto e em que direção queremos avançar. Queremos entrar em mercados mais sofisticados? Se sim, quão sofisticados? Queremos entrar em e-commerce B2B? Se sim, em que medida? Em marketing de anúncios? O desafio é decidir o que realmente é necessário para fazer o e-commerce deslanchar na América Latina.
McKinsey: Vocês decidiram desenvolver um sistema próprio de gestão de transporte, armazenamento e pedidos. Por que optaram por isso em vez de utilizarem soluções prontas já existentes?
Andrés Felipe Archila: Em alguns casos, faltavam algumas capacidades operacionais importantes. Por exemplo, lembro-me de conversar com transportadoras da Colômbia e do México, e perguntar-lhes: “Vocês oferecem entrega no mesmo dia? Qual é o horário limite desse serviço?” E a resposta deles era 8h da manhã. Isso não funciona, pois as pessoas compram às 9h, 10h, meio-dia. Em parte, foi isso que nos fez decidir que precisávamos desenvolver nossa própria solução.
Mas outra coisa que percebemos desde o início é que, para o e-commerce funcionar, é preciso haver uma excelente integração de sistemas. Se o sistema de gestão de armazéns for isolado dos canais de vendas, poderá haver falhas de comunicação sobre o estoque e o pedido não será preenchido. Se o sistema não estiver conectado com as transportadoras, perderemos tempo precioso fazendo entregas e não poderemos entregar no mesmo dia. Por isso tudo decidimos criar nossa própria tecnologia integrada.
McKinsey: Vimos muitas mudanças no setor de logística desde o início da pandemia. Quais delas você acha que vieram para ficar?
Andrés Felipe Archila: Antes da pandemia, quem comprava online na América Latina era quase como se fosse um alienígena. Hoje, acho impossível lançar uma marca sem um canal de vendas online – seria uma loucura ignorar isso. O e-commerce na América Latina veio para ficar.
As pessoas se acostumaram a comprar e vender online. Ao mesmo tempo, suas expectativas tornaram-se mais elevadas e complexas. E não envolvem apenas rapidez e qualidade de entrega, mas também transparência e a oferta de uma ampla gama de opções. Para algumas pessoas, por exemplo, a pegada de carbono é mais importante do que a velocidade da entrega. Para a indústria da moda, facilitar devoluções é fundamental.
O comércio eletrônico chegou à América Latina e, com ele, todas as expectativas de seus usuários. Mas o setor ainda não atingiu o mesmo nível de maturidade. De modo que existe uma lacuna. E eliminá-la é o que estamos nos esforçando para fazer.
McKinsey: Se você tivesse uma varinha mágica, o que mudaria ou criaria para melhorar a logística?
Andrés Felipe Archila: Venho de um país onde as pessoas estão sempre preocupadas com a segurança e com as encomendas não chegarem à sua porta. Acho que o cenário seria totalmente diferente se
confiássemos um no outro. Na América Latina, poder simplesmente deixar pacotes na porta da casa do cliente já seria fantástico.
Se pudéssemos confiar que tudo fluiria naturalmente, que as encomendas chegariam no prazo, que não haveria fraude ou roubo – isso seria um divisor de águas. Quando você não confia, você deixa de comprar. Tentamos fortalecer a confiança de todos os lados a partir do momento em que o cliente faz o pedido, seja deixando mais claro quando uma remessa chegará, seja lembrando os clientes de estarem presentes para a entrega e de terem o pagamento em mãos.
Muitos pedidos na América Latina envolvem pagamento contra entrega, de modo que pensamos em maneiras de aprimorar isso. Uma possível solução seria congelar fundos em uma conta e só liberá-los para o vendedor após a confirmação da entrega. Isso seria interessante, pois como comprador você ficaria tranquilo, já que ninguém receberá seu dinheiro se a encomenda não chegar; e, como vendedor, você saberia que o dinheiro está em um fundo fiduciário e será transferido por uma terceira parte tão logo a remessa seja entregue.
Soluções como essas podem ajudar. Mas não serão suficientes se não houver também uma mudança de mentalidade.