Procurement indireto: Internalizar? Terceirizar? Ou ambos?

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Para muitas organizações, o procurement indireto – aquisições de serviços e suprimentos necessários para a operação do negócio – é uma fonte de enorme valor e economias não aproveitados.  Embora as despesas indiretas possam representar 10%, 15% ou até 18% da receita em algumas indústrias, elas geralmente não são gerenciadas por uma única função ou responsável do negócio, e muitas vezes são ignoradas e consideradas despesas “não prioritárias”.

Como muitas empresas carecem das capacidades necessárias para abordar todas as oportunidades potenciais e capturar todo o valor da otimização das despesas indiretas, a terceirização pode surgir como uma opção atrativa. De fato, os provedores de serviços de terceirização podem dispor de capacidades e ativos importantes, tais como expertise funcional e de domínio, conhecimento do mercado, disciplina nos processos e tecnologia de sourcing atualizada.

Mas a terceirização também implica riscos consideráveis. Ao longo do tempo, ela pode diminuir a eficácia da função de procurement como um todo, sem produzir o impacto sustentado que os líderes provavelmente esperavam. Em vez disso, as empresas podem descobrir que o valor capturado no primeiro ou no segundo ano de terceirização diminui, antes de estagnar-se em um nível relativamente baixo. Além disso, a falta de relacionamentos sólidos na organização do cliente pode prejudicar a colaboração, enquanto o foco transacional de muitos dos relacionamentos de terceirização tende a inibir uma abordagem mais estratégica para a otimização.

Algumas poucas empresas, entretanto, identificaram que a forma mais eficaz de otimizar o procurement indireto é não envolver a mera terceirização, mas a transformação da função de procurement em um braço estratégico da organização, capaz de criar valor.  Essa transformação requer a adoção de rigorosas práticas de gestão, mudando mentalidades e comportamentos profundamente arraigados e criando novas capacidades de última geração em áreas como o procurement digital. Se implementada corretamente, a transformação pode gerar uma redução de custo inicial de cerca de 15% (Quadro 1), que se traduz em uma melhoria de aproximadamente 1,5% no resultado.

Quadro 1

As empresas podem capturar a maior parte desses ganhos em 12 a 18 meses, além de continuar capturando reduções de custo anuais de cerca de 4% após a transformação. Por outro lado, nosso estudo indica que terceirizar completamente o procurement indireto permite capturar somente um quarto da oportunidade de economia total – e pode impedir que as empresas desenvolvam capacidades internas que podem tornar-se vantagens duradouras e fonte de resiliência.

Benefícios esperados da terceirização do procurement indireto

Para obter todo o valor do sourcing indireto é necessária uma abordagem integrada e muito bem analisada (leia a coluna “Criação, preservação e viabilização do valor em procurement indireto”).

Algumas empresas percebem que não têm talentos, expertise, sistemas ou infraestrutura para buscar uma abordagem, e então precisam fazer uma escolha crítica: desenvolver as capacidades internamente ou terceirizar uma parte ou toda a função de procurement indireto. Terceirizar pode parecer atrativo, já que os benefícios que os provedores de procurement indireto e de terceirização de processos de negócio (IBPO, da sigla em inglês) oferecem incluem:

Expertise de categoria. Provedores de IPBPO têm acesso a especialistas com domínio substancial e expertise funcional.

Inteligência de mercado. Os provedores podem ser capazes de gerar insight superior sobre dinâmica de mercado, fornecedores, custos e precificação, juntamente com benchmarks de precificação, pois compartilham informações entre os diferentes clientes. Em alguns casos, esses insights podem ser usados para permitir precificação melhor que a do mercado e aproveitar oportunidades únicas.

Disciplina de processo. Processos de source-to-contract (S2C) e procure-to-pay (P2P) testados e totalmente integrados, juntamente com a disciplina de preservar economias (como limitar gastos não programados, garantir compliance de contratos e implantar catálogos), ajuda as organizações a aumentar a produtividade de procurement.

As mais avançadas aplicações e tecnologias de sourcing. Muitos provedores têm ferramentas de sourcing proprietárias e padrão na indústria que uma empresa cliente poderia implementar de forma independente. Embora essa capacidade tenha se mostrado menos diferencial pelo fato de aplicações avançadas de sourcing se tornarem mais acessíveis, elas costumam ser vistas como um capacitador para captura de valor para categorias terceirizadas.

Mitigação de riscos. Em certas indústrias reguladas, ter um terceiro ou outro intermediário envolvido em sourcing ajuda a mitigar riscos ou repassar os riscos associados a sourcing nessas categorias para uma entidade mais capaz de entendê-los e gerenciá-los.

Vantagens de custos. Provedores terceirizados podem oferecer vantagens de escala e custos que podem ser particularmente importantes em atividades transacionais de sourcing.

A expectativa é que esse valor agregado possa resultar em um tempo menor para criar impacto, maior compliance e visibilidade dos gastos e redução do custo operacional.

Quando a terceirização pode fracassar

As relações com provedores de IPBPO costumam focar em melhorar as práticas básicas de sourcing, capturando ganhos rápidos como descontos sobre volume ao consolidar gastos. É muito mais raro tentar abordagens mais sofisticadas, como análise should cost, negociações altamente estruturadas ou estratégias de RFQ avançadas. Como consequência, terceirizar frequentemente enfrenta uma série de limitações.

Excesso de ênfase em alavancas comerciais. O Quadro 1 mostra que, quando bem feitas, as táticas comerciais, como trocar de fornecedores ou alinhar negociações de preços, normalmente representam apenas 40 a 50% de todo o valor potencial da otimização de procurement indireto. Porém, essas alavancas são as que os externos podem buscar imediatamente.

Barreiras para desenvolver sólidos relacionamentos de negócio. O restante do valor potencial da otimização vem de estratégias como gestão de demanda: influenciar stakeholders para configurações comuns ou avaliar especificações para identificar oportunidades de simplificação e substituição. No entanto, esse tipo de intervenção depende de relacionamentos internos que são difíceis para provedores externos desenvolverem. Além disso, sua ausência pode tornar até mesmo as operações rotineiras da empresa mais complicadas, comprometendo a criação de valor (ver coluna “Perguntas e Respostas: Experiência de uma organização da Fortune 200 com procurement indireto de terceirização”).

Redução de custos e vantagens de capacidade. As economias podem ser deterioradas pelo custo e pelas restrições de disponibilidade de recursos de TI, talentos e gestão que o provedor de IPBPO pode oferecer em qualquer momento. Garantir que os serviços atendam os padrões estabelecidos também pode exigir suporte administrativo adicional (e talvez não previsto no orçamento) por parte do cliente.

Incentivos mal alinhados: Os contratos de IPBPO podem gerar incentivos para atingir ganhos rápidos pelo menor custo possível, com o resultado não desejado de sacrificar o serviço em nome da velocidade. O custo total de propriedade tende a ser menos o foco; da mesma forma, pode haver poucos incentivos para melhoria contínua ou inovação. Como resultado, a maior parte do impacto normalmente é atingida nos primeiros anos de um relacionamento e depois chega-se a uma estagnação.

Terceirização do procurement indireto na prática

Nossa pesquisa confirma que a maioria das empresas que optam por terceirizar o procurement indireto atingem benefícios iniciais moderados: reduções de custo total de 4 a 6% nos primeiros anos, seguidas por reduções adicionais de 1 a 2% ano a ano. Porém, as empresas que retomam o controle do procurement indireto e lançam transformações completas podem atingir economias de mais de 12%, mesmo após a função ter sido terceirizada por alguns anos.

Por exemplo, um fabricante de semicondutores terceirizou sua função de procurement indireto, estabelecendo metas anuais de economia de 3,5%. Após 3 anos, as funções terceirizadas pareciam desconectadas das necessidades de negócio da empresa e era difícil confirmar se havia economias. O fabricante decidiu internalizar novamente a gestão de categorias, identificando um novo provedor de terceirização para atividades transacionais e tail spend, atingindo 10% de economias nas categorias-alvo.

Do mesmo modo, uma empresa de bens de consumo passou 5 anos na transição de todo o procurement indireto para um provedor de terceirização. Três anos após concluir o projeto de terceirização, a empresa internalizou novamente o sourcing indireto, mencionando o baixo alinhamento com a cultura da empresa e as metas não atingidas de economias como as razões para a mudança.

Um varejista internacional que terceirizou todos os gastos indiretos para um terceiro identificou que, no primeiro ano, o acordo capturou economias de cerca de 4%, que caíram para 2 a 3% no segundo ano. Nos anos seguintes, as economias se estagnaram em menos de 1% por ano. Embora o provedor tenha apresentado uma boa execução do contrato, ele teve dificuldade de construir os relacionamentos funcionais próximos necessários para possibilitar as estratégias de gestão de demanda; o provedor também não tinha os canais para questionar os líderes do negócio.  Essas restrições impediram que o provedor desenvolvesse um conhecimento mais aprofundado dos problemas do negócio do cliente e levaram a percepções de que ele não tinha credibilidade em todas as categorias e focava principalmente em atingir os menores preços.

Consequentemente, o varejista passou a designar ao provedor projetos cada vez menores. Com o ROI desaparecendo, o varejista decidiu retomar o controle de seus gastos indiretos e introduziu uma transformação de sourcing analítica e baseada em fatos. Em pouco mais de 1 ano, a gestão interna de sourcing indireto produziu outras reduções de custos de mais de 10%. Cerca de dois terços do benefício vieram de táticas complexas de gestão de demanda, como alinhamento da organização de marketing em todo o negócio para padronizar elementos de campanhas de publicidade e relacionamentos com agências externas.

Quando a terceirização pode ajudar

A decisão de terceirizar o procurement indireto não é uma questão de tudo ou nada. O procurement não estratégico de terceirização pode realmente liberar stakeholders para focarem em melhorias sistemáticas que trazem mais economias. É essencial entender como extrair o maior valor do relacionamento de terceirização. As considerações podem variar dependendo de os tomadores de decisão estarem considerando o procurement de terceirização que cria valor ou o que preserva valor.

Terceirizar as atividades de criação de valor depende de dois fatores principais: a importância estratégica da categoria e a profundidade das capacidades internas de sourcing. “Importância estratégica” indica se a categoria cria vantagem competitiva e requer estreito envolvimento do negócio ou, em contrapartida, se a terceirização pode gerar outros riscos substanciais. Quando se chega a essa determinação, a organização pode avaliar suas capacidades internas de sourcing analisando as habilidades, mentalidades e a maturidade dos processos e ferramentas de procurement indireto que ela tem internamente (Quadro 2).

Quadro 2

Da mesma forma, a decisão de terceirizar as atividades de preservação de valor deve levar em conta se uma organização tem economias internas de escala e a capacidade de executar essas funções efetivamente (Quadro 3). Os resultados dessas avaliações criam quatro abordagens possíveis para equilibrar terceirização com capacidade interna.

Quadro 3

Construir as próprias capacidades, considerar a terceirização temporariamente

Uma organização pode terceirizar um processo para capturar benefícios de curto prazo e construir capacidades internas. Por exemplo, manutenção, reparo e reforma podem ser gerenciados por um integrador externo. Uma abordagem de curto prazo pode ser bastante útil quando a gestão de gastos não é centralizada, os dados não são estruturados, a informação sobre especificações e preços é limitada ou imprevisível e os fornecedores são fragmentados.

Os integradores podem usar suas ferramentas e conhecimento para coletar especificações de manutenção, reparos e reformas, identificar produtos duplicados e consolidar a base de fornecedores. Dada a probabilidade de os agregadores externos buscarem aproveitar os próximos 5 a 8% de valor, as organizações podem internalizar a terceirização indireta depois de construir suas próprias capacidades e usar relacionamentos internos para gerenciar melhor a demanda.

Um método para avaliar quando uma organização está pronta para internalizar é realizar uma avaliação estruturada de sourcing estratégico. Esses tipos de ferramentas ajudam a identificar a preparação e os currículos para construir capacidades.

Manter o procurement indireto internamente

As organizações que já atuam nas alavancas comerciais e de demanda (realizando RFPs frequentes, implementando modelos de fornecedores preferenciais ou implementando catálogos) podem administrar o procurement indireto internamente. Quando seguir certos indicadores de performance é estrategicamente importante, como fazer entregas pontuais, os stakeholders podem querer manter uma determinada categoria internamente: por exemplo, escolher o parceiro logístico certo pode ser tão crítico para a vantagem competitiva de uma empresa que ela não pode delegar a decisão para um provedor de sourcing.

De forma similar, uma organização pode manter atividades internamente se conseguir executar processos de procure-to-pay eficazmente em escala, por exemplo através uma organização interna de serviços compartilhados, e se tiver criado estruturas de governança adequadas para sustentar a operação ao longo do tempo.

Considerar a terceirização de procurement indireto não estratégico

Se uma organização não tiver capacitação ou escala para investir em sourcing ou se uma categoria tiver uma importância estratégica menor, terceirizar o elemento correspondente de procurement indireto pode ser a decisão correta. Por exemplo, viagens e entretenimento não são atividades estratégicas ou parte das capacidades centrais da maioria das organizações. Terceirizar essas categorias pode ser uma boa relação custo-benefício, já que muitas empresas terceirizadas se especializam na função.

Avaliar a escolha entre internalização e terceirização

Em alguns casos, as organizações podem ter capacidades internas mesmo para categorias ou processos de procurement indireto não estratégico ou de subescala. A organização pode então avaliar os custos e benefícios de terceirizar o trabalho ou mantê-lo internamente, normalmente um equilíbrio focado principalmente nos custos relativos da organização interna e no contrato de terceirização.

Porém, outros fatores também entram na equação. Por exemplo, uma organização pode ter expertise interna em gestão de instalações. Mesmo que a categoria não tenha valor estratégico imediato para a organização, ela pode determinar que manter a expertise é suficientemente importante para a flexibilidade futura e mantê-la. Alternativamente, a organização pode decidir que a expertise seria mais bem utilizada em outra área da organização e optar pela terceirização.


Procurement indireto é uma função crítica de negócio para qualquer empresa e pode trazer valor significativo, além de oferecer vantagens competitivas. Embora terceirizar uma parte do procurement indireto possa oferecer benefícios de curto prazo consideráveis, como acesso à expertise da categoria e inteligência de mercado, a erosão de valor no longo prazo é um sério risco. As empresas podem obter um melhor equilíbrio ao examinar cuidadosamente o procurement indireto para focar no que importa estrategicamente. Após essas decisões serem tomadas, as organizações podem investir em pessoas, processos e ferramentas para capturar as economias alcançadas por um procurement mais sofisticado.

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