Como as economias em desenvolvimento podem aproveitar ao máximo seus orçamentos de infraestrutura

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Em economias desenvolvidas, políticas e práticas para equilibrar interesses divergentes nos gastos públicos com infraestrutura já estão bem-estabelecidas. A Coréia do Sul, por exemplo, estabeleceu o Public and Private Infrastructure Investment Management Center em 1999 com o objetivo de conduzir estudos de viabilidade para grandes investimentos públicos e, em 2005, expandiu seu mandato de forma a incluir também a avaliação e a gestão de parcerias público-privadas em projetos de infraestrutura. Desde então, o Centro reduziu em cerca de 82 pontos percentuais atrasos e gastos excedentes nos projetos. Há unidades similares em outros países – tais como o Infrastructure and Projects Authority (Reino Unido), o Bundesrechnungshof (Alemanha) e o Infrastructure Australia (Austrália).

No entanto, nos mercados em desenvolvimento, muitos governos ainda não conseguiram estabelecer condições para conduzir estudos de viabilidade e revisões de projetos mais extensos – seja por falta de talentos, seja por conflitos entre prioridades internas. Como resultado, esses governos acabam financiando projetos de capital mal preparados e de desenho inadequado, com escopos que geralmente não atendem à demanda real. Também não é raro haver sobreposição de projetos, além de os custos reais dos projetos muitas vezes excederem as previsões. De fato, aproximadamente 40% do dinheiro dedicado a investimentos globais ao redor do mundo é gasto de forma ineficiente em decorrência de atrasos, falta de inovação e falhas de mercado. Nas economias em desenvolvimento, tais gastos ineficientes chegam a US$1 trilhão ao ano.

Talvez seja pedir demais que todo projeto venha a ser avaliado de maneira aprofundada e completa, o que normalmente leva meses para ser feito. Mesmo em mercados desenvolvidos, isso nem sempre é possível. Mas é sim possível que os ministérios responsáveis pelas finanças públicas conduzam avaliações financeiras mais ágeis – com duração de apenas alguns dias ou semanas – com foco no grau de preparação para execução e adequação do desenho dos projetos. Observamos alguns países em desenvolvimento na África e no Oriente Médio embarcarem em programas dessa natureza, adaptando unidades de controle central e o nível de governança necessário às suas circunstâncias específicas.

Avaliação inicial do grau de preparação para execução de projetos

Como um primeiro passo, os governos devem garantir que todos os projetos foram pensados e formulados em um nível adequado de detalhes. Isso pode parecer óbvio, mas é muito comum encontrarmos projetos que não descrevem seu racional de forma apropriada, não avaliam soluções alternativas ou não contemplam planos orçamentários minuciosos. Ainda, como os ministérios responsáveis pela implementação não costumam ter as habilidades necessárias para o planejamento de projetos, eles acabam dependendo de organizações da iniciativa privada – responsáveis pelo desenho e pela implementação desses mesmos projetos – para revisar e avaliar seu próprio trabalho. As estruturas de incentivo resultantes, ao contrário de otimizarem os custos, tendem a inflar o escopo e as especificações de tais projetos.

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Quando o ministro da Fazenda de um país africano reviu propostas para a construção de novas estradas, por exemplo, descobriu que o custo de muitas delas excedia substancialmente os custos de projetos comparáveis, utilizados como benchmark – e que, na maior parte dos casos, os planos tinham sido feitos por empresas que consistentemente produziam projetos com custos mais elevados. Quando não é possível realizar uma avaliação mais aprofundada, uma revisão mais agilizada, feita em um ou dois dias de trabalho, pode ajudar. No geral, um órgão ou agência de controle faz uma série de perguntas diretas para avaliar se o problema foi definido com clareza, junto com uma análise de demanda e capacidade e um levantamento de soluções alternativas. Esse tipo de avaliação analisa os aspectos financeiros da proposta, como necessidade de fluxo de caixa e orçamentos planejados, bem como questiona elementos operacionais: um plano realista de implementação, o cumprimento de exigências regulatórias e eventuais sobreposições e interdependências com outros projetos. Por saber que não tinha essas habilidades, o governo do país em questão neste exemplo está criando uma unidade interna para supervisionar contratos com empresas de planejamento e verificando os produtos entregues.

O impacto pode ser considerável. O governo de outra economia em desenvolvimento seguiu essa mesma abordagem – ao reavaliar mais de 250 projetos de seu portfólio, descobriu que somente 25% deles estavam adequadamente preparados para execução. O problema mais frequente estava no fato de os donos dos projetos não terem realizado uma análise de capacidade e demanda e formas alternativas de suprir a demanda futura. Como resultado, eles receberam somente uma parte do financiamento pedido, suficiente para a condução de estudos que aumentassem o grau de preparação e adequação para execução dos projetos.

Uma revisão mais aprofundada do desenho do projeto

Depois de a avaliação inicial – frequentemente, de centenas de projetos – reduzir o pool, os ministérios responsáveis pelas finanças públicas podem conduzir uma revisão mais aprofundada do desenho geral de cada projeto. Essa etapa também pode ser agilizada. O ministério da Fazenda do país mencionado no exemplo anterior criou uma forma de conduzir revisões com duração de apenas duas semanas. Nesse período, foram identificadas oportunidades de redução de custos de 20% a 40%, em média, sem necessidade de diminuir o escopo. Durante as revisões, que passaram a ser parte integrante do processo anual de orçamento, a unidade de revisão de custos do ministério da Fazenda se reuniu com os donos dos projetos e testou seu desenho por meio de uma série de perguntas, em linha com o exercício de avaliação inicial acima. Algumas das perguntas feitas incluem:

  • Prioridades públicas. O escopo do projeto foca nos serviços e possui as características que as pessoas realmente desejam? Há evidências de que o projeto seja realmente necessário e atenda aos objetivos socioeconômicos do país?
  • Capacidade e demanda. A capacidade está de acordo com a demanda futura? As expectativas para a demanda são realistas? Soluções alternativas podem reduzir a demanda?
  • Custos. Os custos por unidade refletem os níveis encontrados em benchmarks? Os custos podem ser reduzidos por meio de ajustes no prazo de realização do projeto (para diminuir a necessidade de prazos de entrega muito curtos) ou pela calibração do cronograma, ajustando-o à disponibilidade de capital?
  • Produtividade. Os ativos existentes podem melhorar as operações?
  • Financiamento. Os requisitos de financiamento são realistas? Há oportunidades de financiamentos por parte do setor privado? Os ativos gerarão receita que poderá ser empregada para financiar o projeto? A implementação pode ser postergada ou desacelerada para diluir as necessidades de financiamento em um prazo maior?

As revisões de projeto podem ser significativas: uma revisão de duas semanas de um complexo público para convenções, por exemplo, identificou economias em potencial da ordem de US$1,7 bilhão (Quadro 1). Em outro país, um pedido de US$ 300 milhões por parte do ministro da saúde visando à compra de leitos adicionais para unidades de tratamento intensivo (UTIs) foi praticamente reduzido à metade depois que os revisores levaram em consideração os benchmarks com dados de utilização. Eles descobriram que a proposta assumia uma duração média de uso por leito de UTI duas vezes superior à duração do benchmark, principalmente porque os hospitais locais não possuíam leitos intermediários e não tinham onde acomodar os pacientes que recebiam alta da unidade intensiva. Como resultado, o ministro da saúde foi aconselhado a solicitar a compra de leitos intermediários, de menor custo, e um número menor de leitos de UTI.

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How developing economies can get more out of their infrastructure budgets

Outro exemplo diz respeito à proposta do ministro de habitação de um país para desenvolver moradia a custos acessíveis. Avaliações aprofundadas mostraram que o desenho proposto incluía características que aumentavam os custos, tais como claraboias, entradas de garagem mais extensas e quartos mais amplos, mas que não eram necessariamente valorizadas pelos moradores. O projeto otimizado passou a ter mais banheiros, mas (diferentemente da proposta original) com chuveiros em vez de banheiras; um número maior de quartos menores; e entradas de garagem menores, com menos espaço interno para estacionamento. Essas construções estavam mais alinhadas às expectativas dos prováveis futuros moradores e custavam 15% a menos – o que permitiu ao ministro construir mais casas com seu orçamento total de US$ 4 bilhões.

Bridging infrastructure gaps: Has the world made progress?

Essas revisões de duas semanas não são a única forma de melhorar o valor de um projeto. É possível também recorrer a materiais e desenhos de projetos padronizados; engenharia de valor, que busca garantir que as especificações do desenho reflitam a vida útil esperada dos projetos; acordos-quadro para compra de materiais mais utilizados ao longo do tempo; e stage gates para garantir a supervisão dos projetos. Quando há tempo suficiente, também pode ser muito apropriado e poderoso realizar uma revisão dirigida mais longa, com duração de três meses, para avaliar os portfólios de projetos (Quadro 2).

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How developing economies can get more out of their infrastructure budgets

Principais Aprendizados

Como em qualquer revisão de projeto, o tempo dedicado às avaliações deve ser ponderado considerando a necessidade de postergar projetos críticos. Em nossa experiência, qualquer esforço deste tipo deve necessariamente ser realizado de forma transparente. A análise do portfólio deve ser embasada em prioridades públicas, avaliação realista da demanda e do financiamento e modelagem detalhada dos custos. Além disso, qualquer processo de planejamento de capital deve considerar algumas lições simples e intuitivas.

  • Revisar os projetos com antecedência. Quanto mais cedo os projetos são revisados, maiores são as oportunidades de influenciar seu escopo sem incorrer em custos de oportunidade significativos. Uma vez que as bases são estabelecidas, será cada vez mais difícil realizar mudanças significativas. Idealmente, os avaliadores devem ser envolvidos durante a fase de geração de ideias de um projeto para que possam realizar suas primeiras avaliações mais aprofundadas sobre seu plano de negócios inicial e sobre o desenho geral do projeto.
  • Avançar simultaneamente com ações definitivas. Mesmo um processo de duas semanas pode demandar muito tempo quando diversos projetos precisam ser avaliados. Para evitar atrasos significativos na fase de implementação, os gerentes podem conduzir avaliações ágeis em paralelo já nas fases iniciais. Tarefas padrão, tais como realizar estudos piloto, podem continuar sendo realizadas à medida que os projetos aguardam a conclusão das avaliações.
  • Fornecer ao órgão revisor uma importante responsabilidade. Os responsáveis pelos projetos precisam de incentivos sólidos para colaborarem com o processo de revisão. Em nossas observações, o maior deles é vincular as revisões diretamente às decisões de financiamento: se não houver revisão, não há recursos.

Governos que não têm uma função dedicada especificamente para realizar revisões completas de projetos de capital podem realizar revisões mais simplificadas. Isso irá ajudar a garantir que apenas propostas bem elaboradas e bem desenhadas sejam financiadas e estejam alinhadas às prioridades públicas.

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