Mais que intuição: Dez práticas de desenho para criar valor de negócio

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Amazon Prime. iPhone da Apple. Netflix. Tesla. Para as empresas que acertam no design, os prêmios são valiosos. As empresas do S&P 500 que mais investiram em processos, capacidades e liderança de design na última década, e entre as quais figuram entidades como Disney, Nike e P&G, superaram as demais integrantes do índice em 211%.1

A importância do design aumenta a cada dia (ver sidebar “O que é design?”). Os consumidores têm acesso instantâneo a mercados globais e expectativas de serviço cada vez maiores. Assim, é cada vez mais difícil fazer o seu produto ou serviço se destacar dos demais. Como resultado, para muitos executivos, o design passou a ser um assunto tratado no nível do CEO.

Embora o conceito de design thinking remonte ao ano de 1969 e embora muitas empresas tenham procurado adotar seus princípios, é relativamente pequeno o número das que fizeram verdadeiras guinadas de crescimento e rentabilidade com base em design. E um número ainda menor conseguiu provar concretamente o valor exato das ações de design adotadas por elas.

Começamos a investigar as práticas de design que permitem a algumas empresas ter mais sucesso que outras. Nossa pesquisa com empresas globais de vários setores visa desvendar o vínculo entre valor de negócios e design. Nossas primeiras constatações, apresentadas neste artigo, ainda não são estatisticamente significativas; continuaremos a ampliar nosso conjunto de dados em 2018 para atingir essa meta. No entanto, algumas tendências já são evidentes. Entendemos que há dez ações de design referentes a três temas que parecem ter correlação com a melhora do resultado financeiro.

Em primeiro lugar, para essas empresas, o design é mais que um departamento. As empresas orientadas por design se estruturam de modo a estimular todas as funções a manter o foco nos clientes. Em geral, isso significa que o design não é um único departamento; ao contrário, especialistas em design estão por toda parte, trabalhando com pequenas equipes multifuncionais com incentivos compartilhados e interação regular com clientes.

Em segundo lugar, o design é mais que uma fase. As empresas orientadas por design recorrem a pesquisa quantitativa e qualitativa no início do desenvolvimento de produtos, combinando técnicas como análise de dados de garantia, observação de mídias sociais, grupos de foco e pesquisa etnográfica para entender melhor as necessidades dos seus clientes. No entanto, as melhores empresas continuam a ouvir e a iterar muito depois da fase conceitual inicial, empenhadas em melhorar a experiência do cliente depois do lançamento.

Finalmente, as empresas bem-sucedidas orientadas por design não agem movidas apenas por instintos. Para elas, o design é mais que intuição. Elas medem e gerenciam o design com o mesmo rigor que dedicam a custo, qualidade e tempo. A força do design é uma métrica do nível de diretoria, e o líder de design se equipara aos líderes de vendas, operações e finanças.

Mais que um departamento

1) De silos departamentais a equipes multifuncionais

As empresas que têm um departamento de design centralizado e estanque (às vezes integrado a marketing ou P&D) apresentaram um resultado financeiro em geral inferior àquelas que deram liberdade aos designers e distribuíram esses especialistas nas equipes multifuncionais voltadas aos produtos. O mesmo ocorreu nos casos em que a expertise em design foi trazida de agências externas – a própria empresa se incumbiu de integrar esses parceiros a uma equipe desenvolvimento firmemente voltada para o cliente.

Um grande fabricante europeu de móveis fez a experiência de instalar tanto um departamento central de design como equipes de design menores e independentes, incorporadas a diferentes grupos de produtos. Ela concluiu que as equipes distribuídas foram muito mais bem-sucedidas: elas mostraram claro foco em seus clientes; melhores parcerias entre funções, resultando em uma redução de 10% do tempo até o lançamento; e uma taxa de sucesso 30% maior ao levar os conceitos para o mercado.

2) De especialistas restritos a designers multidisciplinares

Em qualquer desenvolvimento – um novo veículo, um aparelho médico, um serviço bancário – existe uma convergência de design físico, digital e de serviços. Cresce a percepção entre as empresas de que essas diferenças não são significativas para os clientes. Assim, observamos um melhor resultado financeiro nas empresas que eliminaram essas barreiras e proporcionaram a seus designers treinamento polivalente em habilidades como design industrial e de interface com usuários, em comparação com aquelas que mantiveram as divisões históricas, com pouca fertilização cruzada.

No caso do termostato inteligente ecobee3, a firma de design LUNAR2 precisava criar interfaces para o cliente operar o produto físico e para controlá-lo por meio de um aparelho celular ou computador pessoal. Pedir que o cliente aprendesse a lidar com três interfaces diferentes estava fora de questão. A solução foi montar uma única equipe de designers digitais e físicos para criar uma identidade visual comum. A harmonização da experiência e da estética do produto, desprezando a divisão entre as disciplinas, gerou um sistema intuitivo que foi o termostato inteligente mais bem classificado por clientes da Amazon e da Apple nos meses seguintes ao lançamento, apesar das poucas ações de marketing ou promoção.

3) De cubículos a garagens

Nas “garagens” do Vale do Silício não existem departamentos, títulos, cargos designados. Todos se concentram em fazer um ótimo produto que atenda uma necessidade do consumidor. O ambiente parece mais uma oficina do que um escritório, sendo projetado para incentivar o foco colaborativo para construir um grande produto juntos.

Uma empresa global de bens de consumo criou recentemente um novo estúdio de design na mesma rua de seu principal centro de inovação. Trata-se de uma única área ao ar livre com piso de concreto, em gritante contraste com escritórios de inovação mais formais. Os designers, profissionais de marketing e engenheiros começaram a tomar decisões em tempo real juntos, em vez de esperar a realização de reuniões formais. Se, por exemplo, o produto mudasse de forma, a equipe de embalagem ficava sabendo, podendo fazer uma adaptação imediata. Essas pequenas mudanças em tomada de decisões e colaboração, juntas, representaram grandes melhorias no time to market e na pontuação de satisfação dos funcionários, e em um conjunto de produtos que proporcionam um retorno do investimento consideravelmente maior que o de produtos historicamente desenvolvidos no centro de inovação.

Mais que uma fase

4) De etapas de design a design contínuo

A abordagem orientada por design para a criação de produtos significa que ele acontece ao longo de todo o desenvolvimento, e não apenas na fase inicial de conceito. Desde o planejamento do road map de um produto, passando pelas preparações para a produção e o lançamento, até o atendimento na vida real, o design deve manter a equipe fiel às necessidades do cliente durante toda a vida do produto.

Um exemplo é a Nespresso, que envolve designers durante todo o ciclo de vida de seus produtos e sistema de negócios. Os designers, observando as reações dos clientes na loja e online, criaram uma experiência de varejo nos moldes de um museu, pedidos por celular com entrega em duas horas, um clube de fidelidade e uma revista online, entre muitas outras iniciativas.

Às vezes, para manter os designers envolvidos ao longo do processo todo, é preciso adotar uma abordagem nova. Arquitetos de submarinos, por exemplo, elaboram duas especificações de produto. A primeira trata da funcionalidade básica, como tamanho e velocidade, e permanece imutável desde o início. A segunda especificação, referente a eletrônica e equipamentos de comunicação, fica em aberto, para permitir que os designers criem um protótipo e façam iterações com o cliente no decorrer da construção, e também para incorporar avanços tecnológicos. Não é de surpreender que os fabricantes de carros tenham começado a adotar uma abordagem semelhante, atualizando remotamente o software de veículos no pós-venda, com base na contínua revisão de dados de condutores feita por designers e engenheiros.

5) De pesquisa qualitativa para pesquisa de espectro total

A pesquisa qualitativa, por meio de grupos de usuários, entrevistas e observação de campo, é um poderoso instrumento para entender os desejos e as motivações do consumidor.  Se a pesquisa for enriquecida com análises quantitativas, como a coleta de críticas online ou a análise de serviços de garantia, ela pode detectar comportamentos subjacentes e lançar bases mais profundas nas quais assentar conceitos vitoriosos de design. As empresas que usaram as duas formas de pesquisa com clientes criaram produtos muito mais bem classificados que os de empresas que usaram unicamente a pesquisa qualitativa.

Um provedor de serviços de saúde dos Estados Unidos, por exemplo, explorou múltiplas fontes de dados de pacientes e operacionais, de entrevistas e fichas médicas a câmeras de monitoramento de movimentos. Como resultado, ele redesenhou a maneira de ministrar o tratamento, reconfigurando o layout de hospitais para minimizar o contágio infeccioso e diminuir em 10% o tempo de internação.

6) De protótipo uma só vez a protótipo muitas vezes

A maioria dos processos de etapas sequenciais de P&D começa com uma descrição do produto e um modelo de negócios. As empresas orientadas por design começam com um protótipo que responde a uma necessidade do cliente, ancorado em um caso de negócios. O design é inerentemente iterativo e as empresas que enfatizam a criação de um protótipo logo no início, em vez de buscar o protótipo perfeito, passam rapidamente para produtos que os clientes adoram. Esse movimento é fundamental para o processo ágil introduzido pioneiramente pelas empresas de software, como o uso de produtos viáveis mínimos, que dão às equipes a possibilidade de fazer testes sem perda de tempo, melhorar os conceitos e em seguida fazer novos testes.

A equipe de design de uma grande empresa de bens de alto consumo pode ter tirado proveito dessas ideias. Não querendo apresentar à direção maquetes iniciais, a equipe protelou uma pesquisa em várias regiões até as peças moldadas poderem ser produzidas. Quando uma característica básica do design desses protótipos foi rejeitada pelos consumidores, o tempo e o dinheiro gastos com o ferramental significaram que o projeto todo precisou ser posto de lado. Para um de seus próximos produtos, a equipe de design fez muito mais protótipos na etapa inicial de desenvolvimento, e o resultado foi uma queda radical de problemas na linha de produção normalmente relacionados ao lançamento de um novo produto, além de uma diminuição de cerca de 15% no time to market.

Mais que intuição

7) Da média gerência à diretoria

A cultura centrada no cliente necessária para possibilitar o impacto do design na empresa toda precisa começar na diretoria, com líderes de design que também sejam líderes de negócios confiáveis. Eles precisam empenhar-se em ficar a par do que seus clientes gostam nos produtos e defender o que os clientes valorizam no tortuoso caminho para o mercado.

Aston Martin e Burberry são vistas em geral como duas das marcas mais valiosas do mundo, regularmente presentes nos rankings das melhores marcas. Ambas colocaram líderes de design na diretoria da empresa, para garantir que a voz do cliente e a importância da qualidade dos produtos jamais fiquem longe da equipe de direção.

8) De perspectivas a métricas

O segredo de associar design e sucesso comercial é a capacidade dos líderes de evitar opiniões subjetivas ou preferências pessoais e, em vez disso, tomar decisões baseadas no entendimento factual do cliente. Métricas de design – como pontuação de satisfação do cliente e cálculos de risco de fatores humanos – dão aos líderes dados concretos nos quais basear decisões cruciais. Algumas empresas criaram métricas de design que permitem medi-lo durante o desenvolvimento de um produto com o mesmo rigor usado para medir qualidade, custo e entrega.

Para um fabricante de aparelhos médicos em fase de criação de um novo produto essencial, isso significou introduzir métricas de design baseadas em análise conjunta: uma técnica para testar a importância relativa de diferentes características com centenas de médicos. Dessa forma, foi possível fazer uma rápida iteração e quantificação do valor de mercado das características propostas, permitindo ao diretor do produto solicitar e investir em recursos de desenvolvimento, fundamentado em evidências concretas, e não em intuição. Além disso, essa postura deu realce à única característica de design realmente capaz de virar o jogo – e que foi incluída no design final.

9) De incentivos financeiros a incentivos baseados no cliente

As empresas de melhor performance que investigamos medem o impacto comercial de longo prazo da satisfação do cliente. Elas atrelaram os bônus da alta gerência à satisfação do cliente, além das medidas baseadas em receitas e lucros. Entre elas estavam medidas indiretas, como prêmios e resenhas sobre o design, bem como medidas diretas, como a classificação dada por usuários.

Um fabricante de bens de consumo registrou um aumento acima do esperado das vendas e da satisfação dos clientes depois de atrelar a remuneração da gerência e do pessoal de desenvolvimento a classificações dadas aos produtos lançados, à semelhança do que fazem as instituições financeiras para atingir metas comerciais.

10) Do incremental ao ousado

As empresas orientadas por design criam produtos em resposta às necessidades e aos desejos dos clientes, mas não têm medo de levar sua própria visão para o mercado. Elas estão dispostas a colocar a força da marca no longo prazo acima das vendas no curto prazo, e não têm receio de compartilhar recursos e opiniões com design thinkers externos à organização para reforçar sua oferta aos clientes.

Design for value and growth in a new world

Ao se deparar com o acirramento da “corrida armamentista tecnológica” em consoles de jogos, a Nintendo optou por colocar toda a sua força institucional em um ambiente de gaming diferente e mais inclusivo. O aproveitamento de tecnologia existente de novas formas resultou no Wii, um design inferior ao dos concorrentes em termos de performance bruta – mas que superou as vendas deles em 6:1 ao ser lançado e conquistou novos clientes para o gaming.

Como a sua empresa pode beneficiar-se do valor do design?

Nenhuma das empresas que avaliamos até agora demonstrou excelência nas dez ações de design. No entanto, aquelas que implementaram várias dessas ações registraram melhor resultado financeiro e maior fidelidade dos clientes, em tempos em que muitas empresas sofrem com a queda nos índices de satisfação dos clientes.

Considere-se a Disney. Ao longo de toda a sua festejada história, a Disney colocou os clientes no centro de tudo que fez. E quando a satisfação dos clientes em seus parques temáticos começou a recuar, por causa das enormes filas e dos altos custos, mais uma vez a empresa enfocou o cliente – e introduziu várias das ações descritas neste artigo. Criou equipes multifuncionais para “reinventar a experiência de férias”.3 Estudou o que os clientes efetivamente faziam no parque, usando entrevistas etnográficas e ferramentas quantitativas como o mapeamento de passeios de famílias pelo parque. Construiu uma “garagem”, denominada laboratório de ideias, para criar o protótipo do “MagicBand”, um dispositivo digital que, segundo acreditava, poderia resolver os problemas.  O primeiro protótipo foi feito com materiais encontrados na Home Depot, e a ele se seguiram mais de 40 outros protótipos. A empresa pediu a ajuda de firmas de design e tecnologia. Altos executivos da Disney defendiam a iniciativa em todas as suas etapas. Percalços ao longo do caminho eram aceitos e, na sua maioria, superados. Em 2014, a Disney World implementou o MagicBand em todo o parque. A satisfação dos clientes disparou, pois os tempos de espera, monitorados digitalmente, diminuíram, as diversões digitais fizeram os tempos de espera parecerem mais curtos e alimentos previamente encomendados apareciam como que por mágica quando os visitantes entravam nos restaurantes. A nova tecnologia ainda não faz tudo que a empresa esperava – mas já está fazendo uma grande diferença.


A sua empresa está aproveitando o valor do design? Os seus concorrentes estão conquistando market share porque usam as dez ações com mais vigor? Design é mais que intuição: é uma prioridade à altura do CEO para o crescimento e a performance de longo prazo. Responda a pesquisa a seguir (Quadro) para descobrir onde sua empresa está acertando em design e onde ela está simplesmente caminhando por intuição.

More than a feeling: Ten design practices to deliver business value
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