Tesouro escondido: Advanced analytics em indústrias de transformação

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Internet das Coisas (IoT), Industry 4.0, advanced analytics, tecnologias digitais, big data – tudo isso gerou uma enorme onda de entusiasmo por seu potencial de transformar todas as facetas de negócios. Até agora, o debate sobre essas ferramentas se concentrou principalmente nas indústrias de contato direto com o consumidor, como varejo e serviços financeiros; grandes empresas industriais, como a GE; e líderes no cenário digital, como Amazon, Google e Netflix. Por trás dos refletores, contudo, as indústrias de transformação – também designadas comumente indústrias de manufatura intensiva em capital – não perderam tempo para adotar muitos desses avanços. Durante décadas, esse setor não apenas gerou grandes quantidades de dados, mas também combinou ciência, conhecimento de engenharia, estatística clássica e poderosa modelagem em sistemas de controle avançado de processos (advanced process control - APC) que operam seus principais ativos com eficiência.

Como o desenvolvimento de sistemas APC é caro e historicamente sua eficácia se limitou a processos bem conhecidos e menos complexos, sua utilização ficou em geral restrita aos processos maiores e mais críticos. Os processos menores, bem como os secundários e mais complexos, ficaram sem controles adequados (ver quadro Os processos da fabricação pesada). Embora as indústrias de transformação gerem enormes volumes de dados, suas capacidades de gestão de processos e tecnologia da informação não são tão avançadas como as de outros setores. Dessa forma, até agora os fabricantes ficaram para trás no sentido de utilizar sistematicamente data analytics para extrair o valor substancial que está oculto nos insights gerados por esses dados.

A boa notícia é que, ao longo das últimas décadas, surgiram métodos e soluções de análise de fabricação totalmente novos e mais acessíveis, que agora estão alcançando maturidade de mercado como parte de Industry 4.0. Essas soluções – que facilitam o acesso a dados de múltiplas fontes, juntamente com algoritmos de modelagem avançada e abordagens de visualização fáceis de usar – poderiam, finalmente, proporcionar aos fabricantes novos meios de controlar e otimizar todos os processos na totalidade de suas operações.

Nova tecnologia, no entanto, é apenas uma das partes da equação. Para que as melhorias em analytics gerem forte impacto financeiro, os fabricantes também precisam levar em conta o fator humano. Assim como ocorreu em esforços anteriores para otimizar a produção, tais como fabricação lean ou padrões de qualidade ISO, as capacidades de gestão de mudanças serão cruciais. O novo horizonte de analytics somente atingirá seu impacto total quando os fabricantes aprimorarem a capacitação de toda a organização, para que novos métodos e soluções passem a fazer parte da rotina do dia a dia.

Analytics podem melhorar enormemente a performance e ao mesmo tempo reduzir custos: o valor, distribuído em milhares de oportunidades, pode ser de dezenas ou até centenas de milhões de euros em toda a rede de sites da empresa. O principal desafio é implementar analytics centenas ou milhares de vezes para alcançar os resultados desejados. Assim, é preciso que os fabricantes iniciem um esforço de transformação baseada em analytics que percorra o espectro todo, dos operadores do chão da fábrica (que executam os processos), passando pelos engenheiros de processos (que usam profundos insights para alavancar a próxima onda de melhorias) até os gerentes (que supervisionam constantemente a performance).

Essa linha de ação exige que os fabricantes adquiram as capacidades e mentalidades de gestão capazes de mobilizar toda a organização para aproveitar a nova tecnologia de analytics. Os fabricantes da indústria pesada que aplicarem essa abordagem sistematicamente – processo por processo, fábrica por fábrica, local por local, no mundo todo – obterão todo o valor das novas oportunidades de otimização e mais valor de seus profissionais e ativos físicos.

Evolução da tecnologia de automação na fabricação pesada

Na indústria pesada, os atuais sistemas de controle de processos podem operar, digamos, fábricas inteiras de produtos químicos, a partir de uma sala de controle em modo totalmente automatizado, sendo as operações visualizadas em telas de computador. Os dados direcionam os processos por meio de algoritmos proporcionais integrais derivativos (PID) que gerenciam loops locais.

Algumas indústrias, como as de refino de petróleo e gás, levaram a lógica de controle de processos um passo adiante, usando sistemas APC para executar modelos de otimização contínua. Com efeito, na década passada, o setor de fabricação pesada viu seus lucros aumentarem a cada hora com a aplicação bem-sucedida de tecnologias APC a muitos processos. Esses modelos iniciais, que exigem um problema estático e bem descrito (ou “determinístico”), são extremamente potentes. Sua principal desvantagem, que explica por que eles foram implementados apenas em cenários específicos, é a despesa: os sistemas APC podem custar €0,5 milhão para uma coluna de destilação ou €1,5 milhão para um forno de laminador de tiras a quente. Por consequência, normalmente o retorno sobre o investimento (ROI) só faz sentido para grandes processos.

Analytics, infraestrutura de otimização e ferramentas da próxima geração

A indústria pesada está atualmente à beira da revolução digital. A tecnologia de IoT – que inclui sensores de preço acessível, transmissão confiável de dados e poderoso software de controle – pode gerar e rastrear informações de qualquer máquina e interferir em um processo de fabricação. Da mesma forma, opções de armazenamento de custo acessível (bases de dados de alta performance e ofertas de nuvem) possibilitaram agregar e gerenciar vastas quantidades de dados. Por fim, pacotes analíticos modulares, fáceis de usar, sobretudo aqueles que incluem inteligência artificial e machine learning, podem aproveitar e processar essas informações para proporcionar novos níveis de insight. Além disso, muitos algoritmos e ferramentas de software estão em processo de “comoditização”, facilitando seu uso por parte dos funcionários, sem necessidade de treinamento significativo.

Os sistemas convencionais de APC têm monitorado e gerenciado processos grandes e determinísticos. Graças aos avanços tecnológicos mencionados acima, agora os fabricantes podem implementar novas soluções de controle e otimização de baixo custo em processos determinísticos de médio porte e processos não determinísticos de médio a grande porte, que até agora não tinham se beneficiado desse tipo de tecnologia sofisticada (Quadro).

Quadro

Dimensionamento da oportunidade

Uma estimativa do valor total das melhorias potenciais de performance revela a enorme oportunidade para os fabricantes que agirem certo. Para exemplificar, uma grande empresa multinacional normalmente tem uma dúzia de grandes processos (como adição de inibidores de catalisador em um processo químico) que, se otimizados, poderiam cortar custos ou gerar melhorias de produtividade de €1 milhão cada. No entanto, os fabricantes também têm de centenas a milhares de oportunidades de médio porte, como controles de superaquecimento de vapor (os benefícios atingem até €50.000 por caldeira anualmente) ou resfriamento por válvulas de restrição subdimensionadas (até €70.000 por ano). Uma empresa química com 150 sites, por exemplo, e de 10 a 100 processos para otimizar, poderia ter de 1.500 a 15.000 oportunidades com valor anual recorrente de economias de custos entre €50 milhões e €500 milhões.

Com o uso sistemático de analytics, os fabricantes podem liberar economias dessas três fontes, cada uma representando uma parcela igual do valor. Em primeiro lugar, analytics dá aos engenheiros de processos maior visibilidade de todos os processos, possibilitando assim que os liderem com maior eficácia. Em segundo lugar, o uso de analytics contribui para uma gestão melhor – por exemplo, ao ajudar os operadores a detectar quando um processo se desvia de indicadores-chave de performance (KPIs) definidos. Tal visibilidade lhes permite detectar movimentos e tomar medidas corretivas com rapidez muito maior. Em terceiro lugar, traz à tona restrições a processos que estavam ocultas e muitas vezes podem ser solucionadas com pequenos investimentos de capex. Além de tornar os funcionários mais eficientes, ela pode ajudar a eliminar gargalos humanos críticos, liberando tempo e recursos que podem ser direcionados a melhorias adicionais nas fábricas.

Elementos base da otimização de processos alavancada por analytics

Os fabricantes enfrentam um grande desafio em analytics: implementá-lo centenas de vezes sem deixar de garantir a uniformidade, a qualidade e o desenvolvimento de um ciclo de melhorias contínuas que possibilite novos avanços. Partes externas podem ajudar a definir a estrutura, fazendo a primeira implementação de um piloto bem-sucedido, desenhando os processos organizacionais e capacitando os primeiros usuários. Em algum momento, no entanto, os fabricantes precisarão implementar práticas sustentáveis e contar com especialistas em toda a organização global, da mesma maneira que fazem com relação a controle de qualidade, gestão de energia, periculosidade e segurança, compliance e outras práticas funcionais.

Quatro áreas de expertise são cruciais para estabelecer o apoio organizacional certo para que a empresa possa, além de agregar e analisar dados, agir com base nas conclusões.

Expertise em TI. Essa categoria inclui funcionários com o conhecimento e as habilidades para agregar dados de sensores (inclusive seu local, tipo e precisão) e armazenar essas informações em diversas plataformas (nuvem, servidores no local, servidores fora do local, nuvem externa). TI também implementa e mantém as novas soluções de sistemas, sensores e software.

Expertise em domínios. Data analytics, por si mesmo, não pode erar todo o potencial impacto e valor sem o entendimento de como os processos se comportam e como as fábricas locais estão montadas. Interações frequentes com especialistas locais são essenciais para construir um modelo de otimização útil. Os engenheiros de processos podem colaborar com especialistas em data analytics para embasar modelos de resultados (como produção e uso de energia) em dados definidos, e usar seu conhecimento especializado para resolver problemas ao longo de todo o processo. Além disso, eles podem atualizar árvores de alavancas de valor e criar uma base de dados de soluções para consulta futura.

Advanced analytics. Os dados devem ser estruturados por tempo, lote, combinação de tempo, lote e defasagem de tempo. Devem também ser limpos para identificar e visualizar pontos fora da curva e dados faltantes. As ferramentas de analytics, tais como árvores de alavancas de valor, podem ajudar a determinar os parâmetros críticos e agrupar os dados com base nas informações descritivas – e são flexíveis para serem reprogramadas. Os funcionários – em especial engenheiros de processos e operadores – precisam receber treinamento na nova tecnologia e ter capacidade de trabalhar com ela no dia a dia, além de agir corretamente de acordo com suas recomendações.

Gestão da mudança. Os profissionais da transformação definem medidas de melhoria, constroem otimizadores para os operadores e rastreiam a performance e os KPIs. Os esforços de implementação usam dashboards e apps para visualizar a performance em tempo real, enquanto a automação incorpora medidas de melhoria ao software de APC. Muito frequentemente, surgem constatações adicionais surpreendentes que questionam o atual conhecimento e tratamento. Mais informações em tempo real acabam por alterar a maneira como as decisões são tomadas e propiciar uma maneira ágil de operar.

O avanço metódico pela organização – processo por processo, oportunidade por oportunidade – assegura a uniformidade e o maior grau de impacto possível.

Realizando uma transformação através de analytics em uma organização global

Para o sucesso de uma transformação baseada em analytics, é preciso que os fabricantes aprimorem um único processo e, em seguida, adquiram as capacidades para replicar essa abordagem à otimização centenas ou milhares de vezes em toda a empresa. Nossa experiência nos diz que os fabricantes normalmente já contam com a expertise em domínios e TI para captar e armazenar quantidades enormes de dados. Para deslanchar e sustentar uma transformação baseada em analytics, os executivos devem concentrar-se em fortalecer as capacidades da organização em advanced analytics e gestão da mudança.

Implementando o piloto da abordagem de analytics

A transformação baseada em analytics começa pela identificação de processos específicos que servirão como pilotos. O ideal é que esses projetos iniciais possam demonstrar a viabilidade e o valor de analytics e obter melhorias rapidamente.

O passo seguinte é implementar um processo de aprendizado e melhoria. Uma boa parte da otimização envolve o uso de ferramentas de analytics para entender melhor as alavancas do aumento da eficiência e das economias de custos. Normalmente, o uso de analytics ressalta as oportunidades de pequenos investimentos de capex para melhorar a performance de todo o sistema. As lições desses esforços iniciais podem ser integradas a um projeto de mais longo prazo para conceber uma solução mais permanente.

A captura de valor está relacionada, antes de mais nada, a pessoas – da seleção do processo certo de coleta de dados à realização da análise para implementar no chão da fábrica os insights resultantes. A captura desse valor também envolve disseminar analytics por toda a organização e formar as capacidades para instituir processos mais eficazes. Os fabricantes podem ficar tentados a pular a abordagem imediata e incremental, na tentativa de abocanhar logo o grande prêmio. Outros podem ficar estagnados em uma etapa inicial, por levarem tempo demais para desenhar e implementar uma solução tecnológica personalizada. Com base na nossa experiência, não faz sentido gastar dois anos e vários milhões de euros para chegar à melhor das abordagens, se data lakes e analytics de preço acessível puderem ajudar as organizações a começar a obter valor nos primeiros meses do projeto.

Os fabricantes de equipamentos e produtos pesados e seus funcionários também precisam adotar uma nova mentalidade – centrada em decisões alavancadas por dados e nos processos para coletar, analisar e aplicar esses insights para chegar às conclusões certas.

The age of analytics: Competing in a data-driven world

Implementando analytics em toda a empresa

A transformação baseada em analytics exige quase todos os fatores de sucesso de transformações clássicas: fixar aspirações claras, conseguir atenção e adesão da alta gerência, envolver os funcionários com iniciativas de comunicação claras e bem executadas, identificar lacunas de habilidades, planejar para formar as capacidades requeridas, definir papéis essenciais e comprometer recursos suficientes.

Em vista do grande tamanho das oportunidades individuais e da complexidade de interagir com vários departamentos e unidades de negócios, a instalação de um escritório de gestão do novo programa é crítica para o sucesso da transformação baseada em analytics. Uma vez concluído o piloto, a equipe de gestão de mudança deve identificar oportunidades, priorizar locais, formular o plano de comunicação, definir o apoio de TI requerido, e selecionar e treinar especialistas on the job em ondas sucessivas. A fase preparatória inclui o treinamento em ferramentas de software. Engenheiros experientes devem estar prontos para ensinar e ajudar outros funcionários e atualizar materiais de treinamento, recorrendo às lições das primeiras ondas de treinamento.

Essa abordagem emprega um modelo de aprender e transformar: grupos de engenheiros percorrem uma jornada de transformação clássica (preparar, diagnosticar, desenhar, planejar, implementar e sustentar) dividida em sprints com duração de três a quatro semanas. Cada sprint abrange aprendizado em conjunto, aplicação in loco e sessões de feedback com instrutores para aumentar a retenção. De acordo com nossa experiência, um pequeno grupo de especialistas pode ministrar treinamento a 200 engenheiros em 18 meses, obter um impacto em quatro a cinco meses e, paralelamente, elaborar o plano de implementação para um site. Dessa forma, a organização pode desenvolver engenheiros de processos suficientes para cobrir 150 sites em apenas 18 meses. Durante a jornada, é imprescindível não apenas capturar valor de oportunidades específicas, mas também fazer com que os engenheiros elaborem um roadmap de melhorias para os anos seguintes.


Essa abordagem escalonada permite aos fabricantes lançar os alicerces para tratar de milhares de oportunidades em toda a organização e formar as capacidades internas necessárias para uma transformação alavancada por analytics. É fato que mudanças profundas como essas exigem compromisso contínuo e investimento significativo, porém o retorno pode ser substancial. Além disso, a visibilidade das operações possibilitada por analytics produz dividendos no longo prazo: os fabricantes que integram essa abordagem a todas as facetas das operações terão mais agilidade e melhores condições de se beneficiarem dos insights gerados.

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